Friday, July 21, 2006
Uma chance
As lágrimas escorriam por seu rosto e molhavam o chão; soluçava alto, chamando a atenção de quem passava pelo lado de fora do quarto.
Debruçou a cabeça sobre a cama de hospital e chorou ainda mais forte, de maneira mais intensa. Sua esposa afagou-lhe a cabeça, e soltou algumas palavras de carinho. Não ouviu. Não sabia se era o som do próprio soluço ou se "tampara" os ouvidos de propósito.
À medida que perdia as forças, o choro foi ficando mais fraco. Segurou o lenço que a esposa estendia e enxugou as lágrimas.
Vamos?
A pergunta dela parecia redundante. Sim, deveriam ir. Nada mais poderia ser feito naquele lugar. Era tarde demais.
Quantas coisas poderia ter feito para salvar aquela vida? Um outro hospital? Um outro médico? São Paulo, talvez. Não, não, os Estados Unidos. Estados Unidos? Não. Europa ou Japão. O que havia de mais moderno. Aquela vida não poderia acabar daquele jeito. Não, devia ser uma ilusão. Chegaria em casa e escutaria o choro, correria para o quarto e abraçaria o filho pequeno. Tiraria o menino do berço...e o seguraria com os braços estendidos de pai, num gesto forte e superior. Sim, era isso.
Olhando-o, a esposa leu as linhas do rosto, e murmurou baixinho:
Ele se foi, Arnaldo.
Desatou a chorar novamente, agora já no volante do carro. Não conseguiu nem virar a chave da ignição. Sua cabeça tombou sobre o volante e as lágrimas voltaram a rolar. Oito meses. Pensou em Deus. Como morre um menino oito meses? Como as coisas podem ser tão cruéis?
Deixa que eu dirijo, Arnaldo.
Parecia uma ordem, e não um pedido. Como se a esposa fosse dirigir não só o carro, mas todo o resto, dali para a frente. Hesitou.
Não insista, Arnaldo. Você não está bem.
E você, retorquiu ele. Você nem sequer chorou!
Não seja injusto! Você devia prestar mais atenção em mim. Além do mais, há outras formas de tristeza...embora eu também já tenha passado pelo choro. Vamos, deixa que eu dirijo.
A resposta o deixou desconcertado. Percebeu que a esposa estava muito mais triste do que ele, mas dominava melhor o sentimento. Deixou que ela dirigisse.
Chegaram em casa, ainda num clima pesado. Ele foi direto ao quarto de Leonardo, como se ainda quisesse encontrar o filho por lá. Olhou em volta. Foi ao berço. Só faltou procurar nas gavetas e dentro do armário. Desanimado e de cabeça baixa, se sentou no sofá vermelho do quarto, que comprara para o pequeno assistir televisão.
A esposa veio até ele e se sentou do seu lado. De fala mole, ele disse...vamos ter que dar todos esses móveis e o berço. Nos mudar para um apartamento menor. Não tem sentido esse quarto aqui.
A mulher se aproximou dele, segurou sua mão, e disse:
Tudo bem. Mas antes, preciso te contar uma coisa.
Dominado pelo desânimo e sem imaginar o que fosse, perguntou o que era.
Estou grávida.
Em meio à tristeza, tinha uma chance para recomeçar. Deu um beijo na esposa e foi fazer um café bem forte.
Thursday, July 20, 2006
Estrela brilhante (Grito de Guerra)
E continua a mudar o mundo.
Entendendo o significado da minha vida
Sinto que não devo sentar e esperar.
Eu acredito em mim.
Não posso perder...
Eu ainda consigo correr atrás!
A vida continua.
Eu quero encontrar meus sonhos.
Em algum lugar minha alma grita por isso!
Entre dez milhões de estrelas brilhantes
Quero brilhar mais do que todas.
Quero encontrar a Justiça através de mim.
É hora de construir o futuro!!!!
P.S.: Tradução do inglês que é tradução do japonês. Desculpem pelos possíveis erros... =D
Saturday, July 15, 2006
O confuso do sonhador
"Chegou em casa, subiu até seu apartamento e deitou na cama, sem saber direito o que fazer. Então era assim? Os sonhos podiam ser pisados desse jeito, e traídos assim? Todo o tempo e todos os sonhos não valiam de nada? Ela, sem saber, matara um sonhador.Ele, sem saber, se tornara um, mais um entre muitos, e sinceramente, não sabia como ia ser. Não sabia nem se ia ser."
