Monday, August 28, 2006

Quem canta...seus eleitores espanta?

O tempo me falta. Essa vida de quase-pseudo-talvez-um-dia-jornalista não me permite sentar e assistir à propaganda eleitoral na tv, como sempre fiz. Seria por hábito? Também. Mas gosto de saber o que andam pensando nossos políticos. Antes, gostava de ver para sonhar com um país melhor. Amadureci e agora vejo para me divertir, e ver como certas pessoas são extremamente cara-de-pau.
Mas como eu disse no começo, me falta tempo para assistir à tv. Por uma coincidência do destino, a propaganda eleitoral no rádio é de 7 às 7h50 da manhã, e tenho ouvido os programas enquanto tomo café. Não ria. É tão divertido quanto ouvir as notícias do dia.
Pois bem, o rádio tem uma dinâmica diferente da TV. Não há imagens - por isso os políticos precisam recorrer à voz, se apresentar antes de falar e colocar um apresentador, que o chama e diz "Bom dia, fulano". Certo? Errado. Tem uns que esquecem de se apresentar e saem falando. Aí é ótimo, fica aquela voz do além. Divertidíssimo.
O melhor de tudo é que a maioria dos candidatos majoritários e ao senado usam musiquinhas - os famosos jingles eleitorais. Pois bem, vamos ver o que os nossos candidatos andam cantando.
Hoje a análise é sobre os candidatos ao Senado Federal. Aqui no Rio, concorrem Jandira Feghali (PCdoB), Francisco Dornelles (PP), Ronaldo Cezar Coelho (PSDB) e Alfredo Sirkis (PV) pelos partidos maiores. O resto não sei direito: parece que o PSTU lançou a Dayse, e tem uns outros aí. Mas por hora fico só com os grandes mesmo.
O jingle da Jandira Feghali, a primeira colocada nas pesquisas, é 'clássico' e fica martelando na cabeça:

Jandira
Feghali
Senadora de todo o Rio!
Jandira
Feghali
Senadora de todo o Rio!


Lembrem-se que a eleição para senador envolve todo o estado, e existe uma "rivalidade" entre interior e capital. E claro, Jandira é a "senadora da capital". Será que esse jingle não quer fixar o nome dela e passar a idéia de que é uma senadora de todo o estado?
O jingle do segundo colocado tem um foco totalmente diferente, vejam:

Está entrando no ar a Rádio 111. A rádio de Francisco Dornelles senador! Este ano você vai votar e escolher apenas um senador. Então lembre-se: vote um, um, um, vote Dornelles!

Na hora de votar pro senado só tem um
Um um um
Pro senado só tem um é Dornelles
Um um um
Pro senado só tem um!
Guarde isso na memória
Dornelles é que tem história
Um um um
Pro senado só tem um é Dornelles
Um um um
Pro senado só tem um!


Repare na brincadeira entre o "um" do número, o "um senador", o "um" como sinônimo de "único" e por último, o próprio número do candidato, 111. A idéia desse jingle é fixar o número e dizer que Dornelles é o melhor, o único que deve ser escolhido.
O jingle de Ronaldo Cezar Coelho é completamente diferente dos outros dois. Observe:

Eu sou Rio
Eu sou Ronaldo
Mais compromisso...
E menos papo (é!)


É curto como o de Jandira, mas a idéia passada aqui é que o candidato é de fazer, não é de falar. E a própria música brinca com isso - porque passa a mensagem em poucas palavras.
Por último, o de Alfredo Sirkis, do PV, é o mais inteligente de todos, mas ao mesmo tempo, o mais difícil de entender:

Eu vou de 433
Sirkis!
Eu vou de 433
(vou votar pra senador)
Sirkis
Eu vou de 433...


Para quem não entendeu: o número do candidato é 433, o mesmo de uma linha de ônibus que liga o Leblon a Vila Isabel. Aí brincaram com o número, tipo, "vou de 433" seria o mesmo que "pego o 433", "escolho o 433", num duplo sentido ônibus e candidato. Apesar de inteligente, é problemático: quem mora fora da capital não vai entender a brincadeira.
É isso aí, não voltaremos a qualquer momento com mais bobagens e análises eleitorais. Um abraço!

Thursday, August 17, 2006

Post Scriptum

Rio de Janeiro, 17 de agosto de 2006.

Caríssima,

Como vai a senhora? Desde que se mudou não nos falamos mais. Ouvi dizer que a sua melhorou de vida, e que agora está muito mais tranqüila, longe desse monte de problemas. Será verdade?
Tudo mudou por aqui. A prima Paula continua namorando o Rick, acho que já namorava quando a senhora se mudou...mas, de qualquer jeito, o namoro continua firme. Diz ela que em breve vai se casar. Não acredito muito, mas...quem sabe.
Os pais dela se separaram, não sei se a senhora soube. Uma briga feia, mas foi um estopim, já tinham problemas há muito tempo. Depois da separação, tio Eduardo casou com uma fonoaudióloga, e tia Eunice com um militar, algo assim. Ela se mudou para Cabo Frio, levando vários pertences; ele ficou na casa onde moravam. Sempre encontro tio Eduardo, mas nunca mais vi a tia.
Papai...ih...esse tá numa situação difícil, sabe? Perdeu o emprego e nunca mais achou. E a situação ficou mais chata depois que ele brigou com o tio Eduardo, a tia Judite e o tio Gilberto. Brigou mesmo, se irritou, disse que não queria mais falar com eles. Parece que eles mandaram ele achar o emprego perdido e ele não gostou. A situação tá difícil, ele tá quase perdendo o apartamento em Belo Horizonte, vai ficar sem o dinheiro do aluguel e ainda não sabe como vai fazer. Temo por ele, sabe, senhora? Não sei que futuro o espera, não. Tomara que as coisas dêem uma virada, tá precisando.
Tia Judite continua muito bem, apesar dos pesares. Continua casada com o tio Sérgio, ainda morando em Petrópolis. Os primos já estão grandes e cuidando da vida: primo Guilherme entrou para a faculdade, está estudando comunicação e trabalhando. Já o primo Lúcio decidiu fazer teatro. Se formou na escola Pena sem Dó, estrelou várias peças e está subindo na carreira de ator, devagar e aos poucos. Mas os dois vão indo muito bem. Prima Bruna cresceu, claro, mas ainda está na escola, ainda tem muito chão pela frente.
Enquanto isso, tio Gilberto é o que está melhor: ainda casado com a tia Iara, trabalhando e juntando seu dinheirinho. Ele comprou uma casa em Madureira, uma casa só dele; e para felicidade geral, voltou a estudar. Concluiu agora o segundo grau, foi o orador da turma e sonha estudar Geografia e virar professor, aos 55 anos. Provou que nunca é tarde para se aprender. Diria eu que ele está escrevendo uma bela página na história da própria vida.
Aqui em casa estão todos bem. Vó Cláudia passou por um susto depois de enfartar, mas já voltou para casa, está bem e se recuperou de maneira excelente. As tias Maria e Marta também estão ótimas, assim como mamãe.
Eu vou bem também: entrei para a faculdade, emagreci quinze quilos e descobri que amo trabalhar com jornal, assim que fui estagiar no jornal A Noite. Fiz novos amigos, venci aquele antigo bloqueio da escola e hoje sou outra pessoa. Claro que ainda tem muito pra conquistar, mas...eu chego lá. E continuo sonhando, senhora: quero estudar fora do Brasil e completar minha formação.
Vou ficando por aqui, está tarde e amanhã tenho que acordar cedo...dia de trabalho e de luta. Muito bom poder falar com a senhora. Mande notícias daí, ou me telefone, ou me escreva de volta, será um prazer saber como a senhora está.
Muitos beijos de quem lhe ama muito,

