Friday, December 31, 2010

Feliz 2011

Já chegou o Ano Novo,
Natal ficou pra trás!
E essa noite começa,
Um ano mais!

Um ano mais!
Um ano mais!
Que todos tenham,
Amor e paz!

Um ano mais!
Um ano mais!
Que todos tenham,
Amor e paz!

Para o ano que entra,
Eu só peço a paz!
Amor pra toda a gente,
E nada mais!

Um ano mais!
Um ano mais!
Que todos tenham,
Amor e paz!

Um ano mais!
Um ano mais!
Que todos tenham,
Amor e paz!

(Roberto Gomez Bolaños)

Pessoal, quero agradecer de coração a todos os leitores do blog, que comemorou seis anos de vida em outubro. Obrigado pela força e por estarem sempre comigo, este espaço não existiria sem vocês. Feliz Ano Novo a todos, e nos vemos em 2011!

Tuesday, December 07, 2010

As luzes da cidade

As luzes sempre me fascinaram. Desde pequeno, desde garoto, tenho paixão por luzes. Desde as lâmpadas das ruas, passando pelas inesquecíveis iluminações de Natal e pelo reflexo das lâmpadas na água da Lagoa e nas paredes dos túneis, até, por fim, as mais belas e fascinantes das luzes, aquelas "luzes da cidade", acesas ao longe, nos prédios, ruas e avenidas, um monte, assim, umas sobre, e do lado, e perto das outras, formando um mosaico brilhante que é suficiente para me deixar em êxtase.

Mas há um espetáculo de luzes que consegue mesmo superar o mosaico luminoso da cidade ao longe: é vê-las mais de longe, do alto, quando o avião começa a descer depois que a noite já caiu. E que me desculpem todas as belas cidades do mundo, mas, nesse ponto, o Rio de Janeiro, com suas curvas e paisagens, é insuperável.

O sinal para isso vem quando o avião dá um pequeno solavanco, indicando que está perdendo altura; então começa a fazer curvas leves, para lá e para cá, à medida que começa a descer. Abrindo a janelinha, é possível perceber a cidade lá embaixo, se aproximando.

O avião então costuma continuar fazendo curvas, descendo mais e mais; agora já é possível observar com mais clareza os primeiros morros, as primeiras avenidas, ruas, e os carros passando lá embaixo; chega a ser divertido brincar, tentando, pelas luzes, pelo formato dos morros e prédios, advinhar por quais locais da cidade estamos passando.

E lá estão elas, belas, brilhantes, completas: luzes por todos os lados, em casas, prédios, avenidas, ruas, carros; formando mosaicos, amontoados, formas distintas, mostrando e identificando cada parte da cidade, cada local, cada bairro, cada edifício, cada favela; e com o avião mais baixo, os mosaicos ficam mais claros, permitindo identificar melhor os locais. Mas saber quais são, ah, ainda é um exercício de advinhação...

Até o momento em que as curvas ficam mais claras, e o avião está tão baixo que só o que se vê é uma determinada parte da cidade; é a sensação clara que estamos descendo. Fim do espetáculo, mas início do retorno à cidade, abençoado, sempre, pelo êxtase luminoso.

Eu realmente adoro luzes.

Sunday, October 24, 2010

O Bêbado Equilibrista

Caía a tarde feito um viaduto
E um bêbado trajando luto
Me lembrou Carlitos...


Não, definitivamente, não era de tarde. E ele não vestia luto, como na música da Elis Regina. Ou será que vestia?
Lembro que ele devia ter 50 anos, usava barba, estava apenas de bermuda e camiseta, e descalço. Uma bermuda velha, esfiapada e curta, cinza. No peito, levava uma camisa amarela, com a inscrição de um congresso espírita. Chegou, assim, entre as ruas Gomes Freire e Inválidos, na Lapa, vindo não se sabe de onde, e indo para não se sabe o rumo.
O andar era torto, e, pela impressão que tive, estava bêbado, mesmo, com dificuldades para ficar em pé. Nunca saberei ao certo; sei que ele vinha catando latas. Uma por uma, ia pegando as latas do chão, e, cada vez que se levantava, tinha que se equilibrar para não cair.
Lembro que ele chegou perto, e já tinha quatro latas, duas em cada mão. Ao ver a quinta no chão, tentou se abaixar para pegar, mas as latas caíram, se espalhando por todos os lados. Com uma paciência de santo, ele se abaixou e começou a catar todas, uma por uma.
Não conseguiu; depois de pegar três, perdeu o equilíbrio, bambeou e quase caiu de cara no chão. A cena provocou risadas em algumas pessoas que passavam; outras olharam com pena; e houve quem desprezasse o esforço do bêbado.
Ele bambeou, mas conseguiu manter a força nas pernas e seguiu de pé, com as latas na mão. Sem ter como segurar a quinta, que havia caído na rua, longe da calçada, se abaixou e mordeu a lata, segurando-a com a boca. Bebendo o conteúdo, seguiu seu caminho, com as quatro latas na mão e uma na boca.
Seria um catador? Um bêbado? Um mendigo?
Quem sabe...não tive a oportunidade de perguntar. Mas, diante da cena que choca, que entristece, que nos faz refletir sobre a condição humana, penso no Bêbado Equilibrista...e penso...
Em nenhum momento ele desistiu. Fosse como fosse, seu empenho era pegar a lata, e conseguiu.
Quantas vezes, na vida, é justamente isso que nos falta? Talvez ainda tenhamos algo a aprender com o Bêbado Equilibrista...


Azar!
A esperança equilibrista
Sabe que o show
De todo artista
Tem que continuar...

(Elis Regina, o Bêbado e o Equilibrista)

Tuesday, October 19, 2010

O Gigante e eu

Ah, Gigante, eu estava com saudades. Olhar, assim, você, de cima, mesmo que vazio, me trás várias lembranças. Várias não...muitas. Inúmeras.

Lembro que, quando cheguei aqui hoje, nem tinha me dado conta disso. Mas algo começou a mexer comigo quando vi um rapaz limpando o busto do Mario Filho, na entrada do hall dos elevadores do estádio. Com habilidade, ele esfregava uma flanela no busto, ia e vinha, lustrava bastante, e cada vez o rosto do famoso jornalista que dá nome ao Maracanã parecia mais brilhante. Em um olhar amplo, é uma síntese do que vem ocorrendo do lado de dentro.

À medida que se sobe nas arquibancadas, é possível ter ideia do tamanho da obra. Lá embaixo, as cadeiras comuns onde me sentei na primeira vez que vim aqui, naquele longínquo 1992, não existem mais. Aos poucos, o espaço ocupado por elas vai sendo destruído por escavadeiras, que trabalham sem parar.

A parte das arquibancadas segue quase intacta, não fosse pela retirada das cadeiras que formavam esse setor do estádio. Não sei qual é a magia que possui o Gigante, mas, simplesmente de ficar aqui, em pé, com o estádio vazio e em obras, olhando para o campo, quase posso ouvir o barulho da torcida. Quase posso ver as faixas, as bandeiras, os jogadores se movimentando, trocando passes, se aquecendo...

Quase posso ver a bola, rainha do espetáculo, sendo chutada com brilho, com categoria, e balançando as redes, no momento mais mágico do futebol. Um simples momento, mas, que de tão espetacular, é capaz de fazer vinte, trinta, quarenta, cinquenta mil pessoas pularem alto e ao mesmo tempo, gritarem, festejarem, sentirem a felicidade pulsar nas veias, beijar o escudo da camisa, abraçar os amigos, os inimigos e os desconhecidos.

Ao olhar o Gigante assim, quase posso ver Júnior Baiano, Marcos Assunção, Romário, Petkovic, Edmundo, Felipe, e tantos outros que marcaram minha vida, todos balançando as redes (não tive a honra de ver Zico jogando ao vivo). Caminho mais, ando mais, e vou me lembrando de outros jogos, outros momentos, do meu pai, dos amigos, e dá uma saudade...

Ao mesmo tempo, dá uma vontade de sair gritando gol, de comemorar, de festejar muito, essa coisa louca que só o Maracanã tem.

Sei que só poderei voltar para ver um jogo de futebol aqui no fim de 2012, ou quem sabe, só em 2013. Mas tenho certeza que, pelo Maracanã, valerá a pena esperar cada segundo.

E, ao deixar o estádio, me viro para o campo e digo, com saudade e esperança no peito: "Até logo, Gigante!"

Thursday, October 07, 2010

Luís e as janelas

O Luís era apaixonado por janelas. Desde pequeno gostava de parar diante dos edifícios e ficar observando o que conseguia. Sua paixão, sua diversão, era ficar tentando adivinhar o que se passava do outro lado.

"Mamãe, olha naquela janela ali...o moço abraçou a moça...e eles estão tirando a roupa, estão deitados..."
"Vamos embora, menino!!!"

Diziam que era enxerido, metido, que gostava de ficar controlando a vida dos outros, e que precisava arrumar algo melhor pra fazer. Ele nem ligava.

