Wednesday, January 06, 2010

Largo

Saudade do Largo do Machado.

Não do Largo de hoje, deserto à noite, silencioso demais, sujo demais. Saudade de um Largo de outros tempos, outra época, que, se não era melhor - e talvez realmente não fosse - ao menos parecia muito.

Tenho um carinho especial por esse pedaço de mundo entre Flamengo, Laranjeiras e Catete, que consegue a mágica de não ser nenhum dos três. E tudo começou faz tempo, faz tempo...

Lembro do som da velha gaita que eu nunca aprendi a tocar. E de uma janela - tinha uma mesa em frente? - por onde entrava o sol escaldante das quatro da tarde, que batia no meu rosto com força e me fazia suar. Mas quem disse que eu desistia de tentar continuar tocando a gaita?

E depois que o sol descia, ali pelas cinco horas, era hora do passeio - que deve ter acontecido uma ou duas vezes. Mas valia a pena. Seguia para comer um folheado de queijo em uma loja chamada Frère Jacques. Ia de mãos dadas com meu pai, ansioso pelo folheado. E ele ia cantando, em francês, a música que tinha o mesmo nome da loja:

Frère Jacques, frère Jacques,
Dormez-vous? Dormez-vous?
Sonnez les matines! Sonnez les matines!
Din, dan, don. Din, dan, don.


E eu cantava, mesmo que meio sem saber o que era nem entender uma palavra. Mais tarde, a loja do folheado acabou. E ele foi trocado por um quibe. O quibe do árabe também era mais do que especial. Mas uma certa palha-de-aço no recheio acabou com a magia da coisa..

Saudade do Largo do Machado.

Não o Largo do Machado só dos folheados e dos quibes. Mas também o da loja de vídeos. Tinha um que de especial, não era uma loja de vídeo como as outras. A começar pelo fato de que eu raramente ia lá. E a continuar pelo fato de que parecia ser maior e mais farta do que qualquer outra videolocadora.

Já achei coisas ali do arco da velha. Era capaz de perder horas ali. No início não era assim: eram apenas duas fileiras de filmes, uma em cima e outra embaixo, naquelas capinhas plásticas que tinham um papelzinho preso nelas. Se a gente queria o filme, tinha que escolher, tirar o papelzinho respectivo e entregar no caixa pra receber a fita.

Aos poucos, a coisa mudou. As duas fileiras viraram cinco, dez, quinze, vinte. Ganharam um subsolo. As capinhas plásticas com papelzinho foram trocadas pelas respectivas fitas. Agora não tinha mais risco de entregar o papelzinho errado, receber uma fita diferente da escolhida e descobrir isso só chegando em casa.

E foi assim que os filmes se multiplicaram, e pude encontrar verdadeiras raridades. Mas o tempo passou, e as fitas começaram a virar DVDs, até sumirem. Hoje só tem DVDs. Coincidência ou não, nunca mais voltei...

Saudade do Largo do Machado.

Não só o Largo dos folheados, dos quibes, da videolocadora, da Sendas (hein?), da Galeria do Condor, da Parmê. Mas também o Largo do velho cinema da galeria do Condor. Por ali passaram várias fitas que não vou esquecer: Professor Aloprado, Noviço Rebelde, O Sexto Dia...

Tinha um ar diferente, de cinema antigo, escondido. Hoje nem existe mais, virou igreja...

Saudade do Largo do Machado não só de lojas, cinemas, lanchonetes, mas de Papai Noel. Era lá que eu esperava o Bom Velhinho, em uma casa mais do que especial. E durante anos foram assim. Aquele apartamento na Rua Machado de Assis virou uma espécie de segunda casa do Noel (o velhinho, não o músico).

É...saudade do Largo do Machado.

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