Renato

Friday, July 21, 2006

Uma chance

Chorava. Pela primeira vez em muito tempo, não se conteve, nem procurou frear o que sentia.
As lágrimas escorriam por seu rosto e molhavam o chão; soluçava alto, chamando a atenção de quem passava pelo lado de fora do quarto.
Debruçou a cabeça sobre a cama de hospital e chorou ainda mais forte, de maneira mais intensa. Sua esposa afagou-lhe a cabeça, e soltou algumas palavras de carinho. Não ouviu. Não sabia se era o som do próprio soluço ou se "tampara" os ouvidos de propósito.
À medida que perdia as forças, o choro foi ficando mais fraco. Segurou o lenço que a esposa estendia e enxugou as lágrimas.

Vamos?

A pergunta dela parecia redundante. Sim, deveriam ir. Nada mais poderia ser feito naquele lugar. Era tarde demais.
Quantas coisas poderia ter feito para salvar aquela vida? Um outro hospital? Um outro médico? São Paulo, talvez. Não, não, os Estados Unidos. Estados Unidos? Não. Europa ou Japão. O que havia de mais moderno. Aquela vida não poderia acabar daquele jeito. Não, devia ser uma ilusão. Chegaria em casa e escutaria o choro, correria para o quarto e abraçaria o filho pequeno. Tiraria o menino do berço...e o seguraria com os braços estendidos de pai, num gesto forte e superior. Sim, era isso.
Olhando-o, a esposa leu as linhas do rosto, e murmurou baixinho:

Ele se foi, Arnaldo.

Desatou a chorar novamente, agora já no volante do carro. Não conseguiu nem virar a chave da ignição. Sua cabeça tombou sobre o volante e as lágrimas voltaram a rolar. Oito meses. Pensou em Deus. Como morre um menino oito meses? Como as coisas podem ser tão cruéis?

Deixa que eu dirijo, Arnaldo.

Parecia uma ordem, e não um pedido. Como se a esposa fosse dirigir não só o carro, mas todo o resto, dali para a frente. Hesitou.

Não insista, Arnaldo. Você não está bem.

E você, retorquiu ele. Você nem sequer chorou!

Não seja injusto! Você devia prestar mais atenção em mim. Além do mais, há outras formas de tristeza...embora eu também já tenha passado pelo choro. Vamos, deixa que eu dirijo.

A resposta o deixou desconcertado. Percebeu que a esposa estava muito mais triste do que ele, mas dominava melhor o sentimento. Deixou que ela dirigisse.
Chegaram em casa, ainda num clima pesado. Ele foi direto ao quarto de Leonardo, como se ainda quisesse encontrar o filho por lá. Olhou em volta. Foi ao berço. Só faltou procurar nas gavetas e dentro do armário. Desanimado e de cabeça baixa, se sentou no sofá vermelho do quarto, que comprara para o pequeno assistir televisão.
A esposa veio até ele e se sentou do seu lado. De fala mole, ele disse...vamos ter que dar todos esses móveis e o berço. Nos mudar para um apartamento menor. Não tem sentido esse quarto aqui.
A mulher se aproximou dele, segurou sua mão, e disse:

Tudo bem. Mas antes, preciso te contar uma coisa.

Dominado pelo desânimo e sem imaginar o que fosse, perguntou o que era.

Estou grávida.

Em meio à tristeza, tinha uma chance para recomeçar. Deu um beijo na esposa e foi fazer um café bem forte.

Thursday, July 20, 2006

Estrela brilhante (Grito de Guerra)

Tudo está ligado hoje.
E continua a mudar o mundo.

Entendendo o significado da minha vida
Sinto que não devo sentar e esperar.

Eu acredito em mim.
Não posso perder...
Eu ainda consigo correr atrás!

A vida continua.
Eu quero encontrar meus sonhos.
Em algum lugar minha alma grita por isso!

Entre dez milhões de estrelas brilhantes
Quero brilhar mais do que todas.
Quero encontrar a Justiça através de mim.
É hora de construir o futuro!!!!

P.S.: Tradução do inglês que é tradução do japonês. Desculpem pelos possíveis erros... =D

Saturday, July 15, 2006

O confuso do sonhador

De "A morte do sonhador", de outubro, neste blog:

"Chegou em casa, subiu até seu apartamento e deitou na cama, sem saber direito o que fazer. Então era assim? Os sonhos podiam ser pisados desse jeito, e traídos assim? Todo o tempo e todos os sonhos não valiam de nada? Ela, sem saber, matara um sonhador.Ele, sem saber, se tornara um, mais um entre muitos, e sinceramente, não sabia como ia ser. Não sabia nem se ia ser."

Bom-dia, alô, alô, Rio de Janeiro! Que dia bonito de sol, Beliza Ribeiro! Estamos começando mais um programa aqui na Rádio Bandnews FM.