"Papai, olha aquele gordinho de cueca ali...já é o quinto pedaço de pudim que ele come!"
"Deixa de ser enxerido, menino!"

Foi crescendo, e, já adulto, a brincadeira virou quase um hobby.

"Hum...veja...aquele apartamento ali tem uma lâmpada sem lustre. Isso significa que o dono é ou uma pessoa sem dinheiro, ou descuidada, do tipo que tem uma bagunça tão grande que sai tropeçando nas coisas. E veja aquele móvel ali...colocado quase junto da janela. Isso significa que a pessoa não tem espaço no apartamento..."

Namoradas, teve várias: todas duraram dez minutos. Mal saía de algum lugar, lá estava o Luís procurando janelas com luzes acesas, ou tentando enxergar por trás do apartamento apagado mesmo, tentando descobrir o que acontecia do outro lado.

"Veja, gata...aquele apartamento apagado ali tem vários caixotes. Devem estar de mudança..."
"Eu pensei...a gente talvez pudesse ir pra algum lugar mais calmo..."
"E olha só, acendeu a luz! Acendeu a luz! E veio correndo! Ali deve ser o banheiro, e ele deve estar apertado! Veja, gata...ei? Gata? Cadê você?"

Os amigos diziam para ele parar com aquela mania, que já estava passando dos limites. Já tinha quase 30 e continuava estudando janelas.

"Luís, deixa disso, rapaz...vai viver a vida, encontrar uma mulher decente, sair pra se divertir...fica só vendo janela..."
"Mas Arnaldo, você não entende! É mais forte do que eu...é algo tão interessante! E tão divertido..."

Luís tentava, se esforçava para parar com aquilo, mas, mal se distraía e já estava ele de novo estudando janelas. Foi quando aconteceu. Vinha de ônibus e acabara de passar pela Rua Belford Roxo, em Copacabana, quando, observando uma janela, teve um impulso estranho e desceu no ponto seguinte.

Lá em cima, diante da janela, estava uma morena linda, cabelos longos, vestida com uma blusa azul, e uma calça - que ele não pôde identificar, porque estava embaixo e a moça estava debruçada. Fascinado, Luís ficou olhando, olhando, sem vontade alguma de ir embora ou fazer qualquer outra coisa. E teve a impressão de que os olhares se cruzaram mais de uma vez.

E assim ficou até que ela se retirou dali. Decidido, voltou no dia seguinte, no mesmo horário, e encontrou a moça no mesmo lugar. E ficou lá, olhando. E assim foi a semana inteira, o mês inteiro. Todos juravam que ele finalmente havia encontrado alguém e esquecido a bobagem da janela; mas na verdade estava lá, mais firme do que nunca.

Até o dia em que, ao lado da moça na janela, apareceu um homem. E a beijou.

Luís ficou arrasado. Tão arrasado que foi para casa e chorou três dias seguidos. No trabalho, ninguém entendeu porque ele insistia em usar óculos escuros o tempo inteiro.

"É que a luz aqui me incomoda..."
"Mas nunca incomodou antes..."
"Ah...descobri ontem que tenho alergia à luz..."
"Alergia à luz? Nunca ouvi falar..."
"É claro que nunca ouviu falar...se é luz, é algo para ser visto..."

Refeito do problema, jurou que nunca mais ficaria olhando janelas.

"Ah, é melhor assim, Luís. Você agora mudou de rumo. Adorei saber disso!"
"Pois é, Arnaldo, nunca mais vou olhar janelas!"
"Isso mesmo!"
"Agora só olho portarias!"

Monday, September 27, 2010

A praia e o tempo

Ajoelhado em meio à praia deserta, a primeira lágrima rolou de seu rosto.

Seguida dela vieram várias, a segunda, a terceira e a quarta, até seus olhos ficarem cheios d´água, molhando seu nariz, seus lábios e seu rosto.

Fungou e suspirou, soluçando alto, enquanto o choro se tornava mais forte, mais convulsivo. Olhando para o céu estrelado daquela bela noite de verão, ele parecia implorar às estrelas por uma solução.

Que não fosse uma solução, então, já que a perda era irreparável. Que fosse um alívio, um conforto, algo capaz de fazer com que sua dor diminuísse.

Mas, enfim, que algo fosse feito. Não podia suportar a dor, a dor incrível da perda, a certeza da separação, e que o inevitável fim havia chegado. E que ocorrera justamente a única coisa para a qual não havia meio nem remédio.

Perdas, já sofrera muitas na vida. Superara todas. Mas essa...era diferente. Dessa vez, não havia nada que pudesse fazer.

Foi quando sentiu uma mão em seu ombro. Um toque macio, delicado, diferente, que deu um aperto muito leve, mas suficientemente confortável.

"Acredite, eu sei e compreendo."

A voz era leve e macia. Olhando para trás, ele vislumbrou a bela mulher diante de si.

"Sei exatamente. Já passei pela mesma situação que você, inclusive mais vezes."

"Mais de uma? Como seria possível suportar?"

"Suportando. Entendendo. Compreendendo os valores, os princípios. E mais do que isso, com a ajuda do melhor e mais cruel amigo dessas horas..."

"Que amigo?"

"O tempo. Ele fará não com que você esqueça, mas sim, com que você possa aceitar a situação. Que comece a ver as coisas de outra forma."

"Não entendo..."

"Não é para entender, amigo. É algo para se pensar. Eu poderia lhe dizer, mas você, do jeito que está, não compreenderia. Para entender, é preciso equilíbrio. E nesse momento, isso é certamente o que você não tem. Está machucado, ferido, cansado. Tudo perfeitamente compreensível. Quando o equilíbrio voltar, você certamente poderá compreender melhor o que eu lhe digo."

Ele olhava a mulher, sem entender muito bem. Se sentindo melhor, enxugou as lágrimas do rosto.

"Que coisa, estou me sentindo em um conto espírita."

"Pode ser. Se você sente assim...então, que seja. Agora vamos, levante-se. De pé."

Ele hesitou, mas obedeceu.

"Muito bem. Confiança. Esse é outro valor importante. Vamos, andemos pela praia. Tenho muito a lhe dizer. E você tem muito a ouvir..."

"Dizer e ouvir...não é a mesma coisa?"

"Certamente não. Vamos."

E lá foram os dois, caminhando pela praia deserta, com o barulho do mar ao fundo, e observados pelo belo céu estrelado.

Thursday, September 09, 2010

A Cidade do Sono

Se eu pudesse, dormiria agora, nesse instante, nesse momento, e viajaria até a Cidade do Sono.

Quem nunca foi não tem ideia de como é. Em uma definição bastante simples, não é um lugar nem bom, nem ruim...apenas calmo. Tranquilo. Sereno. Silencioso.

A Cidade do Sono é o mesmo Rio de Janeiro das praias, os trens, dos bares, dos subúrbios, do samba, dos arcos da Lapa; a diferença é que, por lá, não há gente circulando. Por mais que você ande, não há vivaalma nas ruas.

Nada, ninguém.

Nem carros, nem ônibus, nem caminhões, nada. Apenas os prédios, as casas, as ruas, tudo, como numa grande cidade fantasma. Da mais pura e rara beleza, como só o Rio consegue ser...mas sem ninguém. Sem gente.

Por lá, posso fazer o que mais gosto: andar e falar, mexer a boca, quem sabe, ao mesmo tempo, ouvir música. Sem olhares de reprovação, sem desprezo, sem gente que tenta me ver e entender o que estou fazendo.

Posso andar por todos os lugares, explorar e descobrir cada canto, cada pedaço, cada lugar; ouvir o silêncio mais puro e mais profundo, que às vezes soa ensurdecedor; mas, aí, basta gritar, falar alguma coisa, e quebra-se essa mágica. Sem réplica, sem resposta, sem ser internado como se fosse louco por gritar no meio da rua.

Se pudesse, iria até a Cidade do Sono e caminharia em um belo fim de tarde, com o sol começando a baixar, tomando um mate - sim, há mate na Cidade do Sono, não me perguntem como. Caminharia pelos Arcos da Lapa, me sentaria na grama ali perto, e ficaria olhando o horizonte. Assim, sem hora e sem trabalho - que também não existem por lá.

Depois, iria caminhando devagar até a praia, enquanto a noite cai. E me sentaria por lá, na areia, bebendo uma água de coco, ficaria olhando e ouvindo o mar bater na praia, nas pedras, fazendo aquele barulho que só ele sabe. Só eu, sozinho, solto, sem ninguém, nada, sem horário, sem preocupação - que também não existe por lá.

E quem sabe, dormiria ali mesmo, relaxado e tranquilo. Quando acordasse, iria em busca de uma televisão e passaria horas assistindo. Quem sabe, de uma forma diferente...não sei...levaria a TV para o meio da Avenida Presidente Vargas e começaria a assistí-la ali mesmo, completamente nu.

Soou engraçado? É sério. Fico me imaginando dessa forma, sentado no meio da avenida, vendo televisão, sem nada, sem ninguém, sem gente, apenas eu e a cidade, na forma da relação mais pura, sem crise, sem dor, sem problema. Rindo dos meus programas favoritos, e sem jamais lembrar que algum dia sofri, ou que algo não deu certo, ou que alguma coisa não saiu exatamente como eu esperava.