Bom-dia, alô, alô, Rio de Janeiro! Que dia bonito de sol, Beliza Ribeiro! Estamos começando mais um programa aqui na Rádio Bandnews FM.
O rádio o acordou. Abriu os olhos devagar, deixando o quarto entrar em foco aos poucos. Ricardo Boechat? No céu existe Ricardo Boechat?
Sua mente, que na noite anterior relaxara completamente, agora trabalhava a mil. Boechat? Então não morri...
Se espreguiçando e soltando um grande bocejo, sentou-se na cama, os cabelos ainda despenteados, a camisa e a bermuda amarfanhadas. Dormira daquele jeito mesmo, de tanto cansaço. Olhou em volta do quatro, como se a explicação que procurava estivesse ali, em cima da estante. Sua mente voltou a trabalhar: não, não morrera. Longe disso. Apenas dormira uma longa noite. Quanto tempo?
Olhou para o rádio-relógio que o acordara: nove horas. Não era tarde, mas era muito para quem dormira às oito e meia.
Ficou de pé, se espreguiçando de novo, deixando os lençois para trás, enquanto o sol invadia o quarto. Dormira realmente muito...mas não parecia renovado. Ao contrário, parecia que tudo o que acontecera na noite anterior ainda pairava sobre sua cabeça, como uma grande e pesada nuvem. Depois de uma noite tranqüila, relaxada, tudo voltava.
Nove horas. Nove horas. Nove e cinco. Lembrou que precisava estar no escritório às dez em ponto. Ligando o botão de velocidade máxima, tomou café, tomou banho, escovou os dentes, escolheu a primeira roupa que encontrou, pegou a chave do carro e saiu correndo.
No trânsito, parecia disperso, desligado. Quase bateu no carro da frente. Avançou um sinal e por pouco não provocou um acidente grave. Merda, merda, dizia para si mesmo. Assim não dá. Não posso.
Parou o carro em frente à Igreja Batista da Lagoa. Que se danasse a hora e o trabalho: se um pequeno atraso o demitisse, achava outro emprego. Desceu, pegou a pasta, atravessou a rua e seguiu para a Lagoa. De frente para a água, arremessou a pasta o mais longe que pôde; depois, tirou o celular do bolso e pisou nele com força, atirando seus restos na água logo em seguida. Por último, tirou o paletó e o atirou o mais longe que podia. Livre. Livre, enfim!
Acorda! Acorda! Por acaso te pago pra sonhar? Preciso dessa porcaria de relatório ainda hoje!
Acordou. Não estava na Lagoa. Sua pasta estava aberta na mesa à sua frente. Seu celular tocava insistentemente, com 12 ligações não-atendidas. Seu paletó estava na cadeira às suas costas. Seu chefe gritava, esbravejava. E ele estava sentado na mesma mesa de sempre, junto à janela. Sonhara antes ou depois de chegar ao trabalho? Não sabia. Mas metade do relatório estava digitado. Sem entender nada, continuou aquele trabalho, de forma mecânica.
Quatro e meia, hora do pão de queijo. Estranhamente, se lembrou de descer para comer o pão de queijo, mas não se lembrava de tê-lo comido. Que tempo estranho era aquele, que teimava em apagar algumas coisas?
Não estava bem. Às seis, uma tremenda dor-de-cabeça o impediu de trabalhar. Pediu para sair mais cedo, e ficou surpreso quando o chefe o liberou. Um pouco de paz, enfim.
Na volta, também mal conseguia dirigir, embora estivesse melhor. Decidiu ir pela Praia. Quem sabe olhar o mar o ajudasse a ficar mais calmo...
Decidiu ir para casa, voltar a dormir. Não era hora de acordar ainda. Mas como, dormir de novo? Tinha que trabalhar na manhã seguinte.
E, num giro daqueles de filme, tudo à sua volta desapareceu. Estava de pé, na frente de seu carro, com a chave na mão, às nove e quarenta da manhã.
Wednesday, July 12, 2006
Take me out when september ends
Tudo começa na UERJ. Andam dizendo por aí que estou misterioso demais, que estou ocultando informações e coisas assim. E estou, mesmo. Aliás, estava, agora já não tem mais segredo. Saí de fininho hoje de manhã, com uma furtividade adquirida em recente treinamento. Ninguém nem me notou. Quer dizer, quase ninguém. Algumas pessoas me encontraram no ponto de ônibus, e tive que parcialmente revelar minha missão. Mas consegui escapar...e lá fui eu, de 464, rumo a um Dia de visita.
