Saturday, November 06, 2004

Só mais um 438 rápido

Todo dia é dia de 438 rápido, afinal não tem jeito mais rápido de chegar em casa. É quente e nem sempre muito confortável; é chato e nem sempre empolgante; é sonolento e fica sempre na mesmice do caminho, que se antes era novidade, agora já está ficando chato. Ainda assim é o melhor jeito de chegar em casa.
Outro dia subi no ônibus, e quando estava terminando de me acomodar na cadeira, alguém fez sinal fora do ponto. O motorista parou e abriu a porta; para a surpresa dos passageiros, um grupo enorme entrou. Daqueles jovens que vão à praia em grupo e pegam ônibus, e que você sabe só de olhar que irão fazer uma algazarra por todo o caminho. Ah, claro, sem esquecer que sempre sentam juntos, nos últimos lugares do ônibus.
Dito e feito. Da Tijuca até a Praça da Bandeira apenas conversaram em voz alta; quando o ônibus saía da Praça, começaram a cantar, dando um show variado e bastante brega que tornou a viagem diferente das outras.
Primeiro foi funk. Começaram pelo mais recente, de um estilo mais “romântico”, e foram voltando, indo até Claudinho e Buchecha. Cantaram tudo, passando pelas mais variadas músicas e duplas de sucesso.
Já na metade do Rio Comprido, a inspiração pra cantar funk cessou. Voltaram a conversar em voz alta, falando bobagens e rindo, com o ônibus todo olhando para eles, fazendo aquela cara de “ai, que saco”.
Começaram a cantar algumas músicas “neutras”, enquanto um deles, de voz mais alta e aguda, soltava besteiras a torto e a direito, fazendo as meninas rirem em coro. Daí para o brega foi um pulo: Br´Oz, pagode, samba e tudo mais que vocês possam imaginar.
Já no Jardim Botânico, a inspiração cessou de novo. O “agudo” voltou a falar suas besteiras, agora mais alto, fazendo o ônibus todo ouvir:

“CAIU! CAIU! CAIU! Caiu o preço da bananada...”

Atravessávamos a Rua Jardim Botânico em frente ao Jardim, e o motorista deu uma gargalhada com um comentário feito pelo grupo. A partir dali, os dois estabeleceram uma espécie de “pacto”:

“Ih, olha, o motorista. Ele tá rindo!”
“Ih, eh mesmo!”
“Ae, seu motô...”


O motorista deu mais uma risada, olhando o grupo pelo espelho retrovisor, enquanto o ônibus continuou avançando. Algumas pessoas olharam novamente para trás, enquanto o agudo soltou mais uma das suas:

“Não, não olhem pra gente com essa cara. A gente não fala com vocês, só com o ‘home’ lá...”

O grupo então resolveu emendar mais uma música, numa espécie de “saideira rodoviária”. Era uma música “clássica”, um daqueles hits românticos bregas. Terminada a música, alguém do grupo se ergueu e apertou o botão, pedindo que o ônibus parasse. Enquanto toda aquela turma descia, uma das meninas disse:

“Tchau gente, boa viagem para vocês. Desculpem a confusão, as músicas bregas...”

Pronto. Novamente o silêncio, a paz da viagem de todos os dias, o barulho do ônibus deslizando pela pista, o ruído dos carros lá fora, o vento uivando. Novamente o ônibus tranqüilo, sem barulhos. Novamente a sonolência, a monotonia e as mesmas paisagens de todos os dias, o mesmo caminho que já começa a me impacientar. Ei! Onde vocês estão indo, grupo musical do 438-rápido? Voltem aqui...venham continuar a cantar...voltaaaaaaa...é tão bom ter você ao meu lado...
Histórias de uma viagem de ônibus, sempre tão cheia de monotonias, novidades e paisagens urbanas de uma cidade belíssima.

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