Monday, August 29, 2005

O dia D

Acordei naquele dia chuvoso...sentindo.
Estava me incomodando profundamente, me irritando, machucando, causando uma sensação ruim.
E eu sentia que não pararia de crescer, e se tornaria algo muito mais incômodo.
Tentei levar o dia adiante, não pensando naquilo – tentaria me distrair, ocupar o tempo, sair, fazer alguma outra coisa, para que nem me lembrasse que existia.
Realmente, me distraí – mas bastava parar um minuto e lá estava eu, sentindo de novo, aquilo, que vinha de dentro, incomodava, doía, machucava.
Mas não era para ser assim, não foi assim que eu imaginei. Pensei que fosse proporcionar uma sensação agradável, me deixar mais animado, nada melhor para melhorar o astral e a aparência, e levantar a auto-estima.
No entanto, não estava sendo assim. Continuava incomodando. E eu já não sabia mais o que fazer.
E agora? Será que dou um ponto final nisso? Ou deixo as coisas continuarem como estão? Mas se eu der um ponto final, posso me arrepender depois, porque sei que vou me arrepender. Então tá, vou dar um ponto final nisso.
Ai, caramba, não posso dar um ponto final assim, desse jeito. Mas eu preciso. Só que não quero...
E agora, o que fazer?
Diante do espelho, a dúvida cruel. Agora o momento é de irritação, por eu ficar parado no mesmo ponto e não resolver. Merda. Mil vezes merda. Mas nossa, não posso tomar uma decisão dessas assim. Só que eu preciso.
Mas não posso, as coisas não são simples assim. Ou será que são e eu complico? Ah, que coisa, já está me irritando...
Não agüento mais. Preciso tomar uma decisão. Agora. Não vou continuar parado no mesmo ponto.
Mas não consigo sair, não pode ser assim...
Vou resolver, agora chega.
Sigo até o banheiro e me coloco diante do espelho. Pego a lâmina gillete e seguro com firmeza. Vou cortar e acabar com tudo de uma só vez. Chega, não dá mais mesmo.
Hum...será que essa é a decisão certa? Não posso mais...não dá mais, não consigo. Chega. Tá na hora de cortar!
E num relance, eu levo a lâmina à pele e corto. CORTO!
Mas antes, que tal um pouco de espuma de barbear? Fica mais fácil.
Seguro a lata nas mãos, e na hora de apertar o botão, olho pra mim mesmo diante do espelho e começo a gargalhar, fazendo as risadas ecoarem pela casa. Agora estou achando engraçado.
Quanto drama pra saber se faz ou não a barba!

Saturday, August 27, 2005

A primeira a gente nunca esquece

Calma, gente...é só a primeira matéria que eu escrevi XD
Na verdade é a segunda. A primeira eu não salvei, não sei porque.
Essa é do tempo que eu era colaborador da Re-vista!, e achava que sabia escrever.


Em novembro de 1904 estoura, no Rio de Janeiro, mais uma revolução de caráter popular. A Revolta da Vacina está completando 100 anos e traz na sua história o nome de uma importante personalidade brasileira – Oswaldo Cruz.