Duas e meia da tarde
Finalmente estou chegando à redação. O silêncio ouvido a princípio contrasta com a idéia original do ambiente: muito barulho, principalmente de telefones tocando, e de gente gesticulando, falando, trocando informações o tempo todo. Mesmo assim, continuo. A princípio, a dúvida: não tem orientação, nem sei onde é que fica a repórter. Vou perguntando aqui e ali, até que um repórter baixinho e simpático (que vim a saber depois que é da editoria de polícia), diz, apontando: "é pra lá".Olho na direção indicada e vejo-a, finalmente. E lá vou eu, crachá preso ao pescoço, ansioso pelo que vai acontecer...
Duas e quarenta e cinco
Após alguns breves minutos de conversa, acabo de perceber que nada está garantido. E fico me perguntando o que estou fazendo ali.Ela então começa a digitar a matéria no computador, já no espaço devido. E eu começo a me meter, dizendo "ih, como leitor, eu não entenderia aquilo ali". "Olha, você esqueceu o f na palavra tal". A relação de cumplicidade parece tão grande que ela me mostra uma matéria recente e diz "inventa uma legenda pra foto, pra não termos que repetir essa".
Três horas da tarde
Depois dela me dizer que acertei na legenda (embora não vá ser a que vai pro jornal), continuo me perguntando o que estou fazendo ali. Estaria sendo submetido a algum teste para entrar em algum tipo de sociedade secreta? Ou seria simplesmente um dia pra conhecer a redação?
Quatro horas da tarde
A repórter me diz que precisa apurar uma matéria, e pede que eu me sente ao lado do editor. A ele, faço várias perguntas, sobre o funcionamento do jornal e coisas assim. A frase que choca:
"Não é mito que eu modifico a matéria do repórter. Meu papel é definir o que o leitor vai ler. Modifico, sim, e pronto. O máximo que o repórter pode pedir é para que a matéria não seja assinada, mas aí, é o próprio repórter que sai perdendo."
Enquanto responde às perguntas, o editor começa a montar as pautas do dia. Ele pega enormes blocos de texto (as pré-pautas) e começa a enxugar as informações, deixando-as as mais resumidas possíveis. No caso de existirem mais de um bloco de texto, enxuga cada um separadamente, para depois reescrever todas as informações num bloco só.Ao mesmo tempo em que monta as pautas, ele consulta repórteres, buscando novas informações e tirando dúvidas sobre os textos que está escrevendo. Tudo terminado, envia as pautas para os editores-chefe, e me manda voltar para a mesa da repórter.
Cinco e meia da tarde
Mais conversas com a repórter. Faço cara de cansado, e ela pergunta se quero um café.Bebendo o café, conheço rapidamente o repórter baixinho (o mesmo de quando cheguei aqui), e descubro que ele é da editoria de polícia. Ele, a repórter e mais um outro (que não sei quem é) começam a falar sobre a Jeany Mary Corner (é, a cafetina do mensalão) e a conversa evolui rapidamente para a Rita Cadillac e as chacretes, passando pelos filmes pornôs (o baixinho diz que já viu filmes pornô com a Rita, que ela faz filmes desse naipe há muito tempo). Terminado o café, volto para a mesa junto com a repórter.
Seis horas da tarde
Mais conversas. Pergunto à repórter se existem free lancers no jornal, mas ela diz que não. Então pergunto sobre voluntários, e afirmo que quero ser um. Ela diz que vai negociar com o editor, e depois me dá a resposta.Em seguida, me convida pra ir lanchar.
Seis e quinze
Antes do lanche, passamos na sala da apuração, aquela onde tem rádios ligados na polícia, e onde os telefones tocam o tempo todo. É também onde a repórter resolve dar uma mãozinha pro apurador. Depois ela me apresenta o mesmo: é um repórter famosíssimo, da editoria de polícia, um dos melhores que existe. Ela me diz que aprendeu com ele. Ele então começa a me interrogar:
Qual seu nome?
Rafael.
Sobrenome?
Cavalcanti.
Filho de quem?
(Fiquei sem graça e não entendi bem a pergunta. A repórter respondeu por mim: de ninguém, não é filho de jornalista).
Ah...e o que é seu pai?
Era empresário.
Não é mais?
Não. Não deu certo.
Ele agora é aposentado?
Não. Está estudando para fazer concurso público.