E, se me cansasse disso, sentisse falta das pessoas, do mundo verdadeiro, dos problemas que não tenho...bastaria desejar, e estaria de volta à Cidade Real.

O mágico é justamente saber fazer a viagem.

Tuesday, August 31, 2010

O sábado

O sábado é algo tão único, tão especial, que é difícil achar um jeito original para falar dele.

Existe manhã melhor do que a de sábado? Mesmo que você acorde à tarde, de ressaca, não existe manhã melhor que a de sábado - nem que seja para ser gasta dormindo. E se você acorda cedo, não existe manhã melhor para fazer exercício, ler o jornal, tomar aquele café, ou simplesmente não fazer nada.

Ah, o café de sábado também não tem igual. Com o radinho do lado então...coisa de louco. Até o gosto do pão fica melhor, mais puro. E a sensação de poder continuar sentado na mesa do café depois que acaba, sem preocupação com a hora...coisas que só o sábado proporciona.

Existe sensação melhor do que deitar na cama, sábado de manhã ou à tarde, e colocar os pés para cima? Poucas, eu diria. E, para quem gosta de exercício, também não existe manhã melhor que a de sábado. Ou tarde. Ou noite. É um dia perfeito por si só.

Alguns dirão...mas...ah, e se chove? Pois não. E aquela sensação de ficar deitado embaixo do edredom, com a chuva batendo na janela, algo quente para beber, assistindo um filme velho e repetido na TV? Existe dia melhor para fazer isso do que sábado? E existe tarde melhor para ficar deitado, lendo um bom livro, sem preocupação com hora, tempo ou coisa qualquer?

Isso porque ainda não falei da noite de sábado. O dia de "todas as baladas", o dia onde surgem pessoas que nunca ninguém imaginou conhecer. O dia onde as pessoas se multiplicam na mesma proporção em que bares e vagas de carro parecem desaparecer. E que, de alguma forma, lembra a cena dos copos de cerveja em cima da mesa, das luzes de neon e a música da pista, do lanche às seis da manhã antes da volta para casa, com as primeiras luzes do domingo.

Sábado, o dia que lembra música, festa, agito. O dia que, por si só, já seria perfeito se fosse apenas a noite. Mas que, ainda bem, é muito mais do que isso.

E viva o sábado.

Friday, August 13, 2010

De casa para o trabalho

O barulho do motor da escova de dentes é sempre o último. Assim que ele termina, já sei: está na hora de sair.

Na verdade, não é uma questão de "saber": é uma questão de hábito. Hábito que começa com banho, vestir a roupa, pentear os cabelos, e por fim, escovar os dentes. E, claro, sair de casa para pegar o 110 e ir trabalhar.

A caminhada diária até o ponto não dura mais que dez minutos: coisa de atravessar três ruas e caminhar uns dez metros. O tempo de espera é absolutamente variável: pode levar entre cinco minutos e meia hora. Isso, quando não saio correndo atrás do ônibus, atravessando a rua esbaforido, tentando alcançá-lo enquanto ele ainda está parado no ponto.

Essa corrida tem dois efeitos interessantes: quando consigo pegar o ônibus assim, o alívio é enorme, e a sensação de sair logo do ponto é ótima. Mas, se ele vai embora antes que eu possa alcançá-lo, fica a frustração. Não dele ter ido embora, mas do fato de saber que o próximo costuma demorar um pouco.

A espera no ponto é outro capítulo à parte. Como o 110 é muito parecido com outro ônibus, o 460 - ambos são amarelos por fora - nunca sei qual deles está chegando no ponto, só quando se aproximam bastante. E como há mais 460 do que 110, é comum que eu passe um tempinho no ponto reclamando e dizendo para mim mesmo: "Mas nossa, quanto 460! De novo ele? Cadê esse 110 que não chega?"

Lá se vão quase cinco anos nessa rotina, com direito às mesmas frases todos os dias. E pensar que, em breve, tudo isso deve mudar.

Tomado o ônibus, é hora de ir trabalhar. Seguir pelo pouco que ainda resta do Leblon e entrar na Lagoa. Primeiro, em uma parte onde ainda não é possível ver o espelho d´água que dá nome ao bairro, e que inclui o Clube do Flamengo, uma academia de ginástica, o Parque dos Patins, o Clube Piraquê.

E, por fim, aos poucos e reluzente, surge a Lagoa. De uma beleza sempre ímpar (ou seria "par"?), é bonito em dia de chuva, em dia de sol, em outono, verão, inverno, enfim, seja como for. Por quase vinte minutos (um pouco mais ou menos, dependendo do trânsito), fica ele ali, à direita do ônibus, dando um pouco de beleza a mais um dia como outro qualquer.

Rotina. Ou não...

Depois vem o Túnel Rebouças, o Rio Comprido, e a virada na Rua Haddock Lobo para ir ao Estácio. Engraçado...esse lugar me lembra alguma coisa.

O ônibus então segue pelo Estácio, cruza a Rua Salvador de Sá, o Sambódromo, e o túnel Martim de Sá, rumo à Rua Henrique Valadares.

Fim do caminho e início de mais um dia de trabalho.

Thursday, August 05, 2010

O professor

Hoje eu o vi pela segunda vez. Sim, não há dúvida: era ele, "o professor". O conheci já faz um tempo - não faz tanto tempo assim, mas, para mim, parece ter sido há séculos.

Seja como for, hoje eu vi o professor pela segunda vez, na mesma rua e no mesmo horário da semana passada, caminhando na mesma direção de sempre - eu indo, ele vindo.

Seu andar continua diferente de qualquer outro que eu já vi. É um andar lento, arqueado, pausado, e de uma simplicidade ímpar. E ele caminha com tal olhar fixo no horizonte que parece não se abalar com nada. Às vezes tenho a impressão de que, se um trem passasse diante de seus olhos, ele parararia com o mesmo olhar fixo, esperaria pacientemente a locomotiva passar, e retomaria seu andar calmo como se nada tivesse acontecido.

É visível que o mestre está mais velho do que naquela época. Seu rosto ganhou mais rugas, os cabelos parecem estar mais escassos, e com mais fios brancos do que cinzas; e o cavanhaque em forma de seta continua contrastando com a barba, que segue malfeita como sempre foi. Às vezes me pergunto se ele já fez a barba algum dia...

Suas roupas continuam chamando a minha atenção: ele anda com uma camisa aberta no peito, um casaco grosso...e bermuda e tênis. Nunca sei se o professor está com frio, com calor, ou um pouco de cada um. Ou se sai de casa com roupa de frio e de calor e escolhe na rua o que vai vestir.

Da mesma forma, seguem seus livros embaixo do braço direito, sempre parecendo mal seguros, como se a qualquer momento fossem se espalhar pelo chão. Mas não: todas as vezes em que o encontrei, ele sempre está com os livros bem firmes, e pelo pouco que pude acompanhar, nunca caíram.

Lembro que o professor tinha algumas manias estranhas, e ao mesmo tempo, invejáveis. Uma delas era não ter televisão em casa, e mais do que isso, não assistir televisão. Adoro TV e fico imaginando como alguém consegue viver sem ela, apenas entre livros, papéis de estudo e anotações. Não sei se ele tem computador com internet, mas desconfio que não. É algo fascinante e muito estranho. Como alguém consegue viver apenas lendo?

A outra mania era sair muito cedo para dar suas aulas. Se a aula era às dez, lá estava ele às oito e meia perto da casa do aluno. Lembro que encontrei com ele uma vez, e o cumprimentei. Conversamos um pouco, e eu disse: "Já vai?". E ele, apontando para uma galeria próxima: "Não, vou entrar aqui e ler um pouco, até a aula das três horas...". Olhei no relógio e eram meio-dia, mas achei melhor não dizer nada: me despedi dele e segui meu caminho.

Hoje, mais uma vez, tive o ímpeto de cumprimentá-lo, mas novamente travei. Sempre penso que ele não vai se lembrar de mim.

Tuesday, July 27, 2010

Como se fosse hoje...

Eu lembro como se fosse hoje.

Lembro do dia de folga no meio da semana, um belo dia de folga, com sol tímido no céu e praia...quase vazia.

Lembro da ida à Copacabana, de manhã, ao som da desconhecida Goldfinger.

Still counting the days I´ve been without you...
Still counting the days that you´ve gone…


Eu me lembro como se fosse hoje daquele banho demorado, depois da volta de Copacabana, banho que relaxa e deixa pronto para outra.

Como se fosse hoje, eu lembro da saída de casa, do ônibus até a Gávea e do almoço, sempre rápido, sempre limitado, mas bom demais, bom como poucos, onde a conversa flui ainda melhor na hora do cafezinho.

Lembro também do tempo fechado depois do almoço, das primeiras nuvens no céu, e do ônibus até o Humaitá, ao som de Gaslight Anthem.

And this was the sound
Of the very last gang in town...