A Revolta da Vacina foi um movimento ocorrido no início do século XX, como forma de reação à política sanitarista do então Diretor-Geral de Saúde Pública (cargo equivalente ao de Ministro da Saúde), o médico Oswaldo Cruz. O levante entrou para a história por ter sido um dos únicos, senão o único movimento popular contra as arbitrariedades do governo, e por ter tido apoio de diversos outros setores da sociedade.
“É preciso enxergar a Revolta da Vacina sob o contexto da Revolução Médico-Sanitária mundial” diz o Dr. José Augusto Messias, médico do Hospital Universitário Pedro Ernesto. “Todas as evoluções da medicina ao longo do século XVIII e XIX culminaram na revolução sanitária do século XX, e como bem se sabe, todas as mudanças passam por um processo de rejeição antes de serem incorporadas pela sociedade”.
O ano era 1903. O Rio de Janeiro era conhecido como “cidade maldita”, infestada por malária, varíola e febre amarela. Os cortiços ocupavam o centro da cidade, abrigando pessoas sob péssimas condições de vida e favorecendo o desenvolvimento de transmissores de doenças. Preocupado, o Prefeito Pereira Passos resolveu acabar com o estigma da cidade, organizando uma série de reformas urbanas. Dentro dessa política, Oswaldo Cruz foi chamado para assumir a Diretoria Geral de Saúde Pública, com o objetivo de melhorar as condições sanitárias do Rio de Janeiro.
Cruz tomou diversas medidas para melhorar a saúde pública: combateu os mosquitos que transmitiam malária e febre amarela, exterminou os ratos cujas pulgas causavam a peste bubônica, limpou as ruas e demoliu imóveis que serviam como criadouro de larvas de vetores. As medidas causaram riso – ninguém acreditava que iriam melhorar a saúde pública – e irritação, principalmente por parte da população pobre e dos donos de cortiços.
Em 1904, uma epidemia de varíola se abateu sobre a cidade, levando em torno de 1800 pessoas aos hospitais em apenas cinco meses. O Governo então enviou ao congresso um projeto que tornava obrigatória a vacinação antivariólica. O atestado de vacina era exigido para tudo: matrícula em escolas, emprego, viagem, casamento etc, e sofreu duras críticas da imprensa carioca. “A imprensa foi contrária a lei,chegando a afirmar que a vacina, ao invés de combater, provocava a doença. Ela não teve um entendimento da validade científica dessa medida, do alcance dessa medida. Eles (a imprensa) foram reacionários” diz Leovegildo Alfradique de Andrade, formado em história pela Universidade Federal de Campo Grande (Feuc).
A irritação com o Diretor-Geral atingiu seu ápice por volta de 10 de Novembro, quando a notícia da obrigatoriedade da vacina chegou aos jornais. Parlamentares, associações de trabalhadores, positivistas, oficiais do Exército, monarquistas e líderes operários criaram uma liga anti-vacina, que foi a responsável por organizar passeatas e comícios na cidade. Os protestos puseram a polícia e a população em choque.
Três dias depois, a Revolta começa de fato, com os manifestantes se levantando contra o governo, enfrentando a polícia a tiros e formando barricadas pela cidade. No dia 14 estouram pelo Rio diversos saques, incêndios e depredações. A revolta é acalmada nos dias seguintes, seguindo com alguns incidentes isolados até o dia 19. Seu saldo: 945 prisões, 461 deportados, 110 feridos e 30 mortos. A Revolta é “pacificada”, porém o governo não foi o vencedor, já que a vacinação obrigatória foi suspensa. O povo conseguira, porém, outro surto de varíola em 1908, o qual provou que Oswaldo Cruz estava certo.
Prestes a completar 100 anos no dia 10 de Novembro de 2004, a Revolta da Vacina figura na história do Brasil como um dos únicos movimentos de revolta popular bem sucedido. Manifestantes enfrentaram o governo, lutaram pelo que queriam e acabaram conseguindo. Pagaram pelas conseqüências, mas conseguiram. Prova de que, quando o brasileiro vai à luta, consegue tudo o que deseja, sem ter que esperar as coisas acontecerem.
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Leram? Ótimo. Agora vejam a matéria do post anterior, como ficaria hoje...er...mais ou menos, tá? Mesmo porque, fiz essa com pressa e sem compromisso. Um dia vou ler a reescrita e também vou achar uma merda. Mesmo porque, já vi que o fechamento ficou péssimo. Normal isso.


Em novembro de 1904 estoura, no Rio de Janeiro, mais uma revolução de caráter popular. A Revolta da Vacina está completando 101 anos e traz na sua história o nome de uma importante personalidade brasileira – Oswaldo Cruz.

Rio de Janeiro, Novembro de 1904. Com apoio do exército e dos jornais, Parlamentares, associações de trabalhadores, positivistas, oficiais do Exército, monarquistas e líderes operários criam uma liga anti-vacina, a fim de protestar contra a vacinação obrigatória instituída pelo então secretário de saúde do Rio de Janeiro, Oswaldo Cruz. Começava assim a Revolta da Vacina, o movimento popular que marcaria para sempre a história do Rio de Janeiro.
Oswaldo Cruz havia instituído a vacinação obrigatória após o surto de varíola ocorrido na cidade – surto esse que levou mais de 1800 pessoas aos hospitais em apenas cinco dias. No entanto, vários setores da sociedade não acreditaram na eficácia da vacina, e isso terminou por causar a revolta, que consistiu em várias passeatas onde a população e a polícia entraram em choque.