O rádio o acordou. Abriu os olhos devagar, deixando o quarto entrar em foco aos poucos. Ricardo Boechat? No céu existe Ricardo Boechat?
Sua mente, que na noite anterior relaxara completamente, agora trabalhava a mil. Boechat? Então não morri...
Se espreguiçando e soltando um grande bocejo, sentou-se na cama, os cabelos ainda despenteados, a camisa e a bermuda amarfanhadas. Dormira daquele jeito mesmo, de tanto cansaço. Olhou em volta do quatro, como se a explicação que procurava estivesse ali, em cima da estante. Sua mente voltou a trabalhar: não, não morrera. Longe disso. Apenas dormira uma longa noite. Quanto tempo?
Olhou para o rádio-relógio que o acordara: nove horas. Não era tarde, mas era muito para quem dormira às oito e meia.
Ficou de pé, se espreguiçando de novo, deixando os lençois para trás, enquanto o sol invadia o quarto. Dormira realmente muito...mas não parecia renovado. Ao contrário, parecia que tudo o que acontecera na noite anterior ainda pairava sobre sua cabeça, como uma grande e pesada nuvem. Depois de uma noite tranqüila, relaxada, tudo voltava.
Nove horas. Nove horas. Nove e cinco. Lembrou que precisava estar no escritório às dez em ponto. Ligando o botão de velocidade máxima, tomou café, tomou banho, escovou os dentes, escolheu a primeira roupa que encontrou, pegou a chave do carro e saiu correndo.
No trânsito, parecia disperso, desligado. Quase bateu no carro da frente. Avançou um sinal e por pouco não provocou um acidente grave. Merda, merda, dizia para si mesmo. Assim não dá. Não posso.
Parou o carro em frente à Igreja Batista da Lagoa. Que se danasse a hora e o trabalho: se um pequeno atraso o demitisse, achava outro emprego. Desceu, pegou a pasta, atravessou a rua e seguiu para a Lagoa. De frente para a água, arremessou a pasta o mais longe que pôde; depois, tirou o celular do bolso e pisou nele com força, atirando seus restos na água logo em seguida. Por último, tirou o paletó e o atirou o mais longe que podia. Livre. Livre, enfim!

Acorda! Acorda! Por acaso te pago pra sonhar? Preciso dessa porcaria de relatório ainda hoje!

Acordou. Não estava na Lagoa. Sua pasta estava aberta na mesa à sua frente. Seu celular tocava insistentemente, com 12 ligações não-atendidas. Seu paletó estava na cadeira às suas costas. Seu chefe gritava, esbravejava. E ele estava sentado na mesma mesa de sempre, junto à janela. Sonhara antes ou depois de chegar ao trabalho? Não sabia. Mas metade do relatório estava digitado. Sem entender nada, continuou aquele trabalho, de forma mecânica.
Quatro e meia, hora do pão de queijo. Estranhamente, se lembrou de descer para comer o pão de queijo, mas não se lembrava de tê-lo comido. Que tempo estranho era aquele, que teimava em apagar algumas coisas?
Não estava bem. Às seis, uma tremenda dor-de-cabeça o impediu de trabalhar. Pediu para sair mais cedo, e ficou surpreso quando o chefe o liberou. Um pouco de paz, enfim.
Na volta, também mal conseguia dirigir, embora estivesse melhor. Decidiu ir pela Praia. Quem sabe olhar o mar o ajudasse a ficar mais calmo...
Decidiu ir para casa, voltar a dormir. Não era hora de acordar ainda. Mas como, dormir de novo? Tinha que trabalhar na manhã seguinte.
E, num giro daqueles de filme, tudo à sua volta desapareceu. Estava de pé, na frente de seu carro, com a chave na mão, às nove e quarenta da manhã.

Wednesday, July 12, 2006

Take me out when september ends

Tudo começa na UERJ. Andam dizendo por aí que estou misterioso demais, que estou ocultando informações e coisas assim. E estou, mesmo. Aliás, estava, agora já não tem mais segredo. Saí de fininho hoje de manhã, com uma furtividade adquirida em recente treinamento. Ninguém nem me notou. Quer dizer, quase ninguém. Algumas pessoas me encontraram no ponto de ônibus, e tive que parcialmente revelar minha missão. Mas consegui escapar...e lá fui eu, de 464, rumo a um Dia de visita.

Duas e meia da tarde

Finalmente estou chegando à redação. O silêncio ouvido a princípio contrasta com a idéia original do ambiente: muito barulho, principalmente de telefones tocando, e de gente gesticulando, falando, trocando informações o tempo todo. Mesmo assim, continuo. A princípio, a dúvida: não tem orientação, nem sei onde é que fica a repórter. Vou perguntando aqui e ali, até que um repórter baixinho e simpático (que vim a saber depois que é da editoria de polícia), diz, apontando: "é pra lá".Olho na direção indicada e vejo-a, finalmente. E lá vou eu, crachá preso ao pescoço, ansioso pelo que vai acontecer...

Duas e quarenta e cinco

Após alguns breves minutos de conversa, acabo de perceber que nada está garantido. E fico me perguntando o que estou fazendo ali.Ela então começa a digitar a matéria no computador, já no espaço devido. E eu começo a me meter, dizendo "ih, como leitor, eu não entenderia aquilo ali". "Olha, você esqueceu o f na palavra tal". A relação de cumplicidade parece tão grande que ela me mostra uma matéria recente e diz "inventa uma legenda pra foto, pra não termos que repetir essa".

Três horas da tarde

Depois dela me dizer que acertei na legenda (embora não vá ser a que vai pro jornal), continuo me perguntando o que estou fazendo ali. Estaria sendo submetido a algum teste para entrar em algum tipo de sociedade secreta? Ou seria simplesmente um dia pra conhecer a redação?

Quatro horas da tarde

A repórter me diz que precisa apurar uma matéria, e pede que eu me sente ao lado do editor. A ele, faço várias perguntas, sobre o funcionamento do jornal e coisas assim. A frase que choca:

"Não é mito que eu modifico a matéria do repórter. Meu papel é definir o que o leitor vai ler. Modifico, sim, e pronto. O máximo que o repórter pode pedir é para que a matéria não seja assinada, mas aí, é o próprio repórter que sai perdendo."

Enquanto responde às perguntas, o editor começa a montar as pautas do dia. Ele pega enormes blocos de texto (as pré-pautas) e começa a enxugar as informações, deixando-as as mais resumidas possíveis. No caso de existirem mais de um bloco de texto, enxuga cada um separadamente, para depois reescrever todas as informações num bloco só.Ao mesmo tempo em que monta as pautas, ele consulta repórteres, buscando novas informações e tirando dúvidas sobre os textos que está escrevendo. Tudo terminado, envia as pautas para os editores-chefe, e me manda voltar para a mesa da repórter.