Lembro da chuva começando a cair, ainda leve, tímida, molhando os vidros do ônibus, as pessoas, as ruas, as casas. E, na hora de descer, lembro da chuva, já mais fraca do que antes, lambendo de leve, gota por gota, as lentes dos óculos.

Lembro da caminhada firme, determinada, ladeira acima, com a sensação de que as férias chegam ao fim, mas muita coisa melhor ainda está por vir.

Ah, sim, eu lembro. Lembro que tive vontade de ligar para dois amigos e me surpreendi mais comigo do que com o que eles disseram, simplesmente porque não esperava ligar, e não esperava ouvir o que ouvi.

Como se fosse hoje, lembro da boa conversa a caminho do cinema, e a um amigo que vinha na direção contrária, que não estava no script, mas que aceitou o convite para se juntar a outros dois. E lembro também que um desses amigos foi entregar o ingresso ao rapaz errado, não o da porta da sala do filme, mas o da entrada do cinema...e, como se fosse hoje, lembro da cena arrancando risadas.

Lembro também do meu cochilo em uma cena do filme, e das piadas com atores famosos que apareceram na tela. E não esqueço de um amigo que tentou subir pela escada rolante que desce, e provocou uma cena mais do que engraçada.

Ainda como se tivesse sido hoje, lembro da boa comida japonesa e da certeza de que o dia tinha sido espetacular.

Sim, sim, eu lembro de tudo isso como se fosse hoje.

Simplesmente porque foi hoje.

Thursday, July 22, 2010

A busca

Por um instante, achei que tivesse encontrado.

Não, foi mais do que um instante. Foram vários. Lá estava, firme e forte. Exatamente como o imaginado. Do jeito que já se sabia que era. Assim, puro e simples.

O momento era aquele. Conhecer, conviver, ver, sentir, e quem sabe, procurar entender. Mas, mas do que isso, aceitar. A parte mais fácil, e, talvez, a mais difícil. Parte que exige tempo, paciência, calma, tranquilidade.

Tempo sempre existe, a gente arruma. Mas paciência, calma e tranquilidade faltaram. E, no instante seguinte, quando olhei para o lado, já não estava mais lá.

Para onde teria ido? Fugiu, sumiu ou simplesmente se foi? Não sei, ninguém sabe. É o tipo de coisa que não adianta sair perguntando por aí. É o tipo de coisa que cada um encontra por si. E, quando perde, precisa procurar sozinho até encontrar de novo.

Hora de recomeçar a busca. Busca incessante, que talvez não termine nunca. Mas que talvez sejam a causa e a razão de tudo em si mesmas.

Sabe aquela história de que são as perguntas que movem o mundo, em vez das respostas? É, pois é...

E, como naquele outro texto, saio por aí, quase como louco, buscando, procurando, observando, quem sabe, talvez na procura que não acabe nunca.

Talvez naquela que termine quando eu menos esperar.

Afinal, eu devo estar por aí, bem mais próximo do que eu mesmo imagino...

Saturday, June 12, 2010

Volta...

Onde ela está?

Já devo ter olhado a janela duas vezes. Ou teriam sido cinco?

E nada dela chegar.

Faz calor, hoje está um dia bonito, de céu azul e muito sol. Estou suando com todo esse calor, mas não, me limito a enxugar o rosto, caminhar para lá e para cá, e voltar à janela. Olho lá para fora, mas só vejo o dia lindo. Nada...nada...nem sinal dela.

Às vezes a paisagem me distrai, com alguma coisa que chama a atenção. Veja agora...duas crianças brincando. Devem estar indo à praia. Estão com brinquedos de praia, aquele clássico baldinho, com uma pá. Uma delas está de óculos escuros. E vão brincando como se estivessem indo à praia. Com direito ao tradicional adulto sem paciência, que vai andando na frente, volta e meia olha para trás, balança a cabeça e suspira, pensando que talvez as crianças não dêem tanto trabalho assim. Só talvez.

Outras cenas me distraem. Uma velhinha, um senhor que passa lendo o jornal, um carro mais bonito. Às vezes me pego perdido em pensamentos, e fico me perguntando porque espero tanto tempo por ela. Poderia me distrair, fazer outra coisa, dar um tempo. Sei que, mais cedo ou mais tarde, ela volta. Pode ser assim, de surpresa, ou quem sabe dê um aviso. Um sinal. Aí vai ficar mais fácil de saber.

Que ilusão a minha. Realmente devo gostar de me enganar. É claro que ela não dará sinal. Muito menos agora. Se voltar, vai ser assim, rápida, de repente, me pegando de surpresa. Às vezes fico imaginando que ela está logo ali, me olhando na janela e rindo de mim, apenas esperando que eu me distraia. E aí...ela volta. Chega e diz logo a que veio.

E como ela faz falta, sabe? Eu diria que é difícil viver sem ela. Sinto falta daquele ar diferente que ela traz, aquele gosto de saudade, de ficar pensando nos dias cinzas e nos tempos que já se foram. E lembrar de como eu gosto de dias cinzas. Mas sem ela não tem a mesma graça.

Pode ser até que ela não volte tão intensa, tão forte, mas, se chegar, se voltar, se aparecer, já estaria ótimo.

Principalmente porque está um calor danado. Onde está essa droga dessa chuva, que há quase um mês não dá as caras?

Thursday, June 10, 2010

Lembranças de 98

Eu jamais vou esquecer o dia 12 de julho de 1998.

Aquela era a minha Copa do Mundo. Estava com 12 anos, vi todos os jogos, acompanhei as partidas, fiz tabela, usei camisa, torci como louco. Depois de cada vitória do Brasil, pegava uma bola e ia jogar no quarto, imitando os gols, as jogadas, as pedaladas de Cafu, Roberto Carlos, Ronaldo, Rivaldo, as defesas do Taffarel e os gols de cabeça do Júnior Baiano.

Eu lembro que, naquele dia, pouco antes de França e Brasil decidirem a Copa do Mundo, choveu horrores. Um temporal mesmo. Disse à minha mãe: "É para lavar a alma do brasileiro". Estava certo, embora até hoje não saiba de onde tirei aquilo.

As primeiras notícias chegaram de tarde. Ronaldo está fora, Ronaldo não joga, Edmundo é o substituto. Em campo, lá estava Ronaldo. Não entendi nada. Mas o que mais queria era torcer, vibrar, comemorar mais um título da Seleção. Quatro anos antes, em 94, vi o Brasil ser campeão...mas, com oito anos, não entendia direito a dimensão daquilo. Gostava de futebol em 94, mas não como gostava em 98.

Empolgado pela incrível semifinal contra a Holanda, esperava o penta do Brasil. O juiz apitou e a bola rolou no Stade de France.

Atônito, via a Seleção perder gols atrás de gols, errar passes. Algo não estava bem. E logo veio o castigo, com os dois gols de Zidane. Olhava a televisão abobado, sem entender. Eu e o Brasil inteiro. Posso jurar que Galvão Bueno mal conseguia narrar o jogo. Ele próprio parecia tenso, preocupado.

No fim, o gol de Petit selou a vitória e o título da França. 3 a 0. Incontestável, o placar falava por si.

Inexplicável. Lembro que fiquei sem reação. Com raiva. Chorei. Escrevi furiosamente o nome da França na tabela da Copa e atirei a tabela longe. A Copa de 98, minha Copa, estava perdida. Atirei longe a camisa da Seleção.

A derrota trouxe as perguntas sobre o que realmente acontecera com Ronaldo. O mistério de sua convulsão, de seu corte, e depois, o fato de ter sido escalado em cima da hora, pouco antes da partida. A hipótese de que o Brasil vendera a Copa para ganhar a de 2002 (como de fato ganhou). O clima estranho entre os jogadores no gramado, como, me disseram depois, acontece em um grupo quando há uma convulsão. O chute de Roberto Carlos na bandeirinha de escanteio, no primeiro gol de Zidane, que mostrava o estado emocional da Seleção naquele dia fatídico. Zagallo irritado e transtornado ao ter de responder porque escalara Ronaldo. E muitos outros detalhes que transformaram aquela derrota no maior mistério da história do futebol brasileiro.

Eu poderia falar aqui sobre minha teoria do que aconteceu naquele dia (sim, eu tenho uma, que acredito ser a que mais se aproxima da verdade). Poderia comentar o episódio, fazer um relato jornalístico, citar fontes e informações, frases, enfim. Mas deixo isso para quem quiser saber. Ou para o livro que um dia vou escrever sobre a Copa de 98.

Mas não quero falar de teorias. O fato é que, com a Copa de 98, eu aprendi a ver o Brasil perder.

Para quem foi campeão em 94, ganhar a Copa seguinte seria a apoteose. O êxtase. O máximo do máximo. E acreditar realmente que a camisa amarela não só é forte, como é imbatível.

E isso, meus amigos, desculpem, não é futebol. Futebol é justamente o contrário. É saber que você ganha hoje e perde amanhã. Assim como ganhei em 94, perdi em 98, ganhei em 2002 e perdi de novo em 2006. Futebol é saber que, às vezes, a bola não entra, o time não está inspirado, ou um fator psicológico põe tudo a perder. Foi assim em 98, foi assim em 2006.