Vitória dos manifestantes

O saldo dos conflitos foi violento - 945 prisões, 461 deportados, 110 feridos e 30 mortos. Ainda assim, os manifestantes foram vitoriosos, conseguindo a suspensão da vacinação obrigatória. No entanto, um outro surto de varíola, em 1908, viria provar que Oswaldo Cruz estava certo.
A revolta se situa dentro do contexto da Revolução Médico Sanitária do início do século XX. “Todas as evoluções da medicina ao longo do século XVIII e XIX culminaram na revolução sanitária do século XX, e como bem se sabe, todas as mudanças passam por um processo de rejeição antes de serem incorporadas pela sociedade”, afirma o Dr. José Augusto Messias, médico do Hospital Universitário Pedro Ernesto.

101 anos depois

Sendo o único movimento de massas na história do Brasil, a revolta da vacina entrou para a história, não só pelo ato em si, mas por ter sido um movimento vitorioso, conseguindo cumprir seu objetivo inicial.

Thursday, August 25, 2005

Dia Chuvoso

Hoje é dia...ah...ih...esqueci, não sei, nem me lembro. Não uso mais relógio.
Estou voltando para casa, de ônibus. Também estou extremamente irritado com o trânsito, que parece caótico por todos os pontos da cidade.
Se vamos por Botafogo, está engarrafado; por Copacabana, é lento demais; se optamos pelo rápido Túnel Rebouças, descobrimos que também está lento; e finalmente, quando chegamos ao Jardim Botânico e à Lagoa, também está tudo parado.
Hum. Relógio digital: quatro e meia. Deixa eu ligar pro cara, ele deve estar esperando...
Ih, esqueci. O celular ficou carregando hoje.
Mas que merda de trânsito...e que merda, também, que tenho que ficar aqui sentado nesse ônibus.
Lá fora, o dia é cinza, com aquelas nuvens grossas de chuva e pessoas vestindo roupas quentes, portando seus belos (ou não) e funcionais guarda-chuvas. Um dia cinza de luz cinza, a luz do dia que não cessa nunca, nem quando o sol resolve ficar dormindo atrás do morro.
Mas que merda de trânsito. Cacete, é hoje que eu chego em casa!
Agora já devem ser umas cinco horas, e ainda no trânsito.
Cinco e quinze, pelo último relógio digital: desço e resolvo ir a pé mesmo. Não está tão longe assim...
Desço, já de guarda-chuva na mão; desço com ímpeto, saltando do ônibus em direção à calçada, abrindo o guarda-chuva quase ao mesmo tempo (só não foi ao mesmo tempo porque aqui não é Hollywood).
Começo a caminhar, atravessando uma rua, passando por uma ponte, sentindo o vento frio desse dia úmido (argh, que palavra horrível).
Mas algo me incomoda, e não sei o que é.
De repente, olho para a frente, ao invés do chão – e vejo um mundo todo cinza, de ruas molhadas pela chuva fina, folhas espalhadas pelo chão, carros percorrendo caminhos entre as poças de lama, pessoas andando encasacadas.
O mundo não mudou – é o mesmo do ônibus. Só que agora, eu estou nele, agora eu sou o cara que as pessoas presas no engarrafamento observam passar, livre, sem a obrigação de se manter parado.
Cara, o lado de dentro do mundo é bem mais bonito.
Fecho o guarda-chuva quase que imediatamente, jogando-o longe; era o último acessório que me impedia de ser livre (fora o ônibus, que não é meu). Um guarda-chuva novo, bom, todo preto, daqueles automáticos, que custam R$ 5 em qualquer camelô.
Ao mesmo tempo (ou quase, porque afinal, não é Hollywood), reduzo o passo, caminhando mais devagar, apreciando o mundo cinza – os prédios, as folhas, a chuva muito fina, o vento frio, as pessoas, a luz, o clima, o cheiro de...ah sei lá, não importa...só sei que é bom, e continuo...
E passo por entre mundos de folhas, sentindo a água pingar no rosto, me lembrando da primeira vez que eu vi a chuva – e olhei pra cima, pra saber de onde vinha a água e quem tava jogando.
Olho pra cima, repetindo o movimento, e murmurando palavras pra ninguém ouvir.
Minha casa fica logo ali.

I´m singing in the rain / Just singing in the rain / I´m happy again... / Cause I´m just dancing and singing in the rain...
Gene Kelly – Dançando na Chuva

Monday, August 22, 2005

Um texto sobre...coisa alguma?!