(A repórter fala com ele, diz que eu também quero ser voluntário. A resposta quase me emociona...) Vem. Se quiser, eu te ensino. Mas por favor, depois não passe na rua e não finja que não me conhece. Tem uns aí que eu ensinei tudo, e eles passam na rua e nem olham pra minha cara. Não essa aqui (aponta pra repórter), essa daqui continua a mesma, sem nariz em pé.
A repórter e eu saímos, afirmando que vamos lanchar. Ela diz que depois vou ficar lá um pouco, conversando com o famoso jornalista. Fato que acabaria não acontecendo...
Seis e vinte
Agora estamos eu, a repórter e uma colega dela de redação, sentados na mesinha, lanchando. A conversa flui, falando de faculdades e tal, e a colega afirma ser contra faculdade de jornalismo. Diz que é técnica, que um curso resolveria tudo. A repórter permanece calada. Em dado momento, a repórter fala que quero ser voluntário, e a colega corta logo o barato:
"Não pode abrir esse precedente. Senão a gente aqui era mandado embora..."
A repórter então explica à colega que o processo seletivo acabou de acabar, e coisa e tal. Fim de lanche, e voltamos à redação.
Seis e meia
Agora a redação começa a ferver. Os telefones tocam o tempo todo; jornalistas colocam o fone no ombro e correm para terminar seus textos, apurações e o que mais for necessário. Todos pesquisam na Internet, procurando saber se não há nenhum fato novo, nada que ainda possa ser transformado em matéria.Sento-me novamente ao lado do editor, que agora cuida da página e do espaço em que as notícias serão publicadas. Ele não pára quieto, indo e voltando, olhando a página, as matérias, consultando um e outro. Num desses intervalos...
Quero me tornar voluntário...
(Risada) Ah não, isso não existe.
Existe sim.
Não, não existe.
Nesse instante, chega um repórter, que pelo que ouvi anteriormente, deve ser sub-editor, ou algo assim.
Olha só, quer ser voluntário.
Ih, não existe não. Você desvaloriza o trabalho do seu colega. Eu sempre digo aos meus alunos: não façam nada sem remuneração ou sem supervisão.
Além do que, se bater o fiscal do trabalho aqui, vai querer saber quem é você, e o que está fazendo aqui. Não, voluntário não existe em grandes empresas (ou, ele disse "em grandes espaços" ou "é algo irreal", ou "não temos pessoas trabalhando de graça em grandes empresas", algo assim). Ainda é cedo pra você se preocupar com redação...
É claro que as informações são um choque: vão contra tudo em que eu sempre acreditei. Ainda bem que o choque é rápido, nada sério...
Sete horas da noite
Agora chega, preciso ir. O editor volta, num de seus intervalos, já me despachando (ou será que não?).
Agora vou ficar assim, Rafael, levantando toda hora...
Já vou.
Ah. Muito prazer. E não se preocupe. Ainda é cedo pra você se preocupar com redação...
Quando volto para me despedir da repórter, ela está conversando com uma colega, passando meu curriculum. Quem sabe.
Sete e quinze
Termina o Dia de visita. Baixas? O comportamento "curto e grosso" do editor, e algumas idéias muito "dentro do sistema". Ganhos? A experiência de viver um Dia de redação.Um dia estarei de volta – mesmo que não seja aqui. Já não tenho mais dúvidas: não há vida fora da redação. E dentro, será que existe?
O texto acima foi escrito e publicado neste blog, em primeiro de setembro do ano passado, uma quinta-feira. O nome do repórter baixinho de Polícia é Bartolomeu Brito, mas ele é mais conhecido como Bartô, mesmo. O repórter foda de polícia se chama Lúcio Natalício, mas é mais conhecido como Natal, e é uma figuraça, meio tantã, mas gente boa. A colega da repórter é a Teresa Fayal, que já deixou a redação. Prefiro continuar sem revelar os nomes do editor e do subeditor de Economia.
Cumpri minha promessa - voltei à redação, e mais rápido do que imaginava. Em 6 de dezembro já estava aqui, e dia 7 já trabalhava dedicadamente. Mas, como maldição de jornalista, estou pagando pelas minhas palavras: fui perguntar se não existia vida fora da redação, e agora, minha função não me permite ir para a rua. Vamos ver se a lógica invertida (ou a inversão da lógica?) me ajuda: sei que existe vida dentro da redação. E fora dela, será que existe?
Tuesday, July 11, 2006
Diário de um quase jornalista: O sonho muda, mas não morre
Em minha mente - terrível quando se trata de formular teorias que não terão muita utilidade no dia seguinte - penso agora sobre o nobre ofício de jornalista, sobre as armadilhas e "coisas da profissão". E digo que cheguei a essa conclusão num dia ensolarado, no meio da redação, no meio do expediente, e parei para escrever. Nenhuma matéria ou trabalho ficará adiada por conta de quinze minutos escrevendo.