De alguma forma, o título de 2002 e a derrota na Alemanha, de novo para a França, já não foram encaradas com a mesma euforia, nem com a mesma tristeza das duas copas anteriores. Foram simplesmente as vitórias e derrotas que cabiam a cada um, pelos feitos dentro e fora de campo.

Jamais vou engolir o mistério que envolveu Ronaldo, as circunstâncias misteriosas e tudo aquilo que cerca o episódio, e nem a tristeza que senti. Mas uma coisa não posso negar: independente dos motivos, dentro de campo a França jogou muito melhor naquele 12 de julho, e mereceu o título.

E isso, meus amigos, é futebol.

Wednesday, April 28, 2010

Dia estranho

Esse é um daqueles dias...estranhos.

Daqueles em que pode fazer o maior sol, dar a maior praia, o céu brilhar em azul, e ao lado de tudo, isso, você estar de folga...mas, mesmo assim, nada fará diferença.

Dia em que alguém conta uma piada que todo mundo ri, mas você não acha a menor graça. E, do nada, você ri de alguma coisa absurda que não tem a menor graça.

É um daqueles dias em que alguém faz uma crítica boba, e você jura que foi a pior coisa que um ser humano poderia ter dito a outro. E fica com o comentário bobo martelando na cabeça...

Dia em que se leva a sério demais o que não tem valor, e pouco o que realmente vale alguma coisa. Dia onde você sai de casa de camisa de meia manga debaixo de um vento frio e chuva fina. Ou sai de bermuda e chinelo diante de uma chuva de granizo...

É um momento em que o tempo não passa, por mais que se faça, e tudo parece conspirar contra. Mas, de repente, quando o tempo precisa passar devagar, ele começa a correr, correr...e quando se vê, já vai longe (e tarde).

Dia em que se tenta escrever um texto, mas se tem a sensação de que ele está mais vazio do que cheio...

Thursday, April 15, 2010

Mais uma madrugada

O vento frio da madrugada soprou mais forte. Apertei o passo.

Caminhando rápido, procurava sair da zona de penumbra e chegar a uma área mais iluminada. O silêncio e a escuridão, sempre tão reconfortantes, me incomodavam.

Passava da meia-noite quando cheguei à esquina. Um pouco de luz, enfim. Virando à direita, retomei a caminhada.

Pela rua, nada. Às vezes um carro. Silêncio e tranquilidade absolutos. Um cenário de paz? Nem tanto. Por dentro, algo me consumia, me martelava. Uma sensação estranha, uma mistura de alívio e cobrança.

Sem querer pensar em mais nada, liguei o MP3. Coldplay.

How long before you decide,
Before I know what it feels like,
Where to, where do I go,
If you never try, then you'll never know.


E seguia caminhando, escutando a música. Olhando para o alto, respirei fundo, e como que acompanhando a letra, vi os planetas que se movem na velocidade da luz. Bem diferente de mim. Tentei apertar o passado, ou o passo, quem sabe, e não consegui. Algo me impedia. Como se eu simplesmente não quisesse voltar, não quisesse chegar.

Deixava algo para trás, embora não soubesse exatamente o que. Ou sabia, mas não fazia nenhuma diferença. De novo. Outra vez. Eu não havia conseguido.

Tudo conspirava a favor, ajudava. Inclusive o tempo, que em alguns momentos parecia parar. Oportunidades não faltavam. Chances havia aos montes. E enquanto cruzava com um casal, que brincava com uma criança na calçada, seguia caminhando. Logo, uma grande avenida para atravessar. Mesmo a essa hora, aqui o movimento é intenso.

Tantos momentos bons e...nada. Nada. Nem sequer...

Nada.

O que me restava? Uma paz falsa, artificial. Uma falsa tranquilidade. E a sensação de fracasso, de fraqueza, de que não, mais uma vez eu não fora capaz.

Enfim, virando à direita, a escola. Ah, a escola. Bom? Não a essa hora. Não há mais mate. Nem aula. Nem professores. Só amanhã de manhã. A terrível sensação de que as coisas são sempre melhor do jeito que são. Como eu destesto essa sensação. Parece um alento a tudo aquilo que não deu certo. Ei, será que alguém pode abrir a escola? Mais fácil ficar por aqui do que ir e voltar...

Palácio da Justiça, a praça. Tudo deserto a essa hora. Uma ou outra pessoa. E só eu. E Coldplay.

All that noise, and all that sound,
All those places I got found.
And birds go flying at the speed of sound,
to show you how it all began.
Birds came flying from the underground,
if you could see it then you'd understand.


O relógio, o relógio que tantas vezes me mostrou que eu estava na hora. Agora não faz diferença, não tenho hora. Posso andar tranquilo pela rua deserta. Ah, como às vezes tenho vontade de voltar...e ir lá e dizer tudo...

Não, deixa pra lá. Agora é tarde demais. Tarde demais, mesmo, já são quase meia-noite e meia, como eu andei. Como eu andei. A avenida a essa hora é deserta, só eu, Coldplay e o vento frio da madrugada.

Andar sozinho por aqui já é rotina, deve ser a terceira ou quarta noite seguida fazendo isso. Seria ótimo...se não fosse...se eu tivesse...

Me socorre, sono, me ajuda, sem você não vou conseguir...

Friday, April 09, 2010

Ni Fu, Ni Fa

Tenho escutado bastante o grupo de rock espanhol Ska-P, que como o nome já diz, é uma banda basicamente de Ska Punk, com algumas vertentes mais "rock clássico tradicional não-gritado". Criticado por se dizer anarquista e anti-capitalista e ao mesmo tempo ter contrato com uma afiliada da Sony/BMG, o grupo canta letras duras, criticas, que possuem uma ideia de "destruir a sociedade atual" e fazer uma espécie de "revolução".

Independente da polêmica, são boas letras, algumas, para fazer pensar. Essa aí embaixo chama Ni Fu Ni Fa (algo como "não fede nem cheira"), e contém algumas ideias interessantes para se pensar em um ano de campanha eleitoral. A tradução/adaptação foi feita por...mim.

Toca o sinal, está tudo preparado, os trabalhos vão começar
Já se pode respirar a campanha eleitoral
Mais cartazes, televisão e rádio contaminam a cidade
Com sua simpatia querem nos enrolar

Mais debates chatos sem credibilidade
Por trás dessa cara angelical se esconde algo mais
Depois de votar, tudo terminado, você não interessa mais
Seus olhos não brilham mais - até a próxima, cara!

Ni Fu Ni Fa
A democracia vira uma bobagem
Você só pode escolher sem opções
Se não está com os grandes, eles vão te esmagar
Toma voto inútil

A cada quatro anos te dão a oportunidade
De votar em branco ou negro, não se pode escolher mais
Submisso como um peru de Natal esperando o dia seguinte, estou
Aguardando o milagre

Nenhum de vocês pode me representar
Me dêem democracia em que eu possa participar
Nos enganam com uma bobagem, essa quimera da liberdade
É tudo besteira!

A roleta gira e gira...

Ni Fu Ni Fa
A democracia vira uma bobagem
Você só pode escolher sem opções
Se não está com os grandes, eles vão te esmagar
Para mim o voto útil, ni fu ni fa...

Ni fu ni fa...

Preparados para jogar
A roleta vai começar
Venham, joguem e percam, já não vão mais!

Tuesday, April 06, 2010

Imagens de Córdoba

A Canãda em pleno crepúsculo. O sol por trás dos prédios na Avenida Velez Sarsfield às 8h30 da manhã. O vai-e-vem de gente na Praça San Martin. O movimento louco nas ruas só de pedestres. As meninas indo e vindo no Paseo Buen Pastor até quatro da manhã. O sorvete do Grido. As empanadas e os lomitos (sanduíche de filé, em português). A Igreja dos Capuchinhos. A beleza e a simpatia das cidades do interior. Os belos locais por onde a aventura é mais que um convite, é obrigação. As viagens em que se sai às oito da manhã e sabe-se lá que horas volta. O sanduíche do Subway. O “kiosco” onde se compra de tudo e que está por toda parte. A Velez Sarsfield de madrugada. As primeiras luzes da cidade ao anoitecer...

Tuesday, March 30, 2010

As crônicas de Córdoba - II

Sao oito da noite. Caminhamos praticamente em silêncio, em direçao a rodoviária, depois de um dia em que andamos muito e falamos o tempo inteiro. Às vezes, um ou outro comentário, uma risada, uma piada. De repente, olhamos para trás...e...lá está, mais um cachorro nos seguindo. Rimos de quase gargalhar. O destino às vezes é engraçado...

Tudo começou bem antes, as cinco da manha, quando acordei com o despertador tocando. Sabia que seria o início de um dia longo e cansativo...ou talvez, de um dia muito, muito bom. Um dia realmente de férias, como eu merecia há tempos.

A primeira missao foi arrumar a mochila. Um casaco, uma calça, mp3, livros...quando olho, parece que estou levando uma mala. Tudo conferido: dinheiro, documentos, cartoes...vamos, entao.