Eu não sei porque eu escrevo. Aliás, sei, inclusive já falei sobre isso: pathos.
Toda vez que outros fatores que envolvem essa coisa mística chamada “pathos” acontecem, eu penso logo em escrever...e venho pra cá...e aqui sai tudo. Não consigo escrever só pra mim, bem que eu queria, mas...eu gosto de dividir as coisas. Às vezes, inclusive, podia dividir menos, mas isso é assunto pra outro texto.
Eu também queria que os textos fossem menos claros e mais metafóricos, e deixassem meus sete leitores em dúvida sobre o que eu de fato estou falando. Mas também não consegui vencer o estilo sério, aquele que não consegue esconder nada, que por mais que tente disfarçar, sai falando tudo, para quem a mentira é algo que não deve realmente ser dito.
De fato, já estou até ficando cansado desse estilo. Eu devia ser claro e direto, devia deixar 100% de pathos, porque no fim, a beleza plástica parece apenas esconder o que o texto realmente significa.
Mas será que os oito leitores, o esquilo e o pitbull (eles dois também lêem, de vez em quando) iam ler e apreciar do mesmo jeito? Será que os textos iam mexer com a sensação deles do mesmo jeito?
Talvez sim, talvez não.
Mas, pensando bem, eu não devia mudar o estilo, esse jeito plástico de escrever...afinal, é a melhor coisa que eu sei fazer na vida – ah, sim, fora ser um cara dramático. Só que isso, no máximo, me garantiria uma vaga de contra-regra ou iluminador do teatro...para um dia chegar, quem sabe, alguém, e dizer que eu devia ser dramático na ilusão, e não na vida real. Ou que eu sou dramático, mas pouco na ilusão e muito na vida real...que enquanto não fizer o contrário, não dou para um bom teatrólogo (ui, isso realmente não).
Enquanto isso, escrever textos plásticos pode sofrer uma adaptação e gerar um bom pseudo-jornalista, e claro, sem contar que pode continuar divertindo vocês aqui no blog, fazendo várias sensações e idéias serem propagadas através dessa rede que é a internet...de textos sobre política à textos sobre meninas, pássaros, a vida, a espera, o cotidiano, ou sobre coisa alguma.
É por isso que, embora os textos não sejam tão metafóricos quanto deveriam, ou mais dramáticos do que deviam, ou menos plásticos do que são (beleza enche o saco de vez em quando, né?), eu pretendo continuar, firme e forte, vivendo cada fase e cada texto como se fosse o primeiro.

O contador de estrelas

(ou seria..."uma, duas, três, quatro..."?)

O poeta disse que sabia ouvir e entender estrelas. Disse também que só quem ama é capaz disso.
Eu nunca consegui ouvir – afinal, eu sou pseudo-escritor, não poeta.
Passava os dias esperando a noite chegar, e passava a noite inteira contando estrelas, admirando o brilho, imaginando como seriam...uma, duas, três, quatro...
Quando era pequeno, achava que eram pontos brilhantes no céu...e assim foi até fazer sete anos. Aí ganhei aqueles livrinhos de criança que mostram o universo como ele realmente é...
Não foi um choque, mas muitas coisas mudaram. Não queria nem mais ouvir falar; tinha até medo de olhar demais...agora que sabia que eram um universo enorme, com planetas e corpos celestes muito maiores do que aquele onde eu estava.
Mas aos poucos, o fascínio voltou, e lá estava eu de novo, deitado no chão, admirando aqueles pontos brilhantes, agora que podia compreendê-los melhor. Agora gostava mais: haviam ficado intensamente mais bonitos.
Contava as estrelas, sabia as constelações de cor, os nomes de cada estrela, sabia a posição no céu, a hora que apareciam, quanto tempo ficavam, e até mesmo a hora em que mudavam de posição, deixando o sol surgir, deixando mais um dia começar...
Era basicamente um êxtase ver as estrelas brilhando, sentir o brilho a cada minuto que passava, perceber ali uma força da natureza cuja sensação é incomparável.
Mas me ressentia sempre por não conseguir ouvi-las. Existia em mim a coisa do poeta, a necessidade de ouvir, de entender, de compreender...algo que ia muito além de ficar contando. Existia a necessidade...e eu continuava admirando...e continuava ali...e queria ouvir, mas continuava admirando...e continuava contando...um, dois, três, quatro...
E admirava o brilho, fascinado; admirava o comportamento delas, o ciclo de vida (do nascimento à supernova), achava a coisa mais bonita do universo (literalmente)...mas continuava admirando...e continuava contando...uma, duas, três, quatro...
Existiu um dia, apenas um dia, em que me pareceu conseguir finalmente ouvir.
Ouvi. Sim, eu ouvi...ouvi! Eu ouvi! Falou comigo!
E falava, e eu em êxtase...e continuava dizendo “eu ouvi!”, “eu ouvi!”, e saltava por aí, e saía fora de mim, e não voltaria tão cedo.
E nem me dei ao trabalho de entender o que dizia. Nem me dei ao trabalho de, além de ouvir, escutar...se é que me entendem. O importante era, como diz o poeta, ouvir e entender estrelas...e eu me preocupei apenas em ouvir. Ah, sim, sem contar os saltos enormes,a empolgação por algo...que deveria ter feito sempre.
Agora cá estou eu de volta, observando as estrelas de novo, fascinado pelo brilho e sonhando em um dia ver uma grande supernova, contando-as...uma, duas, três, quatro...
E me perguntando se conseguirei ouvi-las de novo...
Como dizia ele, só mesmo quem ama é capaz de ouvir e entender estrelas...e até aprender, é um looongo processo...
Ah, como brilham essas estrelas...uma, duas, três, quatro...

