Baseado em loucuras da minha mente. Qualquer semelhança é mera coincidência, hein?
Eram jovens. Deviam ter o que? Aí uns 17, 18 anos.
Haviam se conhecido por intermédio de um amigo de ambos, um super amigo, daqueles que conhece todo mundo, fala com todo mundo.
Ele os havia apresentado, e dentro em pouco, estavam amigos. Freqüentavam as mesmas rodas de amigos, as mesmas festas, os mesmos bares, e dali a pouco, começaram a sair sozinhos.
Há quem diga que amizade homem-mulher não dá certo, é uma relação sempre complicada, em que uma das partes tem sempre intenções maiores sobre a outra. Não sei se assim é.
Fato é, ele começou a sentir alguma coisa que não previa. Gostava como amiga, sim, e tinha um respeito enorme. Só que muitas vezes perdia o controle, e pensava nela de outra forma.
E não sabia como era a recíproca. Ela era uma pessoa muito fechada nesse sentido, falava muito dos sentimentos mas nunca deixava nada transparecer.
Ele começou a ter certeza do que sentia, e a querer a companhia dela de outra forma. Ela parecia não estar nem aí. Assim a relação continuou, mesmo com essa diferença. Ele gostava como amiga também, e não estava tão preocupado.
Naquela tarde de Domingo, ela atendeu o telefone.
“Alô.”
“Oi!”
“Oi!”
“Tudo bom?”
“Tudo!!!!”
A voz do outro lado tinha um brilho diferente, tinha alguma coisa de novo.
“Tá feliz, hein?”
Ela deu uma risada.
“É” e riu de novo.
“Vamo sair? Tá passando aquele filme que você queria ver...”
Ela hesitou.
“Ahn...hoje não dá. Eu...eu...eu preciso estudar...e...bem, não posso. Fica pra próxima, tá?”
Desligaram. Ele estranhou; estava sentindo algo diferente na voz dela. A felicidade e uma hesitação...algo estranho. Claro que outras vezes já haviam deixado de sair, mas naquele dia, sentiu que ela não estava falando a verdade.
Alguns dias depois, se encontraram num bar, no meio de duas rodas de amigos.
“Oi!!!”
“Oi!!! Vem cá, quero que você conheça alguém...”
O coração dele gelou. Não, vai ver era só uma amiga.
“Esse aqui é o...meu namorado.”
Qual o nome que ela dissera, mesmo? André? José? Pedro? Felipe? Ficou sem reação, engasgou, engoliu em seco. Disfarçou, apertou a mão do cara, e voltou discretamente para a mesa.
Tinha certeza que os dois tinham percebido tudo. Estava escrito em sua testa, em seu olhar, naquele breve engasgo. Deixara que tudo fosse percebido. E agora?
Conseguiu manter muito bem as aparências, se superou, acabou surpreendendo a si mesmo. Três dias depois, estava numa boa, já não mais preocupado com o assunto.
Claro que não podiam sair do mesmo jeito. Se viam mais raramente, se falavam menos. Ele tinha certeza de que ela percebera tudo.
Ela não entendia nada. A única conclusão a que chegara parecia absurda demais. Mas então, porque ele sumira de repente? Preferia não pensar mais nisso. Vai ver ele não estava bem, também.
Um dia, ele estava em casa, lendo, quando o interfone tocou. Era ela. O coração disparou. Conhecia aquela voz, e sabia que algo não estava bem. Desceu.
“O que foi?”
Ela o abraçou, chorando.
“Ele...ele...”
“Acalme-se. Vamos, calma, me conte tudo. Calma. Senta aqui. Respira. Isso.”
Se sentaram no banco da portaria.
“Como pode...como ele pode fazer isso comigo...me trair...como?!”
Contou tudo. Pegara o cara com outra, quando fora encontrá-lo na faculdade. Os dois aos beijos, para todo mundo ver. Como o cara fora tão canalha?!
“Ele não te merece” disse ele. “Quem te trai desse jeito, não te merece. Como é que o cara tem coragem de fazer isso com você?”
“Já não é a primeira vez...devo ter algum problema...”
“Não tem nenhum”. A voz dele era calma e sincera. “Muito pelo contrário.”
“O que quer dizer?”
“Que você é a pessoa mais maravilhosa do mundo, a mais bonita, a mais foda, e que se até agora não deu certo, é porque faltava achar o cara.”
“Faltava?”
Ele avançou os lábios. Ela olhou-o meio de lado e se aproximou do rosto, a respiração forte, o coração batendo.
Os lábios roçaram...e os dois se entregaram aquele beijo. Forte, estranho, inesperado. Pela mente dele, passavam mil coisas. Não bebera. No entanto, dissera coisas que não falaria em seu estado normal, e tivera uma atitude da qual devia se orgulhar, e da qual sempre tivera medo.
Pela mente dela, também passavam mil coisas. E se ele saísse machucado? Pelo visto, gostava mesmo. Ficara constrangido naquele dia, no bar, como ela chegou a pensar. E agora?
Os dois deixaram os pensamentos de lado e foram afastando o rosto, devagar.
“Me liga.”
“Pode deixar.”
Ela saiu. Ele ficou ali, alguns minutos, sem saber direito o que fazer.
No dia seguinte, ligou, mas ela não estava em casa. Nem no dia depois do seguinte. Tentou várias vezes, mas nunca a encontrava em casa.
Três dias depois, conseguiu falar com ela.
“Oi!”
“Venha até aqui.”
“Mas...”
“Venha. É importante. Não deixa de vir. Beijo.” E desligou.
Ele foi.
“Tenho uma coisa para te falar.”
O coração gelou.
“Sabia que isso podia acontecer, mas...”
“Fala logo!”
“Voltei com o cara.”
Ele sentiu um frio percorrer-lhe o corpo, e o chão sumir debaixo de seus pés. Então era assim que funcionava?
“Então é assim? O cara te trai na frente de todo mundo, quebra a tua confiança, dá uma de filho da puta, e aí aparece outro que gosta de você de verdade, que não tem medo de dizer isso. E você volta com o outro?”
“Eu...”
“Não fala mais nada, tá? Também não me liga mais. Também não vai mais lá em casa, quando ele te trair de novo, porque não vou atender o interfone.”
E saiu, pisando duro, as lágrimas escorrendo pelo rosto. Se sentiu traído. Não era capaz de compreender aquilo. Como? Tanto tempo esperando, um sentimento tão puro, e ela preferia o cara que traía, o cara que não tinha respeito?
Chegou em casa, subiu até seu apartamento e deitou na cama, sem saber direito o que fazer. Então era assim? Os sonhos podiam ser pisados desse jeito, e traídos assim? Todo o tempo e todos os sonhos não valiam de nada?
Ela, sem saber, matara um sonhador.
Ele, sem saber, se tornara um, mais um entre muitos, e sinceramente, não sabia como ia ser.
Não sabia nem se ia ser.
Monday, October 10, 2005
A morte do sonhador
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