Cinco e meia da tarde

Mais conversas com a repórter. Faço cara de cansado, e ela pergunta se quero um café.Bebendo o café, conheço rapidamente o repórter baixinho (o mesmo de quando cheguei aqui), e descubro que ele é da editoria de polícia. Ele, a repórter e mais um outro (que não sei quem é) começam a falar sobre a Jeany Mary Corner (é, a cafetina do mensalão) e a conversa evolui rapidamente para a Rita Cadillac e as chacretes, passando pelos filmes pornôs (o baixinho diz que já viu filmes pornô com a Rita, que ela faz filmes desse naipe há muito tempo). Terminado o café, volto para a mesa junto com a repórter.

Seis horas da tarde

Mais conversas. Pergunto à repórter se existem free lancers no jornal, mas ela diz que não. Então pergunto sobre voluntários, e afirmo que quero ser um. Ela diz que vai negociar com o editor, e depois me dá a resposta.Em seguida, me convida pra ir lanchar.

Seis e quinze

Antes do lanche, passamos na sala da apuração, aquela onde tem rádios ligados na polícia, e onde os telefones tocam o tempo todo. É também onde a repórter resolve dar uma mãozinha pro apurador. Depois ela me apresenta o mesmo: é um repórter famosíssimo, da editoria de polícia, um dos melhores que existe. Ela me diz que aprendeu com ele. Ele então começa a me interrogar:

Qual seu nome?

Rafael.

Sobrenome?

Cavalcanti.

Filho de quem?

(Fiquei sem graça e não entendi bem a pergunta. A repórter respondeu por mim: de ninguém, não é filho de jornalista).

Ah...e o que é seu pai?

Era empresário.

Não é mais?

Não. Não deu certo.

Ele agora é aposentado?

Não. Está estudando para fazer concurso público.

(A repórter fala com ele, diz que eu também quero ser voluntário. A resposta quase me emociona...) Vem. Se quiser, eu te ensino. Mas por favor, depois não passe na rua e não finja que não me conhece. Tem uns aí que eu ensinei tudo, e eles passam na rua e nem olham pra minha cara. Não essa aqui (aponta pra repórter), essa daqui continua a mesma, sem nariz em pé.

A repórter e eu saímos, afirmando que vamos lanchar. Ela diz que depois vou ficar lá um pouco, conversando com o famoso jornalista. Fato que acabaria não acontecendo...

Seis e vinte

Agora estamos eu, a repórter e uma colega dela de redação, sentados na mesinha, lanchando. A conversa flui, falando de faculdades e tal, e a colega afirma ser contra faculdade de jornalismo. Diz que é técnica, que um curso resolveria tudo. A repórter permanece calada. Em dado momento, a repórter fala que quero ser voluntário, e a colega corta logo o barato:

"Não pode abrir esse precedente. Senão a gente aqui era mandado embora..."

A repórter então explica à colega que o processo seletivo acabou de acabar, e coisa e tal. Fim de lanche, e voltamos à redação.

Seis e meia

Agora a redação começa a ferver. Os telefones tocam o tempo todo; jornalistas colocam o fone no ombro e correm para terminar seus textos, apurações e o que mais for necessário. Todos pesquisam na Internet, procurando saber se não há nenhum fato novo, nada que ainda possa ser transformado em matéria.Sento-me novamente ao lado do editor, que agora cuida da página e do espaço em que as notícias serão publicadas. Ele não pára quieto, indo e voltando, olhando a página, as matérias, consultando um e outro. Num desses intervalos...

Quero me tornar voluntário...

(Risada) Ah não, isso não existe.

Existe sim.

Não, não existe.

Nesse instante, chega um repórter, que pelo que ouvi anteriormente, deve ser sub-editor, ou algo assim.

Olha só, quer ser voluntário.

Ih, não existe não. Você desvaloriza o trabalho do seu colega. Eu sempre digo aos meus alunos: não façam nada sem remuneração ou sem supervisão.

Além do que, se bater o fiscal do trabalho aqui, vai querer saber quem é você, e o que está fazendo aqui. Não, voluntário não existe em grandes empresas (ou, ele disse "em grandes espaços" ou "é algo irreal", ou "não temos pessoas trabalhando de graça em grandes empresas", algo assim). Ainda é cedo pra você se preocupar com redação...

É claro que as informações são um choque: vão contra tudo em que eu sempre acreditei. Ainda bem que o choque é rápido, nada sério...

Sete horas da noite

Agora chega, preciso ir. O editor volta, num de seus intervalos, já me despachando (ou será que não?).

Agora vou ficar assim, Rafael, levantando toda hora...

Já vou.

Ah. Muito prazer. E não se preocupe. Ainda é cedo pra você se preocupar com redação...

Quando volto para me despedir da repórter, ela está conversando com uma colega, passando meu curriculum. Quem sabe.

Sete e quinze

Termina o Dia de visita. Baixas? O comportamento "curto e grosso" do editor, e algumas idéias muito "dentro do sistema". Ganhos? A experiência de viver um Dia de redação.Um dia estarei de volta – mesmo que não seja aqui. Já não tenho mais dúvidas: não há vida fora da redação. E dentro, será que existe?

O texto acima foi escrito e publicado neste blog, em primeiro de setembro do ano passado, uma quinta-feira. O nome do repórter baixinho de Polícia é Bartolomeu Brito, mas ele é mais conhecido como Bartô, mesmo. O repórter foda de polícia se chama Lúcio Natalício, mas é mais conhecido como Natal, e é uma figuraça, meio tantã, mas gente boa. A colega da repórter é a Teresa Fayal, que já deixou a redação. Prefiro continuar sem revelar os nomes do editor e do subeditor de Economia.
Cumpri minha promessa - voltei à redação, e mais rápido do que imaginava. Em 6 de dezembro já estava aqui, e dia 7 já trabalhava dedicadamente. Mas, como maldição de jornalista, estou pagando pelas minhas palavras: fui perguntar se não existia vida fora da redação, e agora, minha função não me permite ir para a rua. Vamos ver se a lógica invertida (ou a inversão da lógica?) me ajuda: sei que existe vida dentro da redação. E fora dela, será que existe?