Sunday, August 21, 2005

As grades do metrô

O dia já havia nascido. O sol já ia alto no céu.
Céu azul de brigadeiro, com umas nuvenzinhas aqui e ali, e um vento fresco como esse que tá soprando agora, mas sempre em intervalos regulares, pra que se sinta a diferença no clima.
O chão é cimento cinza, já gasto pelo vai-e-vem de passos, pela ação do sol, do vento e da chuva.
À frente, se abre um espaço quadrado, que permite que muitas pessoas passem simultaneamente para o outro lado; quem sabe, evitar confusões em dia de jogo no Maracanã.
E lá estou eu, seguindo em direção ao portal...não pensando em nada. Chega de pensar, nessa vida.
E à frente, observo as grades que delimitam o caminho, que servem de apoio. Fundamentais quando se trata de uma passarela como essa, necessárias para conservação e bem-estar do lugar, e claro, evitar acidentes.
Lá estão três crianças, vestindo uniforme de escola, com suas mochilas nas costas, o cabelo penteado pelas mães, o rosto limpo do banho que tomaram há pouco. Podiam estar caminhando pela passarela, conversando, rindo de alguma coisa, pensando nas aulas do dia, ou melhor ainda, no que iam fazer depois do colégio.
Mas, nada disso, tsc-tsc. Estão jogando fora sua agressividade, chutando a grade do metrô, a grade da passarela que nada fez, que está ali por mera obrigação.
Repetem um ritual: chutam a grade algumas vezes, usando inclusive voadoras; depois que o objeto se soltou da armação de ferro, arrancam o que sobrou e deixam lá, destruído. E seguem assim, fazendo isso com as grades à frente, como se fosse algo normal.
Nenhum segurança para impedir. Ninguém para se importar: todos passam caminhando, deixando a cena como está, como se não tivessem visto nada. Devem estar atrasados.
Atrasado está este país, que deixa suas crianças de escola destruindo grades do metrô.
Atrasadas estão as pessoas, que precisam ganhar dinheiro para sobreviver e mal conseguem enxergar os pequenos delitos do dia-a-dia - o que os torna normais.
Atrasadas também estão as crianças, que já deviam ter passado da fase de destruir e deveriam estar começando a construir – primeiro os desenhos mais simples, e amanhã um país melhor.