Escrevendo. Foi assim que tudo começou para mim, há quase...doze anos e lá vai fumaça. Escrevia tudo, até o que não se podia escrever. Escrevi para não falar sozinho. Foram várias fases de escrita: histórias bizarras sobre Cavaleiros do Zodíaco (uma verdadeira febre em 1994), contos de heróis, resumo de jogos de videogame que nunca existiram (e nunca vão existir), histórias de detetives que não tinham fim, nem começo, nem personagens, e por fim, com meu tempo já escasso, escrevi alguns contos medievais, algo meio "O Senhor dos Anéis". De tanto escrever e de tanto que me fazia bem, decidi que não queria fazer outra coisa na vida...
E fui estudar jornalismo. Achei que tinha mais a ver do que Letras, é sempre aquela coisa...Letras parece faculdade de quem vai dar aula, e eu não queria isso. Não demorei a descobrir que jornalismo não é só escrita, e que não escreveria para sempre, não viveria escrevendo. Jornalismo, antes de tudo, é apuração, porque é ela quem monta e organiza seu texto: os fatos mais curiosos, engraçados, importantes, vão para a parte de cima, para atrair um leitor disperso - o atento sempre, ou quase sempre, lê tudo. A escrita é toda organizada pelas informações, é meio presa, amarrada. Para completar, limita-se a um espaço pequeno, onde tudo precisa estar muito claro mas pouca coisa pode ficar subentendida. Isso, no jornalismo escrito - nos meios radiofônicos e televisivos, nem se fala, escrever apenas organiza a informação para ser veiculada através da voz e da imagem.
Isso me decepcionou? Não. Descobri que apurar, por mais difícil que seja, é interessante. E que encontrar soluções criativas para organizar bem as informações também é interessante. Descobri que encontrar boas histórias e bons personagens e escrever muito bem sobre um fato teoricamente banal, também é interessante. Troquei meu sonho por outro: quero viver descobrindo boas histórias, e contando-as da melhor forma que puder, da maneira sempre mais completa possível. E continuarei escrevendo, "por fora", por puro e simples prazer. Como faço aqui no blog.
Ossos deste nem-sempre-tão-nobre ofício.
Saturday, July 01, 2006
França 1 x 0 Brasil
Com o brasileiro
Não há quem possa
Eeta esquadrão de ouro
É bom no samba
É bom no couro
(Copas de 58 e 62, Suécia e Chile)
Escrevo às duas e quinze da manhã de 2 de julho de 2006. Para os que gostam de futebol e curtem a Copa do Mundo, o dia de ontem entrou para a história como aquele em que a teimosia, a insistência e o “futebol feio”, onde “o gol é detalhe” e “o show é ganhar”, levou um baile do futebol-arte, jogado com raça e com vontade. Perdemos. Estamos fora da Copa do Mundo da Alemanha. E diga-se de passagem, com muita justiça.
A França tem um time excelente? Não. Mas jogou melhor o tempo inteiro, com raça e com vontade, soube atacar, defender e jogar no contra-ataque. Já o Brasil repetiu os erros dos últimos quatro jogos: prendeu demais a bola, fez muita firula, não jogou com velocidade, não criou (me desculpem a expressão) porra nenhuma e ainda deu espaços para o adversário. Está aí o resultado: perdemos de novo para os franceses, nossos eternos carrascos em Copa do Mundo – além de 2006, eles ganharam também em 86 e 98.
Do lado brasileiro, há os piores e os melhores, claro. Cafu, Roberto Carlos, Juninho, Ronaldinho Gaúcho, Ronaldo, Adriano e Kaká não jogaram absolutamente nada. Com exceção de Juninho, não fizeram nada a Copa toda. Todos pareciam o Romário em seus últimos anos de seleção: quero a bola no pé para fazer o gol. Palmas para Dida, Lúcio e Juan, que salvaram o Brasil de perder para Croácia, Austrália e Gana, e hoje evitaram um desastre contra a França.
70 milhões em ação
Pra frente Brasil
No meu coração
Todos juntos vamos
Pra frente Brasil
Salve a seleção...
De repente é aquela corrente pra frente
Parece que todo o Brasil deu a mão
Todos juntos vamos
Pra frente Brasil, Brasil
Salve a seleção!
