Friday, November 06, 2009

Eu, a casa e o silêncio

Abri os olhos. Estava deitado de bruços sobre a cama, o rosto encharcado de suor. Nem um vento batia. Por uma fresta da janela, entrava um tímido raio de sol.

Me estiquei na cama, virei de barriga para cima e encostei a cabeça no travesseiro, também molhado de suor. Olhei o relógio na parede: quinze para as oito da manhã.

Era cedo ainda, meu desejo era dormir mais um pouco. Bocejei. Tentei fechar os olhos, pegar de novo no sono, mas nada. Não tinha mais vontade de dormir, embora tivesse sono. Ou seria o contrário?

Sem jeito, sentei na cama, me espreguicei, botei os óculos. Confirmei a hora e fiquei de pé.

Dei três passos até a porta do banheiro, entrei, fechei-a. Fiz minhas necessidades, lavei as mãos, o rosto, saí.

No silêncio da casa, apenas meus passos ecoavam. Todos dormiam profundamente, naquele estado de sono tão bonito de observar, de ver. Mas temo acordar as pessoas quando olho demais. Então voltei à cozinha, abri a porta e saí para o quintal.

Fazia um dia lindo, maravilhoso, de sol escaldante, céu azul sem uma nuvenzinha no céu. E nenhum barulho, nenhum ruído, nada. Na casa quase vazia, apenas o silêncio. Nem lembrava o mesmo cenário há três dias atrás.

Hoje é o dia
Eu quase posso tocar o silêncio
A casa vazia
Só as coisas que você não quis
Me fazem companhia...
Eu fico à vontade com a sua ausência...


A música do Capital Inicial veio, assim, discreta, sem pedir. Sem rádio, sem nada. Veio na cabeça. Era a síntese daquele momento tão estranho e tão singular. Só essa parte. Depois disso, perdia o sentido, a razão, a força...

Caminhando pela varanda de chão de madeira, me aproximei da mesa vermelha com quatro cadeiras em volta. A mesma que estava cheia e movimentada nos últimos dias. Agora não havia ninguém. Pelo chão, uma parte do jornal de domingo estava caída, suja, rasgada. Em uma das cadeiras, o resto do jornal. Lido, relido, remexido, agora já não servia para mais nada.

Em cima da mesa, já não havia nada. Minto: havia um pedaço de linguiça, um que caíra do prato no dia anterior, e que provavelmente não fora limpo. Curiosamente, não havia formigas em volta.

Deixei a mesa lá e fui me sentar no sofá, mais adiante. Olhar o céu. Pensar um pouco no que fazer. Era cedo para ir embora e tarde demais para ficar...

Depois de quatro segundos sentado, cansei e decidi fazer alguma coisa. Voltei ao quarto, enfiei a mão na mala e procurei o livro que havia trazido.

Quase pude lembrar das palavras de minha mãe dizendo que aquele livro era muito pesado para uma viagem tão curta, e que dificilmente teria tempo para lê-lo.

De certa forma, faltara tempo. Mas agora não. Agora tinha todo o tempo do mundo.

Voltei ao sofá, deitei e comecei a ler. Até que chegou a hora de ir embora.

Despedidas, beijos, abraços. E a casa ficou um pouco mais vazia...

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