Saturday, August 20, 2005

Instantigrafia

Instantigrafia

Sentado num banco, em algum lugar do lado de fora da construção cinza, observando o céu lá longe, as montanhas se perdendo no infinito, aquela visão poética da natureza, um pombo passando na frente, uma nuvem deslizando, um avião lá longe.
“Porque a vida me fez passar por todos esses problemas?”
Olha para baixo, observando a construção em arco, os bancos lá embaixo, o palco distante, e vendo as luzes e os sons daquele outro dia. E as coisas ecoam na memória, e o tempo parece voltar, e parece vir de novo...
“Porque será que tudo teve que acabar assim? Será meu destino eterno, que tudo o que for ‘primeiro’ tem que ir embora, e me deixar pensando sobre o que aconteceu, e me preparando pra próxima?”
Agora caminhando pelo amplo espaço.
“Cheio demais. Fique vazio...”
As pessoas somem, e também os carros; agora o espaço é livre para caminhadas, enquanto reflete. Nenhum obstáculo pode incomodar...nada pode estar no caminho...
“Ah, porque será que eu não consigo? O que será que falta? Mas porque falta, como falta, se falta, e de que jeito pode não faltar?”
Alguém aparece.
“Cale a boca e tente, ao invés de pensar.”
A irritação sobe, enquanto alguém some.
Alguém aparece.
“Me disseram que penso muito e não tento.”
“Bah, não deixam de estar certos...”
A irritação atinge um ápice, enquanto alguém some.
“Merda. Merda. O que vai ser de mim amanhã? Ah sei lá que se dane! Mas e se eu fiz errado? Porra, vai à merda, se fez já fez. Mas pode comprometer o futuro...sim e daí, foda-se, se comprometer já era, comprometeu...”
Deixou o prédio cinza e tudo mais pra trás.

Friday, August 19, 2005

Reflexo

Basta olhar pra ver.
Lá estão eles, brilhando ansiosamente, como nunca antes.
Já os vi tantas vezes, mas nunca...nunca parei assim...pra ficar admirando...e mais do que admirar, pra sentir...
Ah, que brilho é esse? Que brilho ansioso é esse? Que brilho é esse, que provoca frio, calor e me deixa sem...sem...sem chão?
Seria um reflexo da luz ou um reflexo da alma? Seria a luz que irradia de dentro, encontrando ali uma fresta por onde brilhar?
Seria uma mistura de todas as luzes?
Ou será que é a luz que irradia de mim?
Não sei, essa coisa de ficar pensando está começando a me irritar profundamente. Sabe, se eu pensar, vou perder esse brilho.
Prefiro continuar aqui, olhar fixo, só admirando...só sentindo...tem algo...ah, que coisa...que coisa...como eu...ah...a luz que irradia...como é gostoso ficar só sentindo...ah...tô com calor nas costas, mas foda-se, essa luz compensa tudo...esse brilho...agora estou me encostando para poder observar melhor...ah...eu não quero pensar em nada, eu quero só sentir...como foi que perdi tanto tempo...ah foda-se isso também...eu só queria ver esse brilho...e sentir tudo o que ele diz...está me dizendo pra continuar olhando...
Que olhar é esse?
Ah, não tenho que descobrir...
Só preciso continuar vendo.
Nenhuma compreensão me faria entender melhor esse olhar...esse brilho...
Simplesmente porque ele não inspira entendimento...
Inspira que continue olhando, vendo, e sentindo, como se fosse a última coisa que eu precisasse fazer.
É, e você sabe bem disso...

Quando a luz dos olhos meus/E a luz dos olhos teus / Resolvem se encontrar.../ Ai que bom quisso ai meu deus que frio que me dá o encontro desse olhar...
Música que eu não lembro o nome - Tom Jobim