Tuesday, July 11, 2006

Diário de um quase jornalista: O sonho muda, mas não morre

Diário de um quase-jornalista: Sonho jornalístico é assim, muda mas não morre
Em minha mente - terrível quando se trata de formular teorias que não terão muita utilidade no dia seguinte - penso agora sobre o nobre ofício de jornalista, sobre as armadilhas e "coisas da profissão". E digo que cheguei a essa conclusão num dia ensolarado, no meio da redação, no meio do expediente, e parei para escrever. Nenhuma matéria ou trabalho ficará adiada por conta de quinze minutos escrevendo.
Escrevendo. Foi assim que tudo começou para mim, há quase...doze anos e lá vai fumaça. Escrevia tudo, até o que não se podia escrever. Escrevi para não falar sozinho. Foram várias fases de escrita: histórias bizarras sobre Cavaleiros do Zodíaco (uma verdadeira febre em 1994), contos de heróis, resumo de jogos de videogame que nunca existiram (e nunca vão existir), histórias de detetives que não tinham fim, nem começo, nem personagens, e por fim, com meu tempo já escasso, escrevi alguns contos medievais, algo meio "O Senhor dos Anéis". De tanto escrever e de tanto que me fazia bem, decidi que não queria fazer outra coisa na vida...
E fui estudar jornalismo. Achei que tinha mais a ver do que Letras, é sempre aquela coisa...Letras parece faculdade de quem vai dar aula, e eu não queria isso. Não demorei a descobrir que jornalismo não é só escrita, e que não escreveria para sempre, não viveria escrevendo. Jornalismo, antes de tudo, é apuração, porque é ela quem monta e organiza seu texto: os fatos mais curiosos, engraçados, importantes, vão para a parte de cima, para atrair um leitor disperso - o atento sempre, ou quase sempre, lê tudo. A escrita é toda organizada pelas informações, é meio presa, amarrada. Para completar, limita-se a um espaço pequeno, onde tudo precisa estar muito claro mas pouca coisa pode ficar subentendida. Isso, no jornalismo escrito - nos meios radiofônicos e televisivos, nem se fala, escrever apenas organiza a informação para ser veiculada através da voz e da imagem.
Isso me decepcionou? Não. Descobri que apurar, por mais difícil que seja, é interessante. E que encontrar soluções criativas para organizar bem as informações também é interessante. Descobri que encontrar boas histórias e bons personagens e escrever muito bem sobre um fato teoricamente banal, também é interessante. Troquei meu sonho por outro: quero viver descobrindo boas histórias, e contando-as da melhor forma que puder, da maneira sempre mais completa possível. E continuarei escrevendo, "por fora", por puro e simples prazer. Como faço aqui no blog.
Ossos deste nem-sempre-tão-nobre ofício.

Saturday, July 01, 2006

França 1 x 0 Brasil

A taça do mundo é nossa
Com o brasileiro
Não há quem possa
Eeta esquadrão de ouro
É bom no samba
É bom no couro

(Copas de 58 e 62, Suécia e Chile)

Escrevo às duas e quinze da manhã de 2 de julho de 2006. Para os que gostam de futebol e curtem a Copa do Mundo, o dia de ontem entrou para a história como aquele em que a teimosia, a insistência e o “futebol feio”, onde “o gol é detalhe” e “o show é ganhar”, levou um baile do futebol-arte, jogado com raça e com vontade. Perdemos. Estamos fora da Copa do Mundo da Alemanha. E diga-se de passagem, com muita justiça.
A França tem um time excelente? Não. Mas jogou melhor o tempo inteiro, com raça e com vontade, soube atacar, defender e jogar no contra-ataque. Já o Brasil repetiu os erros dos últimos quatro jogos: prendeu demais a bola, fez muita firula, não jogou com velocidade, não criou (me desculpem a expressão) porra nenhuma e ainda deu espaços para o adversário. Está aí o resultado: perdemos de novo para os franceses, nossos eternos carrascos em Copa do Mundo – além de 2006, eles ganharam também em 86 e 98.
Do lado brasileiro, há os piores e os melhores, claro. Cafu, Roberto Carlos, Juninho, Ronaldinho Gaúcho, Ronaldo, Adriano e Kaká não jogaram absolutamente nada. Com exceção de Juninho, não fizeram nada a Copa toda. Todos pareciam o Romário em seus últimos anos de seleção: quero a bola no pé para fazer o gol. Palmas para Dida, Lúcio e Juan, que salvaram o Brasil de perder para Croácia, Austrália e Gana, e hoje evitaram um desastre contra a França.

70 milhões em ação
Pra frente Brasil
No meu coração
Todos juntos vamos
Pra frente Brasil
Salve a seleção...
De repente é aquela corrente pra frente
Parece que todo o Brasil deu a mão
Todos juntos vamos
Pra frente Brasil, Brasil
Salve a seleção!

(Copa de 70, México)



Parreira perde. Ficou insistindo a Copa toda que o time que ele escalava era o melhor. Fingia não enxergar os erros da equipe. Ia deixando rolar, dizendo que se estava ganhando, estava bom. Deve ter esquecido que até agora só havíamos enfrentado cabeças-de-bagre, como aquela seleção de Gana que chutou 20 vezes a gol e não acertou nenhum.
Perde a torcida, que tanto vibrou e torceu pela seleção, que deixou de trabalhar, que decorou as ruas e que acreditou no time. Os jogadores não estão nem aí: a Copa acaba, eles pegarão seus carros, irão embora e nada acontecerá. Já estão com o bolso cheio de dinheiro e cheios de mulheres à sua volta. Ganhar Copa para que?
Nas entrevistas após o jogo, Kaká era o único que parecia triste e abatido. Ronaldo não estava nem aí. Cafu chegou a dizer, ao ser perguntado sobre a expectativa da torcida, que “nós em primeiro lugar, somos prioridade”. Juninho também estava triste, mas mandou um recado indireto à comissão técnica e ao grupo: é hora de um grupo deixar a seleção, é preciso que haja uma renovação.

Voa canarinho voa...
Mostra pra esse povo que és um rei
Voa canarinho voa...
Mostra pra esse mundo o que eu já sei...


(Copas de 82 e 86, na Espanha e no México)


Depois do jogo, fui dar uma volta – um amigo, algumas amigas dele e eu. Num tradicional bar do Leblon onde se comemoram as vitórias da seleção, havia movimento. Muito menos do que se o Brasil houvesse ganho, claro. E o clima era ruim, estranho. Claro que Parreira e sua mãe foram os mais insultados.
Saímos e voltamos depois. Surpreendentemente, o lugar estava mais cheio, mas o clima era pior. Havia um ar de confusão na atmosfera, como se alguém fosse se empurrar e uma briga generalizada piorasse o que já era ruim.
Fomos a um bar e voltamos depois ao tradicional ponto de comemoração, já por volta de 23h30. O lugar estava escuro, vazio. Os bares estavam fechados e os vendedores ambulantes recolhiam seus isopores. Havia gente ainda, mas muito poucos, e a maioria falando em ir embora. No chão, os restos da festa da derrota: garrafas de cerveja quebradas, latas amassadas, espetos de churrasquinho, papel, chapéus de bobo-da-corte amassados. Aqui e ali, brasas acesas, assando churrasquinhos.