O sol nem nasceu ainda, e o vento frio da madrugada sopra firme pela rua quase deserta. Meus passos sao firmes, rápidos. Acostumado a andar de madrugada no Brasil, passei a ficar sempre alerta para tudo e qualquer coisa. Mesmo que digam que aqui posso andar tranquilo, seja a hora que for...

Fui o primeiro a chegar ao terminal de ônibus. A dúvida. Nao há mais ninguém. Em um canto, um cachorro dorme. Pronto, agora sim. Estamos todos aqui. Mochilas nas costas, passagem na mao, esperamos o ônibus enquanto os primeiros raios de sol clareavam. No instante em que Córdoba acordava, subíamos os degraus do coletivo e partíamos rumo à aventura.

Depois de ouvir música e dormir um pouco, o resto do caminho foi todo de conversa. Caramba, quanto assunto. E quanto mais se fala, mais se tem a dizer, a comentar, a conversar. Tópicos brotam, assim, como um atrás do outro. E a conversa só para no terminal de önibus, quando chegamos ao nosso destino, e é preciso usar o banheiro.

Banheiro usado, mochila nas costas, dia começando, seguimos rumo à oficina de turismo da simpática Mina Clavero, interiorr da Argentina. E tome conversa. Mas agora paramos por um instante. Vamos ver o mapa, saber onde vamos, o que vamos fazer. O tempo é curto e a vontade de conhecer tudo é grande. Temos que escolher. Ficamos com a opçao que pareceu mais razoável: ir até um povoado, depois visitar um museu, e por fim, um balneário. Sabem...águas, nadar...enfim, um ótimo programa para um dia ensolarado, mesmo que hoje ele esteja nublado.

Pegamos o ônibus até o povoado e começamos a andar rumo ao museu, que fica no caminho do balneário. Mas logo pedimos informaçao e descobrimos que aquele nao é o caminho. Entao voltamos, seguimos mais algumas quadras, e por fim, tomamos o caminho certo. ¨É melhor irem de táxi, é longe, senao, vocês terao de voltar de ambulância¨, disse um transeunte. Nao, obrigado, vamos a pé. Afinal, se nao for assim, onde está a aventura?

E tome caminho. E tome chao. E nada do museu aparecer. E tome conversa. Haja assunto. Mas o dia parece inspirado, ninguém quer se calar e todos parecem estar morrendo de vontade de conversar. E tome chao. E nada de museu. Quem foi que disse que o museu ficava a cinco quilômetros? Já devemos ter andado uns sete, e nada...

De repente, uma cabeça de cachorro surge de uma cerca. Ele entao sai, cai na estrada e começa a perseguir um grupo de insetos. Comento que gosto de animais bem longe, no zôo, enquanto minha amiga diz que tem dois e que adora animais. E à medida que seguimos caminhando, o cachorro - um belo exemplar, de cor meio caramelo, de uma raça que poderia ser um cocker spaniel - começa a nos seguir. Será porque ela gosta de animais ou porque eu os prefiro longe?

Seja como for, tome mais conversa, mais caminho, mais chao. Finalmente, chegamos o museu. Decidimos parar, relaxar um pouco, comer alguma coisa e depois seguir viagem. Alguns biscoitos bastam, afinal, comemos bem todos os outros 364 dias do ano.

Ao sair do museu, o cachorro caramelo continuava nos seguindo. E logo a ele se juntou um outro, preto, que andava ali pelo museu, esse, parecendo de rua mesmo. E lá fomos nós, continuando a conversar e caminhando rumo ao balneário, com os dois cachorros nos seguindo, enquanto o tempo decidia se firmava com sol ou se ficava com nuvens. Acabou nao se decidindo...

Depois de pegarmos o caminho errado, ¨invadirmos¨ sem querer uma propriedade e quase sermos atacados por um terceiro cachorro, finalmente terminamos o caminho e chegamos ao balneário. Um belo lugar, calmo e sossegado, com um rio muito gelado, mas ótimo para nadar.

Mas, se antes os cachorros pareceram uma piada, naquele momento começaram a irritar, roubando as coisas, ficando em volta de nós e impedindo que relaxássemos. A brincadeira começou a ficar sem graça. Mas, com a ajuda de algumas outras pessoas que andavam por ali, conseguimos finalmente espantar os dois animais (me refiro aos cachorros) e deitamos na beira do rio. Um merecido descanso para quem dá duro todos os outros dias do ano.

E tome descanso, e tome mais conversa. O assunto nao pára, é possível falar de tudo. Às vezes tenho a impressao de que procurávamos alguém para conversar e falar, muito mais do que relaxar na beira de um rio em uma pequena cidade argentina.

Mas o tempo, esse mistério eterno e inexorável, mais uma vez nao perdoou nada, e chegou a hora de ir embora. Depois de sofrermos com os cachorros, agora a sorte parece estar do nosso lado: um casal que andava por ali se oferece para dividirmos o táxi que veio buscá-los. Que bênçao, nao vamos precisar andar tudo de volta!

O táxi segue por um caminho oposto ao que viemos e nos deixa na beira da estrada que nos leva de volta à cidade grande. Agora é esperar o ônibus para poder voltar. Nisso, o casal que dividiu o táxi arrumou uma carona. Só tem um problema: é uma picape e nao cabe todo mundo sentado.

Dá-se um jeito, aperta daqui, aperta dali, e assim, meio amontoados, rindo daquilo tudo, seguimos em alta velocidade rumo à cidade. Afinal, isso é aventura. No caminho, o motorista vai contando suas histórias, dizendo que vive tranquilo em Mina Clavero, e que conhece parte da Europa. Mas nao, ele nunca foi ao Brasil. O chamo para ir ao Rio de Janeiro, como faço com todo mundo que troca duas palavras comigo. E por fim, descemos na cidade. Fim da aventura?

Longe disso, agora o maior desafio é procurar algo para comer. Mas que cidade é essa onde todos os restaurantes estao fechados no sábado, e os que estao abertos custam os olhos da cara? O jeito é comer um sanduíche na padaria. Com garrafa de coca-cola comprada em uma vendinha, para poder comer o sanduba na mesinha do lado de fora, debaixo de uma sombra para fugir do sol das cinco da tarde. E nao tem sensaçao melhor do que comer, beber, se recostar na cadeira e pensar que as férias estao apenas começando...

Enquanto a noite chega, ainda falta tempo para pegarmos o ônibus de volta. Entao vamos a um banco de praça, com o que restou da Coca-Cola. E tome mais assunto, mais conversa, enquanto o tempo parece voar. Ah, se eu pudesse nem voltar para casa...como é bom estar viajando, de férias, livre, sem tempo, fazendo apenas o que dá vontade. Mas o tempo, esse que nada perdoa, trouxe a noite e as estrelas. Infelizmente, é hora de pegar o ônibus de volta.

Sao oito da noite. Caminhamos praticamente em silêncio, em direçao a rodoviária, depois de um dia em que andamos muito e falamos o tempo inteiro. Às vezes, um ou outro comentário, uma risada, uma piada. De repente, olhamos para trás...e...lá está, mais um cachorro nos seguindo. Rimos de quase gargalhar. O destino às vezes é engraçado...

E como é o destino, o cachorro nos segue até o terminal. Que, aliás, parece um jardim zoológico: tem cao, besouro, cupim de luz, enfim, de tudo um pouco. Há a dúvida. O ônibus virá? Teremos de passar a noite nesse zôo?

Nao, o ônibus chega. O sono me vence na estrada, e quando acordo, lá está Córdoba, meio dormida, meio acordada.

E isso era só o começo. Eu tinha seis horas para dormir antes de uma segunda e nova aventura...

Monday, March 15, 2010

Cronicas de Córdoba - I

(Este teclado nao tem o ¨til¨, por isso usarei ñ).

O tempo acabou.

Ñao foi exatamente um city tour, eu diria que foi mais um passeio rápido onde se contou parte da história da cidade.

Que importa? Será que faz diferença?

Ñao sei. Sei que o tempo acabou. Olho para os dois lados, e de ambos, só vejo gente desconhecida. E agora, o que fazer?

Melhor ñao perguntar isso em voz alta, ñao ia pegar bem. Deixa para lá. O tempo...o tempo ñao acabou, na verdade ele é infinito. E mais do que nunca, é meu.

Só me resta andar. Muito. Por toda parte. O máximo que puder. Mais do que a história, nesse momento vale sentir a cidade, procurar entendê-la, viver um pouco e viajar menos.

Afinal, parafraseando o poeta, viver é preciso, viajar ñao é preciso.

Andar. Andar por aí. Esse sorvete ñao é tao bom, já tomei melhores. Ninguém faz sorvetes como os de Buenos Aires. Sentado sob um canteiro, o tempo passa. As pessoas também. A rua parece vazia. Estranho. Essa hora da tarde?

