Ando por aí e bate um desânimo...
O ato de "andar por aí" já é perigoso. Preciso olhar a todo instante para trás, para frente, para os lados, para cima. Não me descuidar mais um minuto sequer, pois a morte "espreita em cada esquina". Por mais que haja locais melhores e piores, a ordem parece ser "não vacile nunca, jamais". Nem na Zona Sul, uma espécie de "ilha de fantasia" carioca, a gente pode parar um minuto para amarrar o sapato.
Medo da nossa cabeça? Talvez...
Se ando por aí de ônibus, o desânimo só aumenta. Agora, além de me preocupar com assaltos e ladrões - preciso manter o olhar fixo na porta, o tempo inteiro, e descer se observar algum "elemento suspeito" - ainda tem o incômodo de não achar lugar para sentar, ficar espremido em pé no ônibus, sob um calor africano, no meio de um engarrafamento horrível, atento para ver se enfiam a mão nos meus bolsos para roubar o celular, a carteira, se abrem a mochila. Não dá nem para descansar a cabeça um minuto que seja.
Medo da nossa cabeça? Talvez...
Ando por aí - mantendo a atenção - e vejo abandono total, em tudo, em todos os aspectos, em todos os níveis. Pichações em fachadas de prédios, gente dormindo na rua, lixo e sujeira, trânsito totalmente congestionado, praias perigosas, ruas perigosas, avenidas perigosas.
Ando por aí e vejo dengue, febre amarela, gente com fome, hospitais lotados, descaso, miséria, pobreza. Não mais nos guetos, nos grotões: a pobreza que as classes mais altas empurraram para fora de suas vistas, na década de 60, está batendo em suas portas pintadas e decoradas, de arma em punho, cobrando a enorme dívida que nunca foi paga.
Vejo um povo que não é "povo", é "público" - mas não o culpo por isso. O dia-a-dia de um trabalhador é muito duro, sim, são dez, doze horas voltado à labuta, para ganhar o dinheirinho suado no fim do mês, para mal conseguir comer, sustentar os filhos, levar uma vida que seja digna.
Ando por aí e vejo as escolas abandonadas, alunos sem aprender. Ando por aí e vejo gente desmotivada, sem emprego. Está mudando? Claro. Mas estamos cansados de gerúndio.
Ando por aí e vejo imbecilidades por toda a parte, gente querendo soluções simples para problemas complexos (Estado da Guanabara...legalizar drogas...proibir armas), o medo nos olhos, nos gestos, nas palavras. Medo de ser assaltado, medo de morrer, medo de não ter onde morar, medo de perder o emprego. Medo de perguntar e de dizer as horas.
Ando por aí e vejo um Rio de Janeiro cheio de potencial, capaz de ser um dos maiores pólos de turismo no mundo - mas que está jogando tudo isso fora, pela janela, com todo esse abandono, em todas as partes, em todos os níveis.
Ando por aí e vejo uma justiça corrupta, uma polícia corrupta, um poder público corrupto, tudo corrupto, tudo corrompido, tudo comprado - e tudo vendido. Nem o esporte, de tantas alegrias, anda bem. Muito dinheiro, muita corrupção, bons jogadores sendo vendidos precocemente, ídolos que não tem nada de ídolos, péssimos e horríveis exemplos.
O que é pior, ando por aí e vejo um círculo vicioso terrível, que envolve tudo o que descrevi e muito mais, e do qual não vejo saída. Sabem, estou triste e desanimado. Gosto do meu país e da minha cidade, mas isso aqui não é mais lugar para se viver. É com muita tristeza que digo: quero ir embora daqui.
E se pudesse, já tinha ido.
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