Na torcida são milhões de treinadores
E cada um já escalou a seleção
O verde e o amarelo são as cores
Que a gente pinta no coração!
A torcida a galera se agita...
Dá um grito
Brasil é campeão!
O toque de bola
A nossa escola
Nossa maior tradição
Eu sei que vou
Vou do jeito que eu sei
De gol em gol
Com direito a replay
Eu sei que vou
Com o coração batendo a mil
É taça na raça Brasil!


(Copas de 1994 e 1998, Estados Unidos e França)

Em meio ao cenário estranho daquele ponto de comemoração, havia um cheiro horrível no ar, cheiro de cerveja jogada no chão. Circulando mesmo, só os garis, limpando a festa da derrota. Ficamos imaginando como o lugar estaria cheio se o Brasil tivesse ganho...mas lembramos que a realidade era outra e fomos embora.
Seja como for, não merecíamos ganhar. Já não vínhamos bem nos jogos anteriores e fomos castigados. O sonho de ser campeão fica para 2010, na África do Sul. Mas, não sei porque, estou achando que o hexa ainda não virá na próxima Copa...

Eu já passei por quase tudo nessa vida
Em matéria de guarida espero ainda minha vez
Confesso que sou de origem pobre
Mas meu coração é nobre, foi assim que Deus me fez
E deixa a vida me levar (vida leva eu)
Deixa a vida me levar (vida leva eu)
Sou feliz e agradeço por tudo que Deus me deu
Só posso levantar as mãos pro céuAgradecer e ser fiel ao destino que Deus me deu
Se não tenho tudo que preciso
Com o que tenho, vivo
De mansinho , lá vou eu
Se a coisa não sai do jeito que eu quero
Também não me desespero
O negócio é deixar rolar
E aos trancos e barrancos, lá vou eu
E sou feliz e agradeço por tudo que Deus me deu
E deixa a vida me levar (vida leva eu)
Deixa a vida me levar (vida leva eu)

(Copa de 2002, na Coréia e no Japão – escolhida pelo técnico Luís Felipe Scolari e pelos jogadores).

Tuesday, June 27, 2006

Eu odeio o Galvão Bueno!

Não aguento mais o Galvão Bueno. Na boa. E o pior é que, como o cara é um dos diretores do esporte na Rede Globo, duvido que deixe as transmissões da Copa. Como nem todos possuem canal a cabo, proponho um protesto: coloque a televisão no mudo e ligue o rádio, em algum canal que transmita o jogo. Coloque bem alto, para que o seu vizinho escute e faça o mesmo. Quem sabe um parente do Galvão não ouve e fala para ele, quem sabe o Galvão não se manca. Se isso não acontecer, ao menos você ouvirá uma narração mais agradável. Porque sério, Galvão não dá mais.
Quem diria. Eu, Rafael Cavalcanti, que no colégio era chamado por alguns de "Galvão" devido à minha mania de narrar jogos de futebol de quinta categoria, reclamo agora do locutor esportivo da Rede Globo. Mas não dá: de fã inverterado (criança de 5 anos tem cada idéia!), virei um dos maiores críticos de Galvão Bueno.
Para começar, o cara é uma mala sem alça quando solta aquelas frases feitas que nada acrescentam. Por exemplo:

"Vamos ouvir o Olodum, o som do Brasil! Vamos ao pelô!"

"Ronaldinho, o maior artilheiro da história das copas!"

"Depois do jogo teremos as notícias do dia no Jornal Hoje. Logo depois A Viagem, e depois o filme 'A volta dos que não foram', na Sessão da Tarde. Em seguida as GRANDES emoções de Malhação, Sinha Moça, RJ-TV, Cobras e Lagartos e logo depois o JORNAL Nacional com William Bonner e Fátima Bernardes..."

"Quem é que sobe, quem é que sobe, quem é que sobe..."

"Tem que colocar o coração na ponta da chuteira...HAAAAAAAAAAAAAAAJA coração, amigo! PREPARE o seu coração!"

"E a seleção do Uzbequistão começa a gostar do jogo..."

"O Brasil ficou 325 dias, quatro horas, doze minutos, meio segundo e um quarto de milésimo sem tomar gol!!!"

Para piorar, o Galvão desautoriza os companheiros Falcão, Casagrande e Arnaldo Cezar Coelho o tempo inteiro, rasga elogios a jogadores que fazem lambança no minuto seguinte, critica lances e jogadas sem saber do que está falando, puxa descaradamente o saco do Ronaldo ("Fenômeno") e torce sempre a favor do Brasil. Não que os outros locutores não façam isso, mas o Galvão torce descaradamente. Irrita, cara, dá raiva. Para piorar, só fala gritando. Não faz diferença ele narrar o jogo com comentaristas ou não, porque quando narra, só quem comenta é ele.

Galvão não dá. Simplesmente não consigo mais.

Monday, June 19, 2006

Fossa Musical

OBS (Observem Bem Senhores) 1: Não necessariamente ouço todas as músicas aí, elas apenas...bem...tentem descobrir o que fazem aí.
OBS (Observem Bem Senhores) 2: O texto embaixo desse também é novo. Leiam também. E ah, a partir de agora, "Diário de um quase-jornalista" será uma seção fixa do blog.


Mais uma dose, é claro que eu tô a fim. A noite nunca tem fim, e o acaso vai me proteger enquanto eu andar. I say don´t you know, I say don´t you know. But I know, I know who I want to take it home. Enquanto isso, vou viver e não ter a vergonha de ser feliz, vou cantar a beleza de ser um eterno aprendiz, como um mutante, seguindo o meu caminho. Prefiro ser essa metamorfose ambulante, não sou brasileiro, não sou estrangeiro, não sou fariseu, minha tribo sou eu. Mas não tem revolta não, com aquele secret smile that you use only for me. Deixo tudo assim, não me importo em ver a idade em mim, mas quero saber bem mais que os meus 20 e poucos anos. Afinal, caminhando e cantando e seguindo a canção: xô urucubaca, ziquisira xô, Deus é brasileiro e eu também sou. E tente outra vez, não diga que a canção está perdida, eu canto mesmo e tô vivendo, tem gente que não canta e tá tão só, me sinto só, me sinto seu. Garçom, aqui nesta mesa de bar, você já cansou de escutar, mas ouça a canção que eu fiz para você, eu te quero tanto bem. E nem vem de garfo que hoje é dia de sopa, esquenta o ferro que vou vender a minha van, a minha van filosofia. Desembainho a minha espada cintilante, mandacaru voa lá na seca, e até mesmo a asa-branca bateu asas do sertão, e fuscão preto, você é feito de aço....mas vou de táxi, você sabe, vou tomar todas, vou me embriagar. Opa. Comandante, capitão, tio, brother, camarada, chefia, amigão, desce mais uma rodada. E desce mais...