Andando um pouco mais, encontro o movimento. Um formigueiro de gente em uma rua estreita. Vendedores ambulantes no meio da rua. Lojas de todos os tipos, vendendo produtos de todas as formas, cores, marcas, preços, tamanhos. A sensaçao de sair da Argentina e cair no Japao. Quem mandou andar em uma rua transversal e nao na principal? E de uma rua para a outra, a sensacao se repete. Caramba, que lugar incrível.

E de onde saiu tanta mulher bonita? A forma por aqui anda caprichada...é uma atrás da outra.

Andando mais, paro para comer um alfajor. Esses alfajores me lembram aqueles biscoitos casadinhos de padaria, só que aqui sao em tamanho gigante. Digo, repito, ninguém faz alfajores melhores do que Buenos Aires. Nem alfajores nem sorvetes.

Falta algo ainda para terminar. Mas vamos, antes que o leitor se vá. O caminho leva a uma praça, provavelmente o destino final. Que lugar engraçado. Parece concorrer em tudo com a capital. Tem sua própria marca de alfajor, de sorvete, e em vez dos tradicionais cafés, aqui o forte sao as padarias e lanchonetes. Até sanduíche com nome próprio eles têm...

E que mania estranha, ouço falar mais ¨cordobês¨ que ¨argentino¨. Um nacionalismo particular, interessante, mas de certa forma, meio provinciano.

Sentado numa praça, é o fim. Ou o início do caminho de volta.

(Continua...)

Thursday, February 18, 2010

Se as escolas de samba do Rio tivessem nascido em SP...

Alguém dúvida que teriam nomes mais ou menos assim?

Mangueira: Camisa Verde e Rosa

Salgueiro: Flor da Tijuca

Beija-Flor: Príncesinha de Nilópolis

Viradouro: Império do Barreto

Unidos da Tijuca: Pavão da Zona Norte

Porto da Pedra: Morro de São Gonçalo

União da Ilha: Cabeções da Ilha do Governador

Portela: Águia de Prata ou Paulo de Madureira

Vila Isabel: Nenê de Vila Isabel

Grande Rio: Entorno da Cidade

Mocidade: X-9 de Padre Miguel

Imperatriz: Coroa Verde e Branca

Friday, February 05, 2010

A entrada de Copacabana

Há algo de fascinante na "entrada" de Copacabana.

"Entrada", assim mesmo, entre aspas, porque é entrada para mim. É por onde eu entro em Copacabana vindo de Botafogo, no trajeto de todos os dias entre trabalho e casa.

Mas, esquecendo os detalhes, há algo de fascinante. Algo que não sei explicar muito bem o que é. Então, melhor nem tentar.

Diria que o trecho entre o Túnel Novo e a Praça Cardeal Arcoverde - a própria praça e mais um trechinho - tem algo de especial.

Tudo começa com o Túnel Novo, ou Túnel Coelho Cintra. Em um dia claro e de sol, o fascínio começa pela luz amarela do sol batendo nas paredes do túnel (na parte que ela chega...), mas, principalmente, do outro lado, formando uma imagem meio branca, meio amarela, meio enevoada, entre prédios, asfalto, carros, rua, a praia lá longe...

Num dia de chuva forte, é claro, não dá para ver nada. Já à noite, o fascínio é quase infantil, quase tolo, quando os olhos se perdem pelas luzinhas do teto do túnel, que parecem correr em alta velocidade pelo lado de fora do ônibus. E do outro lado, brilham as luzes da noite, as primeiras luzes de Copacabana, o sinal do meio do caminho.

Depois que o ônibus atravessa o túnel, chega a Copacabana. Chega em um pedaço pouco circulável, onde quase não vejo gente andando a pé. Praça Demétrio Ribeiro. Tenho uma curiosidade danada de andar a pé aqui, mesmo sabendo que não tem absolutamente nada demais.

E toda vez encaro a estátua do tal do Demétrio, que não sei quem é (político e educador gaúcho, diz a Wikipedia), mas que está sempre em pose de reverência, curvado, como que saudando quem chega.

Então, passamos pela Rua Prado Júnior e entramos na área dos bares. São três ou quatro, um atrás do outro, ali, antes da Rua Belford Roxo, na Barata Ribeiro. Aqui já há gente circulando. É quase como se fosse um oásis no meio do deserto.

Essa é a área mais fascinante, junto com o túnel. Os prédios antigos, o jeitão apressado de um bairro calmo, gente andando nas ruas, movimento, e ao mesmo tempo, uma sensação de paz, de calma, que é ainda maior à tarde, com o sol batendo nas grades, nos muros, nas paredes.

Já devo ter sonhado umas duas vezes com esse lugar. Inexplicável.

Por fim, o ônibus avança, entra em uma área meio mórbida da Barata Ribeiro, onde parece que é sempre noite, há pouca luz e quase não vejo gente circulando. Aqui tem uma loja das Casas Fernandes que me lembra um comercial da própria loja, que via quando era pequeno, com meu pai, e que era engraçado (o comercial, não meu pai).

Mas não tenho a menor ideia sobre o que era.

Está acabando, a área fascinante vai chegando ao fim. O ônibus vira à direita na Praça Cardeal Arcoverde e entra na Rua Tonelero. Os prédios já são mais modernos. Essa área já é mais histórica...foi aqui, na Rua Otaviano Hudson, que nasceu a Bossa Nova.

As luzes já são mais intensas, e depois de passar por um colégio e por um restaurante, cruzamos a Rua Marechal Mascarenhas de Morais.

E aqui termina a "entrada" de Copacabana...

"A mesa e a janela" ou "Devaneios"

Há quanto tempo sentei nessa mesa, junto da janela, pela última vez?

Hum...pensando bem...lá se vão...três anos e meio.

Cheguei há quatro. No início, era comum sentar aqui. O tempo sobrava, a rotina permitia, havia espaço, tempo, vontade.

Engraçado. Quando lembro do tempo em que ficava nessa mesa, tenho a impressão que o relógio seguia devagar, lento, os ponteiros demoravam a girar, as semanas se arrastavam, os meses não acabavam.

De repente, tudo mudou.

Os ponteiros começaram a voar, o tempo ficou curto, as responsabilidades aumentaram. Corria de um lado para outro, passava o dia inteiro ocupado, raros eram os momentos de tempo.

Não dava tempo nem de sentar aqui. Mal conseguia comer...

Depois, tudo mudou de novo. Mas meu ritmo já era veloz, rápido, frenético, e nunca mais me sentei aqui.

Hoje achei tempo.

Engraçado. Essa caixa de metal esteve sempre nesse mesmo lugar, lá fora, no parapeito da janela? Que coisa. Tinha a sensação que dava para ver mais a rua, as pessoas passando, essa casa velha - porém conservada - no meio dos prédios, o sinal de trânsito lá longe.

Esse sinal, também. Ele não era mais perto? E não era mais escuro? Teria sido pintado de branco nesse meio-tempo? E quem mais se ligaria em tantos detalhes?

Mas algo não mudou - esse quadro na parede, alguns palmos acima da cabeça, em frente ao local onde estou sentado. Sim, tenho certeza que é o mesmo quadro, o mesmo desenho.

A sensação, bem, essa também mudou. Antes havia uma ansiedade, uma expectativa, uma vontade de crescer, uma fé no futuro capaz de motivar qualquer um.

Pena que ainda não inventaram viagens a Netuno. Deve ser divertido. Ao menos, lá, as frustrações são outras.

Ou não, quem sabe. No planeta Plutão tem inflação?

Belo título de um livro infantil - e é, mesmo. Me lembro como se fosse hoje. Não, naquele tempo eu ainda não ficava nessa mesa. Na verdade, estava há alguns quilômetros de distância.

E penso no texto, e ele também mudou. Revela demais. Deixa de ser sobre uma mesa e passam a ser devaneios sobre outras coisas.

Mas aquilo que se tenta ocultar é o que mais aparece.

E que dia lindo está fazendo hoje. Sim, se não me engano, também fazia um dia lindo da última vez que estive aqui. Pronto, achei um elo de ligação.

Ou um outro texto...

O sonhador e o fim

Ligou o estabilizador, a torre, a tela. Lentamente, as luzinhas do computador se acenderam, iniciando o programa.

Com tudo carregado, ele clicou no ícone da internet, digitou seu endereço de e-mail e esperou pela resposta do servidor.

Digitou nome, senha e entrou no e-mail.

Lá estava a mensagem. Enfim, um sinal de vida. Clicou uma vez.

Leu.

Não acreditou.

Leu de novo.

O golpe parecia doer mais do que ele queria admitir. Continuava sem acreditar. Como ela tinha coragem?

Leu uma terceira vez.

Continuava meio sem acreditar. Como num instinto, fechou o e-mail no “x” no alto da tela, encerrando o programa todo.

Levantou da cadeira ainda meio tonto, sem saber muito bem o que fazer. Tentou andar pelo quarto, mas num instante, tudo parecia girar, como se estivesse fora do lugar.

Voltou à cadeira, abriu de novo o e-mail, leu a mensagem uma quarta vez.

Irritado, deu um soco na mesa, fechei o e-mail de novo. Ficou de pé. Não conseguiu e sentou.