(Copa de 70, México)
Parreira perde. Ficou insistindo a Copa toda que o time que ele escalava era o melhor. Fingia não enxergar os erros da equipe. Ia deixando rolar, dizendo que se estava ganhando, estava bom. Deve ter esquecido que até agora só havíamos enfrentado cabeças-de-bagre, como aquela seleção de Gana que chutou 20 vezes a gol e não acertou nenhum.
Perde a torcida, que tanto vibrou e torceu pela seleção, que deixou de trabalhar, que decorou as ruas e que acreditou no time. Os jogadores não estão nem aí: a Copa acaba, eles pegarão seus carros, irão embora e nada acontecerá. Já estão com o bolso cheio de dinheiro e cheios de mulheres à sua volta. Ganhar Copa para que?
Nas entrevistas após o jogo, Kaká era o único que parecia triste e abatido. Ronaldo não estava nem aí. Cafu chegou a dizer, ao ser perguntado sobre a expectativa da torcida, que “nós em primeiro lugar, somos prioridade”. Juninho também estava triste, mas mandou um recado indireto à comissão técnica e ao grupo: é hora de um grupo deixar a seleção, é preciso que haja uma renovação.
Voa canarinho voa...
Mostra pra esse povo que és um rei
Voa canarinho voa...
Mostra pra esse mundo o que eu já sei...
(Copas de 82 e 86, na Espanha e no México)
Depois do jogo, fui dar uma volta – um amigo, algumas amigas dele e eu. Num tradicional bar do Leblon onde se comemoram as vitórias da seleção, havia movimento. Muito menos do que se o Brasil houvesse ganho, claro. E o clima era ruim, estranho. Claro que Parreira e sua mãe foram os mais insultados.
Saímos e voltamos depois. Surpreendentemente, o lugar estava mais cheio, mas o clima era pior. Havia um ar de confusão na atmosfera, como se alguém fosse se empurrar e uma briga generalizada piorasse o que já era ruim.
Fomos a um bar e voltamos depois ao tradicional ponto de comemoração, já por volta de 23h30. O lugar estava escuro, vazio. Os bares estavam fechados e os vendedores ambulantes recolhiam seus isopores. Havia gente ainda, mas muito poucos, e a maioria falando em ir embora. No chão, os restos da festa da derrota: garrafas de cerveja quebradas, latas amassadas, espetos de churrasquinho, papel, chapéus de bobo-da-corte amassados. Aqui e ali, brasas acesas, assando churrasquinhos.
Na torcida são milhões de treinadores
E cada um já escalou a seleção
O verde e o amarelo são as cores
Que a gente pinta no coração!
A torcida a galera se agita...
Dá um grito
Brasil é campeão!
O toque de bola
A nossa escola
Nossa maior tradição
Eu sei que vou
Vou do jeito que eu sei
De gol em gol
Com direito a replay
Eu sei que vou
Com o coração batendo a mil
É taça na raça Brasil!
(Copas de 1994 e 1998, Estados Unidos e França)
Em meio ao cenário estranho daquele ponto de comemoração, havia um cheiro horrível no ar, cheiro de cerveja jogada no chão. Circulando mesmo, só os garis, limpando a festa da derrota. Ficamos imaginando como o lugar estaria cheio se o Brasil tivesse ganho...mas lembramos que a realidade era outra e fomos embora.
Seja como for, não merecíamos ganhar. Já não vínhamos bem nos jogos anteriores e fomos castigados. O sonho de ser campeão fica para 2010, na África do Sul. Mas, não sei porque, estou achando que o hexa ainda não virá na próxima Copa...
Eu já passei por quase tudo nessa vida
Em matéria de guarida espero ainda minha vez
Confesso que sou de origem pobre
Mas meu coração é nobre, foi assim que Deus me fez
E deixa a vida me levar (vida leva eu)
Deixa a vida me levar (vida leva eu)
Sou feliz e agradeço por tudo que Deus me deu
Só posso levantar as mãos pro céuAgradecer e ser fiel ao destino que Deus me deu
Se não tenho tudo que preciso
Com o que tenho, vivo
De mansinho , lá vou eu
Se a coisa não sai do jeito que eu quero
Também não me desespero
O negócio é deixar rolar
E aos trancos e barrancos, lá vou eu
E sou feliz e agradeço por tudo que Deus me deu
E deixa a vida me levar (vida leva eu)
Deixa a vida me levar (vida leva eu)
(Copa de 2002, na Coréia e no Japão – escolhida pelo técnico Luís Felipe Scolari e pelos jogadores).