Diário de um quase-jornalista: A Maldição do Gravador Prateado

Em minha mente - terrível quando se trata de formular teorias que não terão muita utilidade no dia seguinte - penso agora sobre o nobre ofício de jornalista, sobre as armadilhas e "coisas da profissão". Assim como há muitas que me agradam, há outras que...não gosto. Uma delas é arrumar personagens aleatoriamente. Trata-se daquele trabalho de ir para a rua sem nada, sem um nome, um contato, e saltar em cima de quem passa, se apresentando e fazendo uma pergunta sobre um assunto qualquer, geralmente em locais de grande movimento.
Talvez o fato de ser totalmente imprevisível me cause estranheza. Talvez o fato de nunca saber como o outro vai reagir. Talvez a possibilidade iminente de levar um não, muito mais fácil do que um sim. Será mesmo? Infelizmente, confesso que sinto um prazer enorme quanto "salto" em cima de alguém que depois se revela um ótimo personagem. Penso que é uma arte muito interessante: transformar aquele cidadão comum, para o qual mal olho no dia-a-dia, em um cara cheio de histórias para contar. Será que um fato compensa o outro? E se fosse eu do outro lado, o que diria e como reagiria?
Não sei, ainda sou jovem demais e inexperiente demais. A princípio, diria que compensa, se você tiver força suficiente para "saltar" de maneira "educada" em "cima" de "alguém". Mas hoje quase pularam em cima de mim. Um daqueles sujeitos estranhos, que chega fazendo uma pergunta imbecil e daqui a pouco está pedindo dinheiro. No meio da "catação" de personagens. Inesperado. Me senti um pouco do outro lado, confesso. Seu olhar não me enganou: tive certeza de que ele não queria um trocado, ou uma informação, mas o gravador prateado que eu segurava na mão direita. Tive de sair, parar tudo. Não pude descobrir se a "catação" compensa, e ainda, em sua forma mais difícil: num local aberto, sem identificação, tendo como armas apenas minhas palavras e o gravador prateado. Tampouco poderei voltar ao mesmo lugar para descobrir. Mas tenho que continuar, consegui pouco hoje, fui atrapalhado quando me empolgava. O que não me faz desistir, ou desanimar, afinal, amanhã tem mais. Mas talvez...talvez eu mude de gravador. Pode ser que leve um gravador transparente, ou o guarde no saco plástico antes de cada entrevista. É, fazer o que...ossos deste nem-sempre-tão-nobre ofício.

Monday, February 27, 2006

Isto é...carnaval



Segunda-Feira de carnaval.

Explode coração
Na maior felicidade...
É lindo o meu Salgueiro
Contagiando e sacudindo essa cidade...

O samba é muito bom, daqueles que entraram para a história. É o último que foi cantado durante um desfile na Sapucaí e que todo mundo conhece.
Enquanto ele toca, uma massa de gente passou por baixo da janela, dançando, cantando, bebendo. Todos felizes, celebrando a alegria da vida: carnaval.
E ele ali em cima, sentado numa cadeira, olhando a janela e observando tudo isso, sem coragem de sambar junto, sem ter como descer e se juntar sozinho à essa massa de gente, e meio sem saber o que fazer, também. O batuque é de empolgar e deixar arrepiado, mas ele continua sentado no mesmo lugar.
Já não é a primeira vez que a banda passa, nem será a última. Ele se levanta, irritado, e procura um cômodo da casa em que o som não chegue. Talvez no banheiro, ou na área de serviço. Mas é impossível: aquela batucada é muito forte, e a casa parece respirar carnaval. Não há como escapar, não há outro jeito. Não há como não ouvir, e nem como descer.
Sem remédio, ele volta à cadeira e se senta, observando a banda passar lá embaixo. O som agora mudou um pouco...

O teu cabelo não nega mulata
Que tu és mulata da cor
O teu cabelo não nega mulata
Mulata eu quero o teu amor!


Que saudade do tempo das marchinhas – que nunca viveu. Mas deviam ser bons aqueles tempos, ah deviam sim. Que fazer? Eles não voltam mais.
Ficar parado ouvindo aquilo dá uma agonia tremenda. Hum. Ele então se lembra de um biscoito e de um copo de coca-cola. Comer e beber ajuda a aliviar a tensão.
Vai então à cozinha, pega um pacote de biscoito Maria, abre a geladeira, pega a garrafa de coca, e fecha o refrigerador.
Hum.
Levou a garrafa toda. Haja coca-cola para segurar a tensão.
Voltou para a cadeira, abriu o biscoito e começou a mastigá-lo nervosamente, enquanto virava a garrafa de coca em direção à boca.

Quem não chora não mama
Segura meu bem
Dá a chupeta...
Lugar quente é na cama
Ou então
No Bola Preta

Uma visão lá embaixo tirou sua concentração: uma menina bonita, cabelo até o queixo, saia e blusa muito justas. Enquanto seu olhar se desviava, a garrafa de coca continuou no mesmo caminho. O líquido escorreu por sua boca, queixo e peito, molhando-o todo, e fazendo com que acordasse.
Não havia mais ninguém lá embaixo. Nenhum som, nenhuma batida, nenhum barulho, nada. Tudo muito tranqüilo e silencioso. Ele ficou de pé e olhou lá para fora, sem entender nada.

Segunda-feira pós-carnaval.

Sunday, February 12, 2006

Mesmo não é igual, mas é muito diferentte

"O senhor me avisa quando iegarmos na Rua Joã...João Lira?"

A voz soou rouca e hispânica, e fez o trocador voltar os olhos da janela para a roleta. O trocador era um negro alto, sorriso não muito brilhante, corpulento, vestindo uniforme da Viação Vila Isabel. Quem perguntava era uma mulher bastante bonita, pra não dizer...hum...é...deixa pra lá. Era loira, alta, vestia uma blusa rosa com um decote "generoso", e uma calça branca colada ao corpo.

"Rua João Lira...me avissa?"

O trocador olhou para ela por alguns instantes, e então respondeu:

"Aviso...aviso...pode deixar."

"Si...obrigada."

A mulher já ia saindo, quando o cobrador disparou:

"Ei, moça..."