Aos poucos, o olhar foi se perdendo, como se ele olhasse para ontem. No lugar ao lado do computador, onde estava o ar-condicionado, pareceu se formar uma pequena tela. Ali passaram imagens dos dois, dos bons momentos, dos maus momentos.

Dos momentos estranhos, também. Da forma como ele pensava a situação. Do tempo que passou refletindo sobre o assunto. Dos dias que deixou de sair para imaginar como seriam as coisas...

Queria chorar, mas ao mesmo tempo, não queria. Achava que não valia a pena. Mas, ao mesmo tempo, tinha certeza de que valia.

Era o fim, é claro. Agora era tarde – e não só porque passava da meia-noite. Muito tarde, aliás.

Ele jamais poderia esperar algo assim depois de um dia tão bom, de tudo o que havia acontecido. Pensava em culpar sua sorte, mas sabia que, por ser quem era, jamais poderia fazer isso.

Como que acordando do transe, ficou de pé. Aos poucos, o quarto voltou ao foco, as coisas já não giravam mais.

O olho bateu na janela, e lá fora, no dia lindo que fazia.

Calçou o sapato e saiu para dar uma volta.

Thursday, January 21, 2010

Sobre alguma coisa qualquer

Os lugares estão lá, mas os olhos, o olhar, não.

Parece que ainda posso ver. Caminhando pelos mesmos locais, ainda pareço escutar sua voz, lembrar do brilho dos seus olhos. E quem sabe, daquela risada a cada piada que eu fazia...

Mas não, agora é tarde. Não há mais ninguém. Só sobrou a estrutura. O restaurante, o bar, o ponto do ônibus, o posto de gasolina. O copo vazio...

Quantas vezes ele esteve cheio?

Não sei, perdi a conta. Foram muitas. Bastava ficar vazio para se encher novamente. Não chegava a ser um passe de mágica, não era tão assim. Era mais uma coisa automática, um movimento direto. Mas sem a contrapartida da repetição pós-movimento, como naquele velho filme do Chaplin...

E que importa? Agora só sobrou o copo vazio. Tem cerveja perto, mas não tem mais a mesma graça. Sem o brilho daqueles olhos, perdeu toda a graça. Sem carro, não tem combustível.

E aqui estou eu, sentado, sozinho, olhando o céu e a próxima estrela brilhando. Me sentindo estranho por pensar num texto tão poético, tão romântico, se há dúvidas se realmente acredito em tudo isso.

Se o tempo que passou realmente passou, e se vale a pena lembrar de todos aqueles olhares...

Eram apenas mais alguns, diante dos 2.354 que ainda vou encontrar pela vida. O copo ainda vai se encher muito. Ainda haverá muitos lugares, muias estruturas, que se tornarão mais do que isso...

Ah, como eu gostaria de acreditar nisso.

Sim, tudo continua como antes, mas parece que alguma coisa mudou. E sobre o que era o texto que eu estava escrevendo, mesmo?

Acho que era sobre alguém, alguma coisa, algum lugar...ou seria sobre o mistério do tempo? Ou sobre o copo de cerveja vazio?

Não sei. É hora de pedir a conta, o tempo acabou...

Wednesday, January 13, 2010

O Largo - parte II

O ônibus fez a curva na Rua Bento Lisboa e cruzou os últimos metros até chegar à frente da Igreja Matriz da Glória.

Seria coincidência? Parece que foi ontem (e não foi?) que escrevi sobre um certo Largo do Machado, e aqui estou eu novamente.

Os tempos, é claro, mudaram. Me levantei e desci do ônibus, desligando o MP3, e cruzei os três degraus até a calçada.

Por ali, uma família que à primeira vista parecia de mendigos. Não, não eram: era gente esperando o ônibus. Fui vítima do meu próprio preconceito. Isso era uma coisa que não existia no "velho Largo"...

Deixando essas ideias estranhas para trás, segui até o sinal e atravessei a rua, chegando à praça, esse local onde o Largo é mais Largo.

São seis horas, um dos meus horários preferidos. Daqueles onde não é mais dia e ainda não foi noite. Sob as luzes dos postes acesas, o movimento é intenso. Gente vai e vem. Pessoas conversam. Crianças brincam, velhinhos jogam cartas, trocadores pegam água, motoristas cospem no chão, estudantes seguem rumo a algum lugar que certamente não me dirão qual é.

A essa altura do campeonato, a velha galeria do Condor já acendeu suas luzes, assim como as lojas do outro lado da rua. E estou chegando mais perto do metrô. E há mais gente andando, correndo, falando...

Às vezes tenho a sensação de viver num mundo à parte. Como seria possível que, de um simples passeio, alguém caminhasse o tempo inteiro imaginando a cena, capaz de descrevê-la depois? Não sei, realmente, devo ser um caso raro de loucura.

Até porque esse último parágrafo não fez qualquer sentido. Ou não.

Mas a praça já chegou ao fim, e a hora é de atravessar a rua. Por fora. Esse não é um bom local para circular assim, como se tudo estivesse bem e nada fosse um problema. Aliás, não só aqui como em todo o Rio.

Deixando isso para lá, sigo em frente, até a hora de atravessar de novo a Rua do Catete. Esse é o ponto onde o Largo deixa de ser Largo e passa a ser alguma coisa que ninguém sabe bem o que é.

E não adianta perguntar à prefeitura, ela coloca no IPTU o bairro mais caro.

Enfim, muitos metros depois, o destino está selado. Agora é hora do primeiro chope...

Wednesday, January 06, 2010

Largo

Saudade do Largo do Machado.

Não do Largo de hoje, deserto à noite, silencioso demais, sujo demais. Saudade de um Largo de outros tempos, outra época, que, se não era melhor - e talvez realmente não fosse - ao menos parecia muito.

Tenho um carinho especial por esse pedaço de mundo entre Flamengo, Laranjeiras e Catete, que consegue a mágica de não ser nenhum dos três. E tudo começou faz tempo, faz tempo...

Lembro do som da velha gaita que eu nunca aprendi a tocar. E de uma janela - tinha uma mesa em frente? - por onde entrava o sol escaldante das quatro da tarde, que batia no meu rosto com força e me fazia suar. Mas quem disse que eu desistia de tentar continuar tocando a gaita?

E depois que o sol descia, ali pelas cinco horas, era hora do passeio - que deve ter acontecido uma ou duas vezes. Mas valia a pena. Seguia para comer um folheado de queijo em uma loja chamada Frère Jacques. Ia de mãos dadas com meu pai, ansioso pelo folheado. E ele ia cantando, em francês, a música que tinha o mesmo nome da loja:

Frère Jacques, frère Jacques,
Dormez-vous? Dormez-vous?
Sonnez les matines! Sonnez les matines!
Din, dan, don. Din, dan, don.


E eu cantava, mesmo que meio sem saber o que era nem entender uma palavra. Mais tarde, a loja do folheado acabou. E ele foi trocado por um quibe. O quibe do árabe também era mais do que especial. Mas uma certa palha-de-aço no recheio acabou com a magia da coisa..

Saudade do Largo do Machado.

Não o Largo do Machado só dos folheados e dos quibes. Mas também o da loja de vídeos. Tinha um que de especial, não era uma loja de vídeo como as outras. A começar pelo fato de que eu raramente ia lá. E a continuar pelo fato de que parecia ser maior e mais farta do que qualquer outra videolocadora.

Já achei coisas ali do arco da velha. Era capaz de perder horas ali. No início não era assim: eram apenas duas fileiras de filmes, uma em cima e outra embaixo, naquelas capinhas plásticas que tinham um papelzinho preso nelas. Se a gente queria o filme, tinha que escolher, tirar o papelzinho respectivo e entregar no caixa pra receber a fita.

Aos poucos, a coisa mudou. As duas fileiras viraram cinco, dez, quinze, vinte. Ganharam um subsolo. As capinhas plásticas com papelzinho foram trocadas pelas respectivas fitas. Agora não tinha mais risco de entregar o papelzinho errado, receber uma fita diferente da escolhida e descobrir isso só chegando em casa.

E foi assim que os filmes se multiplicaram, e pude encontrar verdadeiras raridades. Mas o tempo passou, e as fitas começaram a virar DVDs, até sumirem. Hoje só tem DVDs. Coincidência ou não, nunca mais voltei...

Saudade do Largo do Machado.

Não só o Largo dos folheados, dos quibes, da videolocadora, da Sendas (hein?), da Galeria do Condor, da Parmê. Mas também o Largo do velho cinema da galeria do Condor. Por ali passaram várias fitas que não vou esquecer: Professor Aloprado, Noviço Rebelde, O Sexto Dia...

Tinha um ar diferente, de cinema antigo, escondido. Hoje nem existe mais, virou igreja...

Saudade do Largo do Machado não só de lojas, cinemas, lanchonetes, mas de Papai Noel. Era lá que eu esperava o Bom Velhinho, em uma casa mais do que especial. E durante anos foram assim. Aquele apartamento na Rua Machado de Assis virou uma espécie de segunda casa do Noel (o velhinho, não o músico).

É...saudade do Largo do Machado.