Thursday, May 31, 2007

Janela do mundo

Não gostei do texto abaixo, esperava mais para um relato que nasceu num sonho. Mas não tá saindo nada mais animador. Bem, ainda posso voltar e editar...

Desde que vovô morreu, vovó se isolou do mundo.Foi um assalto - uma coisa horrível e comum esses dias. Terminou com um tiro certeiro no coração. O casamento era "daqueles de antigamente", com anos e anos de estrada e vida em comum, e a impressão de que estariam juntos para sempre. Ledo engano – “sempre” é uma palavra que não cabe na vida humana. No lugar da vida sossegada e tranqüila que é o sonho de toda velhice, vovó se tornou uma pessoa fechada, recolhida, triste. Mas em vez de verter lágrimas, deixou, aos poucos, de sair, de andar pelas ruas "nem tão tranqüilas" do bairro onde mora. Em vez disso, a portaria do prédio tornou-se a janela de vovó para o mundo. Como se ela quisesse um meio-termo entre a segurança do apartamento e o mundo lá fora. É para lá que ela vai, todas as tardes, "espiar o movimento". Na maioria das vezes, fica em pé mesmo: passa o carteiro, o amolador de facas (que está pensando em desistir da profissão, já que hoje todas as facas vêm amoladas), o marido da dona da floricultura, a dona Josefina do 703 (que vai todas as tardes passear com o cachorro na praia), o velho Seu Leal, o chaveiro (que está quase mudando o nome para Seu DesLeal, devido à enorme concorrência – essa foi horrível), o Seu Ferreira sapateiro, o homem que trabalha na padaria. E não só conhecidos: ontem chegou o homem que veio consertar o poste, o dono do prédio (de todos os apartamentos) chegou cinco minutos atrasado, o porteiro não veio porque estava doente. O ônibus fechou o carro e quase cria um acidente enorme, o taxista brigou com o outro e veio discutindo do ponto de lá até aqui, a fechadura quebrou quando aquele "bruto do 703" tirou a chave e arrancou tudo junto.
E lá ela continua, vendo o movimento, por horas e horas a fio. A portaria virou a janela de vovó.

E o próximo trem - parte 2

Depois de tanto pensar, e refletir sobre coisas estranhas como gotas de água da chuva no chão do metrô, resolvi ouvir a música que diz De onde vem a calma / Daquele cara... e seguí-la à risca.
Calma. Tudo passa, mesmo. Não adianta você empurrar as pessoas na saída do metrô. Às vezes é necessário esperar pelo próximo. A espera acalma, faz refletir sobre coisas engraçadas, e gera bons textos que vão pro blog depois. Faz parte.
Vamos lá. Começando pela saída do metrô. Devagar, sem pressa, sem correria, seguindo o fluxo, como se não tivesse hora. Bom, mesmo porque, não tenho.
Guarda-chuva ainda em punho, olho meio apertado, capa de chuva aberta no peito, calça jeans e camisa verde. Ei, esse aí sou eu. Infelizmente, continuo pensando. Sei que não devia. Quem sabe um dia eu aprendo e deixo isso pra lá, e passo a pensar mais quando devia e menos quando não precisa.
Porque afinal, sempre que penso...bom, quem leu o texto anterior sabe.
Pior que, escrever sobre isso tá me fazendo pensar, também. E sempre que penso...hehe.
Tem problema não. Quem disse que a gente precisa se achar o tempo todo, e que ficar perdido de vez em quando não é bom?
De vez em quando.
Voltamos à nossa programação normal...
E lá vou eu. Sabe que nunca peguei escada rolante com calma? Tava sempre correndo, querendo ultrapassar todo mundo, entrar logo no trem, pegar logo o próximo, ser o primeiro na porta.
Dessa vez, vou com calma, mesmo. Vamos ver de qual jeito é melhor.
Lá em cima, ouço o apito do trem, e acabo de perceber que ele é o próximo. Olha só. O próximo trem está parado na plataforma, porta aberta, esperando entrar. Só que ele tem um tempo curto, e logo tá apitando de novo, e partindo. E se não correr, não pega.
E daí? O próximo não é o último...como aliás eu sei desde pequeno. Só que é tão mais fácil não ver.
Ao chegar no topo da escada, o próximo trem (já ia escrever “último”, vejam vocês) ainda está lá. Mas não tenho pressa, nem vou correr. Não tô com vontade, pronto.
Passam por mim pessoas desesperadas, correndo, quase atropelando umas às outras, com o (escrevi “nefasto”, mas apaguei) simples objetivo de alcançar o próximo trem, e partir com ele para terras não tão distantes assim.
Não quero, não vou correr. Poupem-me.
Um ser de mais idade passa por trás de mim, e atropela a mochila que trago às costas...e lá vai ele.
Agora estou em frente à porta do trem, o barulho começando a soar, o apito indicando a partida próxima.
O próximo trem está me chamando, deve ser por isso que apita. Está me dando a chance de embarcar, e seguir rumo à próxima estação...seja lá o que existir do outro lado do túnel.
Ou eu que estou me dando essa oportunidade.
Seja lá como for, embarquei no próximo trem.
Ou seria “mais um”?