Thursday, August 11, 2005

11 de Agosto de 2005

Dez horas que Abalaram a República

Acabou agora, dez e dez da noite, o depoimento do publicitário Duda Mendonça. Amanhã, ele estará nas capas de todos os jornais, e no final de semana, na capa de todas as revistas. O personagem que ergueu a república usando sofisticadas técnicas de marketing político e persuasão eleitoral acaba de dar um golpe nessa mesma república, um golpe digno de mestre, daqueles que pode-se até reclamar com o juiz, dizer que foi baixo, que não vale, mas cuja dor não cessa.
A participação de Duda na crise começou há mais ou menos uma semana, quando o publicitário e sua funcionária apareceram como sacadores das contas da empresa SMPB, do empresário mineiro Marcos Valério, acusado de ser o operador do “mensalão” – o esquema pelo qual o PT compraria o apoio de deputados da base aliada usando recursos de origem não identificada.
Quando sua funcionária Zilmar Fernandes foi chamada à CPI, Duda se apresentou junto, pediu para falar. As razões são claras: ele tem o próprio nome e o de sua empresa a zelar. É um dos, senão o maior, especialista em marketing político do Brasil. Não quer ver seu nome ser arrastado para o centro do furacão e jogado em seguida no mar de lama da crise política.
Foi por isso que se dispôs a falar, e foi por isso que optou pela verdade. Não sei se está falando 100% da verdade, mas assumiu o crime de ter recebido dinheiro ilegal no exterior. Embora isso não o isente e nem garanta nada, ele ao menos assumiu – ao contrário de outros depoentes.
Mas, voltando. Duda Mendonça explicou que foi contratado pelo PT para fazer a propaganda política de quatro candidatos – o presidente Lula, a (agora) ex-governadora Benedita da Silva, o senador Aloizio Mercadante e o ex-presidente do PT José Genoíno (que foi candidato ao governo do estado de São Paulo em 2002). Como pagamento de todas essas campanhas, ficou combinado um pacote eleitoral – um valor que girava em torno de R$ 25 milhões, se não me engano.
Por essa quantia, segundo Duda, o PT não teria nenhuma despesa eleitoral. Tudo o que viesse a ser produzido e gasto seria responsabilidade do publicitário.
Por aí, já parecem cair por terra as versões de Marcos Valério e Delúbio Soares para a origem dos empréstimos da SMPB ao governo, que segundo os dois, seriam para quitar dívidas eleitorais.
Ora, que dívidas, se Duda afirma que bancava tudo? Para que tanto dinheiro – para pagar o publicitário? Mas como, se os pagamentos não foram feitos a ele, e sim a parlamentares?
Continuando. O publicitário afirmou que, até o final de 2002, recebeu parte do pagamento da campanha através de cheques entregues pelo ex-tesoureiro do PT, Delúbio Soares. A partir de 2003, no entanto, quem fez os pagamentos foi o empresário Marcos Valério, por indicação do próprio Delúbio, que afirmou que não poderia conceder nota fiscal aos pagamentos. Estes eram feitos numa agência do Banco Rural em São Paulo, através de malotes de dinheiro, e foram, segundo o publicitário e a sócia, R$ 900 mil, divididos em três parcelas de R$ 300 mil (não tenho muita certeza dos valores).
Em dado momento, Valério teria procurado Duda e dito “olha, tá difícil fazer os pagamentos por dentro, vamos ter que fazer lá fora. Abra uma conta nas Bahamas e você receberá o resto do seu dinheiro”.
Duda afirmou que, desde que foi negada a nota fiscal, sabia que o dinheiro era de caixa-dois. “Ou eu recebia assim, ou não recebia”.
Zilmar, por sua vez, disse que ficou constrangida com o pagamento em malotes de dinheiro, mas acabou recebendo.
Voltando. Duda disse que abriu a conta nas Bahamas, e que o dinheiro foi sendo assim depositado. São R$ 10 milhões, segundo o publicitário, que ainda estão lá. Ele afirma poder provar todas as transações, e colocou seus sigilos à disposição da CPI – inclusive o extrato dessa conta bancária nas Bahamas.

Conseqüências

Duda foi à CPI limpar seu nome, e acabou jogando mais coisas na lama. A começar pelo presidente Lula, que ficou extremamente...enrolado. Mesmo que Duda esteja mentindo em algum momento (por exemplo, no fato de que Valério o obrigou a abrir a conta nas Bahamas), o dinheiro recebido no exterior pode ser comprovado facilmente. Mesmo Valério, que depunha em outra CPI e comentou que “é tudo mentira” (como aliás, vem sendo hábito), não negou os repasses a Duda Mendonça, afirmando apenas que eram feitos em cheque.
Há algum impedimento de que esses cheques tenham sido de alguma conta do PT no exterior? Não. O próprio Valério não negou isso.
É aí que a crise dá mais um nó e avança um passo em direção ao presidente da república. Dinheiro de caixa-dois para pagar dívidas de campanha complicaria a situação de Lula, já que o presidente é responsável pelo dinheiro gasto para se eleger. Por outro lado, dinheiro no exterior complica a situação do PT, que poderia até a perder o status de partido.
É. Dez horas de depoimento abalaram mais uma vez a república. Lula tem que vir à público e falar, desabafar com a nação, ser sincero. Caso contrário, sua situação pode se complicar ainda mais, caso as denúncias de Duda venham a ser comprovadas...e caso apareçam outras.
Querem uma prova de que abalou a república? Hoje mesmo, 21 deputados petistas se desligaram da bancada, e o PT está perplexo com todos os fatos. A economia sofreu um abalo sério, com o dólar saltando de aproximadamente R$ 2,30 para aproximadamente R$ 2,40 em apenas um dia, depois de levar quase uma semana para descer na mesma variação. Lula parece – pela primeira vez, primeira mesmo – escorregar sobre a rampa do Palácio do Planalto.
Nessa altura do campeonato, que ninguém duvide da última hipótese. Quando a crise estava amansando, reacendeu. Não se sabe o dia de hoje, e muito menos o de amanhã.