"Han?"

"Se tiver...mais alguma dúvida é só perguntar que a gente esclarece aí."

Ela pareceu ficar sem jeito com o comentário, e respondeu timidamente:

"Obrigada..."

O trocador voltou os olhos para o decote, e quando a moça se afastou, os mesmos olhos percorriam toda a extensão da bunda dela. Ele parecia um tanto deslumbrado.
Depois da curva, o 433 entrou na Avenida General San Martin. O trocador desceu de sua cadeira e foi se sentar ao lado da moça.

"Você é da Argentina?" perguntou ele.

"Não", respondeu a mulher. "Venessuela..."

"Ah..." fez ele. "E está há quanto tempo no Brasil?"

"Uns dois messes, mais ou menos..."

"Morava com seus pais na Venezuela?", arriscou ele, continuando o diálogo.

"Si..."

"E aqui no Brasil?"

"Aqui estou morando com algumas amigas..."

O trocador pareceu ligeiramente mais animado.

"Ah...e o que está achando do Brasil?"

"É muito diferentte, muito diferentte...o povo é muito diferentte...as pessoas são mais calorossas...os homens...também...tudo muito diferentte..."

"E você estuda, trabalha, faz o que?"

"Yo trabalho...com publicidadde...e vendas..."

"Hum...e gosta de carnaval?"

Agora foi ela que pareceu animada.

"Si, carnaval é uma festa muito alegre e bonita..."

"Ah...e você já pensou em desfilar?"

Ela pareceu rir.

"Desfilar? Em escola de samba? Não, nunca penssei..."

"Ah...porque se você quiser...se estiver a fim..." a voz do trocador mudava de tom agora, como se ele estivesse construindo as frases antes de dizer, e ele continuava "Vila Isabel?"

A última frase parecia uma tentativa de ganhar tempo.

"O que?"

"Já pensou em desfilar pela Vila Isabel?"

"Não..."

A voz dele mudou de tom bruscamente, ficando mais pausada.

"Se quiser...eu tenho um amigo...que tem uma ala na Vila Isabel...é, ele tem uma ala...sabe, uma ala?"

"Ala?"

Ele partiu logo para o ataque.


"Ala...parte da escola de samba...mas...você tem telefone? Aí eu podia te ligar pra combinar direitinho..."

Ela riu alto. A pessoa pode ser do Uzbequistão, mas o som da palavra "telefone" tem sempre uma segunda intenção muito clara.

"Não...não...eu não tenho..." agora era a voz dela que soava meio pausada e muito clara.

"Que pena...mas então, fica com o meu..."

O motorista deu um grito:

"JOÃO LIRA É A PRÓXIMA RUA!!!!"

Ela se levantou, ajeitou a calça, puxou a cordinha do ônibus e foi em direção à porta.

"Prazer em conhecer" disse o trocador, rindo.

"Tcchau", respondeu a moça, descendo do ônibus.


Assim que ela desceu, o trocador voltou para sua cadeira, e fez o comentário final para o motorista:

"Que gostosa! Nossa...já pensou se pego uma mulher dessa? Tô feito pro resto da vida!"

Se virou para o último passageiro ainda no ônibus, e mostrando todos os dentes num sorriso largo, disse:

"É ou não é?"

Tuesday, January 10, 2006

De Roger Paillac à Didier Deschamps, passando por Decio Pinto e Gil Brother, de formas que não derrubem a estátua do pajé

Tempo
Tempo mano velho
Falta um tempo ainda eu sei
Pra você correr macio...


O dia era muito claro, de céu azul. Daqueles bem típicos do verão carioca: sol escaldante, gente com pouca roupa e um climinha gostoso no ar.
E lá estava eu. Ao invés de estar pegando sol, ou na praia, ou tomando minha tão sagrada água-de-coco, estava...estava...onde é que eu estava mesmo?
Ah, sim, ali na Dias Ferreira, perto do boteco. Não sabe onde é? Bem...é uma rua que tem uma papelaria mambembe que tem tudo (um dia ainda vou descobrir que o dono tem uma sacola mágica igual à do Gato Félix), dois botecos, uma loja de ferragens e uma farmácia. E ah, o ponto de ônibus do não menos famoso frescão, aquele ônibus de viagem que anda pela cidade e cuja passagem custa R$ 2,50.
Minha descrição foi mais que perfeita, né? Imagino eu que agora todo mundo já saiba direitinho como é a rua.
Estava eu ali, na banca de um camelô, próximo à casinhola do Novaes – um chaveiro muito simpático, barbudo, olhos profundos e claros, que eu nunca vi. É, esqueci de descrever a casinhola dele. Traço fundamental da paisagem. Casinhola azul, perdida no meio da paisagem da rua, fechada de manhã e aberta apenas naquelas janelinhas que abrem pra fora, à tarde. Só uma casinhola de chaveiro.
Onde eu estava mesmo? Ah, sim, ali na rua dos dois botecos, perto da casinhola do Novaes, grande Novaes, o chaveiro. Tão bom que destranca até privada entupida.
Voltando. Eu estava por ali, naquele belo dia de sol, de bermuda amarela, camiseta branca e cabelo caindo na cara, indo ao camelô. Ele é quase lojista: tem o ponto há 20 anos, sempre no mesmo lugar, e sempre traz os mesmos relógios para vender. Me pergunto se as pessoas que compram os relógios os devolvem por algum problema, por simplesmente cansarem de usar, ou se ninguém compra mesmo.
Estava indo ao camelô trocar a bateria do relógio. Um bom relógio, aquele. Quase de estimação. Embora eu nunca tenha usado relógio.
Preciso manter a bateria dele funcionando. Chego e pergunto quanto é.

Dez real.

Hã? Dez real pra trocar a bateria de um relógio? Mas com isso eu compro um novo aqui no seu camelô!

E porque você acha que custa esse preço?


Saio frustrado, com o relógio de estimação ainda sem bateria, e a rua com os mesmos botecos, casinholas e camelôs. E o sol escaldante na cabeça, e o mundo aproveitando a praia, e eu aqui, trocando a bateria de um relógio.
O que é pior, num camelô que nunca vi mais gordo, embora passe todos os dias pela mesma rua, a caminho do mesmo lugar. Dez reais por uma bateria. Alguém merece isso, cara? Para um relógio que nem se vai mais usar? É brincadeira, realmente, sacanagem, cara.
Saio caminhando e atravesso a rua. Quem sabe naquele restaurante ali eles não cobram mais barato pra trocar a bateria? E ainda dá pra tomar um chope enquanto espero.