Tuesday, August 02, 2005

O nome "Pathos"

Pois é, galera, o blog voltou à ativa, mudou de nome e eu nem expliquei o porque da mudança. Também não expliquei o novo nome, que a princípio soa estranho demais. Calma que eu explico...
“Folha de Jornal” foi um nome “emprestado”, peguei de um verso da música de apresentação do Afrorreggae (é assim que escreve?). Aquele que diz “Capa de Revista / Folha de Jornal / Somos Afroreggae / Vigário Geral”.
Mas não era só um nome emprestado, era também improvisado. Eu queria criar logo o blog, e aí esse nome foi um dos mais plausíveis que veio à minha cabeça. Aí não pensei: coloquei.
Só que...bem...não significa nada com nada, certo? “Folha de Jornal” é muito genérico. E pra completar, o que tem de “jornal” no blog? Nada. Os textos não lembram as colunas dos jornalistas. Nem isso.
Aí resolvi mudar.
“Pathos” não é um nome definitivo, pode ser que mude outra vez (embora, em caso de mudança, o endereço vá permanecer). Só que...bem...acho que o nome tem tudo a ver com o blog.
“Pathos” é uma palavrinha grega que deu origem a outras em nossa língua, como “patologia” (essa não tem nada a ver com o blog) e “paixão”. Essa sim.
“Pathos”, em grego, seria...bem...o resumo do significado de “paixão”. São todos aqueles sentimentos que vêm de dentro, que você não explica, que não são passíveis de serem entendidos pela razão, mas que você adora sentir.
E esse blog é isso: um monte de sentimentos que eu adoro escrever, e cara, isso não tem razão lógica. Não sei porque eu escrevo, não sei porque escrevo meus sentimentos, não sei porque publico aqui, e não sei porque volto pra ler os comments; mas tudo isso me dá um prazer danado, me faz sentir muito bem.
E isso é “Pathos”, total, 100%. É por isso que eu escolhi esse nome.
Um grande abraço, meus 5 leitores! Eu amo vocês!

Me deu vontade de contar uma história!

O sol ainda nem nasceu. Do lado de fora da casa, a noite ainda exibe o brilho das centenas de estrelas que enfeitam o céu. Casa simples, de três cômodos, no interior do Nordeste, chão de terra batida e paredes que parecem ser levadas por um vento mais forte.
Aos poucos, no entanto, a claridade vai tomando conta do lugar, e o brilho das estrelas vai sumindo, dando lugar àquele tempinho existente entre o fim da noite e o nascer do sol, quando os primeiros raios atravessam os céus e tocam o solo, ainda com aquela delicadeza e poesia do nascer do sol.
Mal o sol nasce, Dona Lurdinha já está de pé, fazendo café. Acordou antes, e foi olhar as estrelas. Como dorme antes do sol se pôr, não pode olhar as estrelas; então faz isso quando acorda.
Lá está ela, de pé em frente ao fogão muito simples, na cozinha pequena e apertada, de paredes porosas, naquele tom mostarda-amarelado, esperando a água ferver. Assim que a água ferve, Dona Lurdinha prepara o café.
A primeira xícara ela bebe ali mesmo, para “acordar”, quem sabe. Depois enche duas outras e vai se sentar na varanda.
Fica ali sentada, olhando a estrada, os campos lá longe, admirando a grandeza do mundo, olhando o chão daquela terra maltratada. E, principalmente, não desgrudando os olhos do caminho.
Há 35 anos, Seu José foi comprar uma caixa de fósforos na venda da vila, que não fica longe, e disse que voltava, que era para D. Lurdinha esperar.
Ela esperou. Esperou um dia, dois, três, dez, vinte, cinco meses, e nada de Seu José voltar. Os vizinhos diziam “ih, esse não volta mais”.
Mas D. Lurdinha continua esperando. Os olhos brilham ao avistar alguém na estrada, e o brilho some quando ela percebe que não é Seu José que vem vindo. Mas ela continua lá, xícara de café na mão, bebendo aos golinhos, olhando a estrada. E dizendo para si mesma: “José, meu velho, por onde você anda? Seu café está esfriando!”.